SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Recentemente, com o balanço do Banco Master sob o holofote, alguns investimentos do banco ganharam destaque. Entre eles, os Fidcs (Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios), nos quais estão R$ 10,2 bilhões do Master, segundo o balanço da instituição referente à 2024.
Com os juros em alta, Fidcs ficaram populares não só entre as instituições financeiras e ganharam as pessoas físicas. Uma das grandes atratividades é o fato de estes fundos não terem “come-cotas”, que é a antecipação semestral do Imposto de Renda sobre os lucros obtidos no período.
Até março deste ano, a categoria acumula um patrimônio líquido de R$ 587 bilhões, segundo dados da Anbima (Associação dos Mercados Financeiro e de Capitais). Os Fidcs superam os fundos de ações, que somam R$ 567 bilhões em meio à baixa das Bolsas
Mas, afinal, o que são Fidcs?
Fidcs são fundos que negociam créditos que ainda não foram pagos, como recebíveis de cartão de crédito, boletos, precatórios ou processos judiciais em andamento, financiamentos, contratos de empréstimos pessoais, duplicatas, notas promissórias etc.
Quem irá receber esse crédito, chamado de cedente, vende este direito de receber a um fundo por um valor descontado. A vantagem é de antecipar o pagamento e não ter o risco de calote. Já para o fundo, ele compra o recebimento mais barato, e lucra em cima disso.
“Ninguém vive sem crédito e Fidc tem muita capilaridade, chega em pequenas e médias empresas que não têm acesso ao financiamento tradicional”, diz Décio Baptista Santos, sócio-fundador da Liberum Ratings, agência de avaliação de riscos de crédito.
Com uma taxa básica de juros em alta, esse investimento fica ainda mais atrativo, já que o juro cobrado nesses contratos tende a acompanhar os movimentos da Selic, hoje a 14,25%.
Ele é classificado como renda fixa, mas não é similar a um CDB ou título do Tesouro. O Fidc tem risco ao investidor, uma vez que se os pagadores das dívidas atrasarem ou derem calote, o fundo fica sem receber.
Para diminuir esse risco, os Fidcs costumam ter recebíveis de centenas de cedentes que, por sua vez, têm milhares de direitos creditórios. Assim, mesmo que haja calote, o fundo consegue entregar uma certa rentabilidade. Há também os Fidcs monocedentes, considerados mais arriscados.
No caso do Master, a questão levantada por analistas era a falta de informações detalhadas sobre esses ativos, de modo a averiguar o potencial de recebimento e de liquidez
Outras maneiras de reduzir a exposição ao risco são na escolha do tipo de cora do fundo. Em Fidcs, podem ser até três: sênior (prioridade no pagamento), mezanino (tem prioridade no resgate em relação à subordinada) e subordinada (a última a receber em caso de calote). Quanto mais arriscada a cota, mais barata ela é.
O mesmo princípio se estende para outros aspectos do Fidc, como os setores ao qual ele é exposto, qual a avaliação de crédito dos devedores, o tamanho dos cedentes e a avaliação de rating das agências de classificação de risco.
Também é preciso ter atenção à liquidez. Há os Fidcs fechados, nos quais é preciso esperar o prazo de vencimento para liquidar o investimento, e os abertos, nas quais os investidores podem solicitar o dinheiro de volta a qualquer momento. No entanto, mesmo nos abertos, a liquidez não é imediata e pode demorar mais que um mês.
Dessa forma, especialistas recomendam uma avaliação criteriosa antes de se investir em recebíveis.
Para Bruno Corano, CEO da Corano Capital, por Fidcs oferecerem um certo nível de risco eles não são indicados aos investidores super conservadores, mas pode ser um aliado na diversificação de demais carteiras para além do CDI (que acompanha a Selic).
“É uma categoria de ativo intermediário, para quem ainda não está pronto para mais volatilidade, como na Bolsa”, diz o economista.
Ele também recomenda uma avaliação criteriosa dos Fidcs, da mesma forma que o investidor deve avaliar uma empresa listada na B3.
“Todo setor com perspectiva de manutenção de caixa é menos arriscado, como energia, mas, consequentemente oferecem ganhos menores. [investir em Fidcs] é igual comprar um FII [fundo imobiliário]. As pessoas acham que é seguro porque é imóvel, mas, no fundo, depende dos ativos que estão lá dentro.”
Fayga Czerniakowski Delbem, superintendente de crédito privado da Itaú Asset, também recomenda ima análise criteriosa. Ela costuma dizer que prefere investir em uma boa empresa em um setor ruim, que em um setor bom e uma empresa ruim.
“Há Fidcs menos suscetíveis aos indicadores macroeconômico, como antecipação de recebível do emissor do cartão ou do adquirente da maquininha. Já pequenas e médias empresas de varejo estão mais expostas à inadimplência, taxa de juros, PIB [Produto Interno Bruto]”, diz Fayga, responsável pelos fundos de crédito da instituição.
Ela prevê que a indústria entregue uma rentabilidade de 1% a 5% acima do CDI este ano quanto maior a rentabilidade, maior tende a ser o risco do fundo, já que clientes com mais chance de calote são os que pagam juros mais caros.
“2024 foi o ano do credito privado. Com a Selic atrativa, mas sem penalizar o balanço das companhias, o que gerou um spread atrativo, a indústria captou mais de R$ 300 bilhões. Em 2025, o cenário é diferente, a Selic média é mais alta, o que aumenta o custo financeiro [das empresas]” afirma Fayga.
Apesar da redução na rentabilidade ofertada por Fidcs, o apetite do investidor segue alto. Em seu novo fundo de Fidcs, o Itaú Asset captou mais de R$ 200 milhões em duas semanas.
“Vemos um interesse muito forte do investidor por esse produto. Compramos mais de R$ 7 bilhões em Fidc no ano passado e já atingir essa marca no primeiro semestre deste ano”, afirma a gestora.
JÚLIA MOURA / Folhapress