PARATY, RJ (FOLHAPRESS) – O carioca Fausto Borel Cardoso, 67 anos, conhecido por Fausto Fawcett, é um artista singular. Músico, escritor e dramaturgo, dono de uma voz poética forte e única, criou, nas últimas quatro décadas, um universo lírico e onírico inspirado pelo caos e os mistérios do bairro carioca de Copacabana.
Poucos artistas foram tão marcados por seu habitat. Fawcett é uma espécie de embaixador de Copa, um cronista que, inspirado por passeios diurnos e madrugada adentro pelos bares, lojas e inferninhos locais, gravou discos e escreveu histórias em que o bairro figura como o epicentro de tudo que inspira Fawcett, futurismo, misticismo, pornografia, violência, favela, luxúria e submundo.
Em cartaz nos cinemas, “Fausto Fawcett na Cabeça”, dirigido por Victor Lopes, tenta explicar quem é e o que inspira o músico. O filme é como seu personagem central, veloz, um tanto caótico, mas sempre instigante.
Vencedor da Mostra Competitiva Nacional de Longas-Metragens no Fest Aruanda, o filme levou também os prêmios de melhor ator/personagem e o Troféu Abracine em 2022, além de ter sido exibido no Festival do Rio e na Mostra Internacional de Cinema em São Paulo de 2022 e no festival de documentários musicais In-Edit, em São Paulo, em 2024.
Chamar “Fausto Fawcett na Cabeça” de documentário parece errado. É mais um filme-ensaio, de narrativa livre, misturando depoimentos, cenas de arquivo, apresentações ao vivo e imagens de Fawcett andando pela zona sul do Rio de Janeiro e discorrendo sobre suas obsessões. “Uma ópera-doc de fricção-científica cyberfunk bregarunner”, como define o diretor Victor Lopes, usando os intrigantes jogos de palavras que caracterizam a poesia de Fausto Fawcett.
É muito interessante ver o compositor em plena criação com parceiros musicais, improvisando versos que vão ganhando corpo e sentido, ou falando sobre redes sociais, família e as tentações da noite. Abstêmio desde 2008 (“O médico disse: ‘Ou vai ou fica'”), Fawcett é uma fonte inesgotável de frases de efeito e pensamentos que, à primeira vista, podem parecer aleatórios, mas que fazem total sentido quando se conhece o universo próprio habitado pelo artista.
As obras de Fawcett são uma peculiar mistura do passado e futuro, crônicas de uma megalópole moderna, mas presa a velhas tradições. É bonito vê-lo falando sobre as noites em que, criança, passava com os pais num terreiro de umbanda em Nilópolis (“Aquilo era o meu portal”), e de como aquelas imagens ajudaram a moldar seu universo lúdico.
Fausto Fawcett gravou apenas três álbuns, lançados entre 1987 e 1993, mas são discos influentes, que marcaram gente como O Rappa e Chico Science e Nação Zumbi –que participaram da faixa “Rio, 40 Graus”, composta por Fawcett e gravada por Fernanda Abreu no álbum “Raio X”.
No filme há cenas da sessão de gravação de Fernanda Abreu com Chico Science e Nação Zumbi, mas, por alguma razão que apenas os produtores do filme podem explicar, as pessoas que aparecem nas imagens não são identificadas, assim como não merecem identificação os entrevistados –há uma lista de depoimentos nos créditos finais. O público tem de adivinhar quem são aquelas pessoas que estão falando. Isso dificulta demais a compreensão do filme e o torna menos atraente ao público “comum”. Infelizmente, essa mania de não identificar as pessoas na tela parece ser uma moda em trabalhos documentais recentes no Brasil.
FAUSTO FAWCETT NA CABEÇA
Onde: Nos cinemas
Classificação: 18 anos
Direção: Victor Lopes
Avaliação: *Bom*
ANDRÉ BARCINSKI / Folhapress