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Fé, feminismo e xenofobia contra o Nordeste pautam debates na Feira do Livro

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nesta segunda-feira (16), terceiro dia da Feira do Livro de São Paulo, sob um sol intenso e temperaturas mais elevadas do que do fim de semana, uma discussão sobre espiritualidade e religiosidade popular tomou um dos tablados literários.

Embora o evento tivesse público menor que os dois dias anteriores, a mesa com os jornalistas da Folha de S.Paulo Anna Virginia Balloussier e Marcelo Leite, mediada por Bruno Torturra,chegou a lotar o espaço. Eles debateram a fé no cotidiano dos brasileiros e os desafios da cobertura de religião.

Leite tem trajetória mais ligada ao jornalismo científico, e os dois convidados ofereceram visões complementares sobre as práticas de fé no Brasil —que, como lembrou Balloussier, envolvem questões profundas de classe, gênero e raça. O assunto é tema de um livro recente da jornalista, “O Púlpito”, lançado pela editora Todavia.

“Quando me refiro às igrejas evangélicas, estou falando da religião do povo: a maioria dos fiéis são mulheres negras de classe baixa”, afirmou ela, ao comentar os caminhos e dilemas do jornalismo sobre o tema. “Como não dar espaço para essas pessoas se existe uma bancada evangélica que está sendo eleita pela população?”

Leite, por sua vez, abordou o que chama de “renascimento psicodélico” —assunto que acompanha há cerca de oito anos, a partir de uma perspectiva de divulgação científica.

Seu novo livro, “A Ciência Encantada de Jurema”, da Fósforo, trata da jurema sagrada, planta do semiárido nordestino que tem propriedades alucinógenas e é utilizada em ritos religiosos que eram conhecidos como “catimbó”.

“Não é uma religião tão difundida fora do Nordeste porque foi tão perseguida que teve de ser praticada em segredo durante muito tempo. É também uma expressão de espiritualidade de gente muito pobre, o que contribui para sua marginalização”, afirmou.

Segundo Leite, a busca contemporânea por novos caminhos espirituais se dá, em parte, por uma “crise na visão de mundo baseada na ciência”, que já não dá conta das angústias de muita gente.

À tarde, o escritor e pesquisador Octávio Santiago esteve no palco Petrobras com uma fala centrada na construção da identidade nordestina e na persistência de estigmas regionais.

Esses temas são centrais em seu mais recente livro, “Só Sei que Foi Assim”, da Autêntica. Na obra, Santiago investiga como narrativas históricas moldaram e reforçam estereótipos sobre o Nordeste brasileiro.

“Os estereótipos não nascem sem razão nem permanecem sem razão. A manutenção desses estereótipos ainda perpetua a exclusão.” Para Santiago, discursos discriminatórios ainda são usados para manter o Nordeste à margem da sociedade brasileira.

Ele citou a personagem Macabéa, de “A Hora da Estrela”, de Clarice Lispector, como representação simbólica dessa exclusão. “Macabéa significa esse lugar de subalternidade em que todos nós, nordestinos, somos colocados.”

Santiago também destacou o desconforto gerado pelo avanço de figuras nordestinas em espaços de poder. “O protagonismo nordestino, inclusive político, incomoda”, disse, acrescentando que o debate sobre a criminalização da xenofobia é recente e ainda pouco consolidado.

Encerrando a programação da noite de segunda, a mesa “Pensando Bem”, com a advogada Mayra Cotta e a jornalista Milly Lacombe, mediada por Iara Biderman, promoveu um debate sobre os impactos da desigualdade de gênero em diversas esferas da vida social —do mercado de trabalho às relações afetivas.

Lacombe defendeu a ideia de que toda agenda política é identitária e criticou a baixa representatividade de mulheres negras. “Quando uma mulher negra está num lugar de poder, o afeto pode circular.”

Já Cotta destacou a relação entre misoginia e autoritarismo. “O ódio às mulheres organiza o fascismo na sociedade”, afirmou. Autora de “Modos de Vestir”, ela analisou o papel do vestuário na manutenção de estruturas patriarcais.

“Durante a modernidade, as roupas femininas não foram pensadas para habitar os espaços da sociedade, mas para marcar a mulher como propriedade da família burguesa. Ainda há reflexo disso na maneira como nos vestimos “, disse.

CAROLINA FARIA / Folhapress

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