Famílias cobram construção de mais casas de 15 metros quadrados em Campinas

CAMPINAS, SP (FOLHAPRESS) – Após o anúncio de que haveria a entrega de casas de 15 m² pela Prefeitura de Campinas (a 93 km de São Paulo), famílias sem-teto de outra ocupação cobraram na segunda (19) que também sejam atendidas, mesmo que com o modelo em construção para os integrantes da Mandela Vive.

O tamanho dos imóveis para as famílias da ocupação Mandela Vive foi criticado por especialistas ouvidos pela reportagem —alguns relataram que vão morar com sete ou oito pessoas no espaço.

Em transmissão nas redes sociais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também desaprovou o espaço de 15 m², afirmando que o próximo passo dessa tendência seria construir “poleiros”.

A precariedade de ocupações é o que leva famílias sem-teto a desejarem casas ainda que em tamanhos diminutos, na opinião de especialistas.

Na segunda, durante sessão na Câmara, membros de dois movimentos de sem-teto se reuniram no plenário para cobrar a construção de embriões (os imóveis de 15 m²) como os do residencial Mandela.

Um dos movimentos era de integrantes da Vila Paula, área da prefeitura na região norte. A ocupação começou em 2015.

Jonathas Ferreira da Silva, 45, é um dos líderes da Vila Paula, que abriga cerca de 250 famílias cuja renda média, segundo ele, é de um salário mínimo.

“Quando soubemos que iam dar o embrião lá, pensamos que seria ideal aqui também. Nossos barracos foram construídos com pedaços de móveis, lonas, telhas velhas. Ter uma casa de alvenaria, ainda que pequena, e não precisar viver com medo de tudo voar quando dá uma chuva, é um sonho para muitos”, diz Silva.

Luzia de Souza Barros, 38, vive em um barraco com o marido e nove filhos. A renda da família é de R$ 1.100, de bicos do marido, e R$ 600 do Bolsa Família.

“Minha família é grande e, apesar de morarmos em um barraco, pagamos R$ 600 de aluguel. Se a gente conseguisse [o embrião], ainda que ficasse muito apertado, dava para acomodar todo mundo, economizar o aluguel e construir pelo menos mais um cômodo.”

Ela e sua família vivem na Vila Paula há quatro anos. Instalaram-se na ocupação irregular ao chegarem do interior do Ceará, onde eram vítimas do desemprego. Sem recursos suficientes, a família recebe doações e recolhe verduras na Ceagesp.

“[Se recebesse o embrião], eu me sentiria muito orgulhosa. Seria uma gratidão sem tamanho”, diz ela, com lágrimas nos olhos.

O outro movimento presente na Câmara foi o de ocupantes da Vila Joana Darc. Iniciada em 2012 na região sudoeste, foi removida em razão das obras do BRT (sistema de transporte rápido por ônibus). Atualmente, as famílias que compõem o movimento vivem com auxílio-aluguel municipal de R$ 600.

O vice-prefeito, Wanderley de Almeida (PSB), disse à Folha que as situações são diferentes.

“Nós damos ouvidos a todo tipo de manifestação, mas são situações diferentes. O projeto na ocupação Mandela era emergencial, por já existir reintegração de posse”, afirmou Almeida. “A situação da Vila Paula será regularizada, mas não há tratativas para construções dos embriões. Já as famílias da Joana Darc serão assentadas na segunda fase do projeto do Mandela, mas também não há discussão sobre embrião”.

Para Eleusina Holanda de Freitas, arquiteta e urbanista e responsável pela elaboração do último plano de habitação de Campinas, em 2010, o movimento dos moradores é um indicativo de que faltam políticas concretas de habitação por parte da Cohab (Companhia de Habitação Popular), empresa responsável pelo trabalho de habitação no município.

“Tamanha é a falta de política habitacional em Campinas que quando surge alguma, ainda que absurda, é natural que os movimentos procurem a Cohab, para serem lembrados”.

Patricia Rodrigues Samora, arquiteta e urbanista pela USP e especialista em Assentamentos informais e gestão fundiária pela Universidade de Rotterda, afirma que uma moradia digna não pode desrespeitar as diretrizes da ONU.

“Uma casa digna tem de cumprir plenamente todas as atividades necessárias para o indivíduo. Descanso, abrigo contra as intempéries, realização da alimentação, higiene pessoal e lavagem de roupas. Não é só uma questão de área mínima, é uma questão de funções mínimas”, diz Samora.

Para Vitor Barletta Machado, sociólogo e professor da PUC de Campinas, a demanda por moradias que podem ser consideradas indignas é um reflexo do desmonte de políticas sociais a nível macro.

“Houve nos últimos anos um desmonte nacional de políticas sociais, o que respinga nos municípios. A análise tem que partir desse princípio: a situação é tão grave que as pessoas buscam, de fato, ações mínimas do poder público”, diz Machado.

LUIS EDUARDO DE SOUSA / Folhapress

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