SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Filhos e netos de militares envolvidos na ditadura argentina (1976-1983) publicaram carta aberta em que pedem à população que não vote em Javier Milei no segundo turno das eleições, no próximo dia 19, no qual o ultraliberal concorre com o ministro Sergio Massa.
O texto do coletivo Histórias Desobedientes, formado também por familiares de ex-policiais, membros da inteligência e do sistema de Justiça que apoiaram o regime militar, afirma ver com preocupação a chance de Milei, que descrevem como detentor de uma plataforma negacionista, chegar à chefia da Casa Rosada.
“Milei deseja implementar o mesmo plano da ditadura, tem o mesmo objetivo político de aniquilar tudo o que considera ‘de esquerda’ e quer implementar o mesmo plano econômico, de hiperinflação e destruição da moeda nacional”, diz a nota publicada no último dia 1º.
O coletivo faz especial menção ao plano de segurança pública de Milei, apelidado por seu partido, Liberdade Avança, como uma “segurança baseada no princípio de ‘aqui se faz, aqui se paga'”. As propostas vão da desregulamentação do mercado de venda de armas à militarização dos presídios argentinos e à proibição de entrada no país para estrangeiros com antecedentes criminais.
No plano de campanha, o economista argumenta que a segurança pública na Argentina “sucumbiu à deterioração constante há décadas”, em especial por uma “cultura abolicionista”, que, afirma ele, “considera que os delinquentes são vítimas”.
Na nota, o grupo de familiares argumenta que a chamada Segurança Nacional, como Milei chama o plano, “é a mesma doutrina implementada durante a última ditadura cívico-militar, o que implica uma concepção militar do Estado e do funcionamento da sociedade”.
O grupo critica, em especial, as declarações que Milei e sua candidata a vice, a deputada Victoria Villarruel, já deram sobre o regime militar.
No caso do economista ultraliberal, ele já afirmou que a ditadura foi uma mera “guerra do Estado contra o terrorismo” e por mais de uma vez questionou o número de vítimas do regime -em torno de 30 mil, segundo estimativas de órgãos oficiais.
“A primeira coisa que temos de reconhecer é que o número de 30 mil é uma mentira”, disse ele à agência de notícias Bloomberg no ano passado. “Não foram 30 mil desaparecidos”, seguiu, sem apresentar como estaria refazendo o cálculo do número oficial de vítimas.
Ele voltou a fazer a mesma afirmação em debate eleitoral antes do primeiro turno das atuais eleições.
“Como filhos e familiares de genocidas, pedimos mais consciência sobre a gravidade desses crimes de lesa humanidade”, diz o texto do Histórias Desobedientes. “Afirmamos com conhecimento de causa que o silêncio e a negação dos fatos afetam profundamente tecidos familiares, deixam sequelas dolorosas na história e tendem a perpetuar a impunidade e facilitar o ressurgimento de discursos de ódio.”
Argentinos decidiram nas urnas em 22 de outubro que um segundo turno seria disputado por Sergio Massa, ministro da Economia e candidato peronista que levou mais de 36% dos votos, e por Milei, deputado que alçou quase 30% e é visto como um “outsider”.
As pesquisas de intenção de voto para o segundo turno têm mostrado um debate acirrado entre os dois, muitas marcando empate técnico. Pesquisa da Atlas Intel divulgada no último sábado (4) mostrou Milei com 52% dos votos válidos e Massa com 48%. A margem de erro do levantamento, que ouviu pouco mais de 3.200 pessoas, é de 1,7 ponto percentual para mais ou para menos.
Redação / Folhapress