Família de morto na Operação Escudo é alvo de abordagens e intimidação, mostram vídeos

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Há um ano, a família do ajudante de pedreiro Layrton Fernandes da Cruz, 22, tem sido abordada frequentemente por policiais militares em Santos, no litoral paulista. Isso era incomum antes de julho de 2023. Virou rotina após Layrton ter sido morto durante a Operação Escudo, que completa um ano.

Imagens de uma câmera de segurança instalada em frente à casa onde mora a mãe dele mostram abordagens na mesma viela desde o início do ano. Há gravações nos dias 5 de janeiro, 4 de março, 2 e 3 de maio e 17 de junho.

As abordagens se inserem num contexto de intimidações e ameaças relatados por familiares e testemunhas de ocorrências que resultaram em morte durante a operação. Em ao menos três casos diferentes, parentes ou amigos relataram à Folha algum tipo de intimidação da PM posterior às mortes. O caso da família de Layrton é o mais grave entre eles, pela frequência.

PMs apontam lanterna para câmera de segurança e borram gravação no Morro do São Bento, em Santos Reprodução A imagem mostra uma gravação de câmera de segurança em um ambiente externo à noite. Duas pessoas estão visíveis, uma delas está de pé com os braços cruzados e a outra está um pouco mais à frente, com a cabeça coberta. Questionada, a SSP (Secretaria da Segurança Pública) afirmou que “os casos são investigados pela DEIC de Santos, assim como pela Polícia Militar, que analisa as denúncias apresentadas pela reportagem”. “A instituição segue rigorosos protocolos operacionais e não compactua com excessos e desvios de conduta, punindo os envolvidos sempre que as irregularidades são comprovadas”, informa a pasta da gestão Tarcísio de Freitas (Republicamos).

As gravações em frente à casa mostram PMs empurrando portões e entrando armados na casa em duas ocasiões, sem apresentar mandado judicial. Em janeiro, agentes da Rocam (Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas) subiram na casa dos vizinhos da frente e fizeram registros com telefones celulares.

No caso mais recente, em junho deste ano, os policiais apontaram lanternas em direção à câmera de segurança e conseguiram borrar a imagem, impedindo que ela continuasse a registrar a abordagem na casa. No áudio captado pelo equipamento, enquanto três PMs estão em frente à casa, é possível ouvir que um deles pergunta: “De quem é essa câmera aí?”.

Segundo um tio de Layrton, que falou com a reportagem com a condição de que seu nome fosse preservado, naquela ocasião os policiais conversavam com a mãe de Layrton. Há também registros de outro momento em que PMs entraram na casa, em 25 de outubro de 2023 –menos de três meses após a morte.

A maior parte dos casos envolveu policiais do Baep (Batalhão de Ações Especiais de Polícia) de Santos. Os relatos incluem abordagens truculentas, com ofensas pelos policiais às pessoas averiguadas.

Segundo o tio, os policiais teriam justificado que entraram nas casas para procurar drogas ou em casos que envolviam perseguição de supostos traficantes. Nenhuma acusação pesa contra os membros da família.

Neste mês, diz a família, um irmão de Layrton estava num carro de carona por aplicativo quando o veículo foi parado numa blitz. Um policial pediu que ele descesse do carro após conferir o nome em seu documento. O nome do ajudante de pedreiro morto foi citado e também o fato de que a família havia denunciado as abordagens, por meio da Defensoria Pública.

Caso teve cachorro morto e tiro a curta distância

Layrton foi morto com quatro tiros. Um deles foi potente o suficiente para que seu antebraço se descolasse do corpo quando ele foi retirado da cena do crime, o que é compatível com um tiro de fuzil a curta distância. Policiais do Baep também mataram a tiros o cachorro da casa.

No boletim de ocorrência, os PMs narraram que estavam em meio a um patrulhamento a pé no bairro do Jabaquara quando viram um homem com um rádio comunicador, que correu quando avistou a equipe se aproximando. Entraram na casa teriam visto Layrton com uma arma na mão. Um policial ficou ferido na ação, e a família afirma que ele teria sido atingido por engano por um dos próprios colegas.

A arma atribuída a Layrton não foi encontrada na cena do crime, e sim entregue na delegacia pelos policiais, o que contraria a orientação da SSP para preservação dos locais de ocorrência.

Outro caso em que testemunhas relatam intimidação é o da morte do encanador Willians dos Santos Santana, 36, morto em agosto por policiais do 2º Baep, de Araçatuba, na ponta da praia do Perequê, em Guarujá. Em 21 de setembro do ano passado, cerca de um mês após a morte, viaturas da Baep voltaram ao local da morte, segundo um vizinho e colega de trabalho de Santana.

Teriam entrado no mesmo barraco onde ele morreu, tirado fotos do local. De acordo com esse vizinho, teriam ainda visitado uma testemunha do caso e feito a ele uma série de perguntas.

Há ainda o caso da viúva do garçom Filipe do Nascimento, 22. A Folha apurou que, após denunciar que o marido teria sido alvo de uma execução sumária, ela teria sofrido ameaças de morte. Mãe de duas filhas, decidiu sair de Guarujá e se mudar de estado.

Questionada sobre os casos da Escudo, a SSP afirmou que “as ocorrências de morte durante a Operação Escudo são rigorosamente investigadas pela Polícia Civil de Santos e pela Polícia Militar. “Todo conjunto probatório apurado no curso das investigações, incluindo as imagens das câmeras corporais, foram compartilhados com o Ministério Público e o Poder Judiciários”.

TULIO KRUSE / Folhapress

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