Filme sobre Ângela Diniz prende a atenção apesar do desfecho conhecido

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Quando a história é muito boa, ninguém consegue desgrudar os olhos antes do final, mesmo se não há mistério sobre o desfecho. É assim com a história de Ângela Diniz, a “pantera” de Belo Horizonte assassinada em 1976 por seu companheiro em sua casa de Búzios, no litoral do Rio de Janeiro.

A socialite havia inspirado o podcast jornalístico “Praia dos Ossos”, sucesso lançado pela Rádio Novelo em 2020, com mais de 3 milhões de downloads. Em oito episódios, toda a vida de Ângela Diniz era apresentada, da infância e adolescência em Minas Gerais à trágica morte, passando pelos escândalos da separação e os períodos de alta badalação no Rio de Janeiro.

Com direção de Hugo Prata —de “Elis”, de 2016— e Ísis Valverde no papel principal, o filme que chega agora aos cinemas se concentra nos últimos meses de Ângela Maria Fernandes Diniz, do encontro com Raul Street, mais conhecido como Doca, à morte na Praia dos Ossos, em dezembro de 1976, aos 32 anos.

“Ângela” começa com a protagonista já separada, impedida pelo ex-marido de ver os filhos. A cena inicial a apresenta numa festa oferecida pela milionária Adelita Scarpa, em São Paulo, à época casada com Doca Street, interpretado por Gabriel Braga Nunes.

A chegada de Ângela à mansão se assemelha à entrada de Cinderela no baile. Só há olhos para ela, que esbanja charme, glamour e sensualidade. No caso da personagem de Isis Valverde, há também uma melancolia de fundo, presente, em maior ou menor grau, em todo o filme.

É, aliás, notável o diapasão de emoções que a atriz encarna, sem para isso adotar uma postura caricata.

Na festa da cena inicial, a protagonista namorava com Ibrahim Sued, lendário colunista social carioca, de quem se separa para unir-se a Doca. Ela então compra uma casa em Búzios e ali se instala com o novo companheiro.

A maior parte do longa se passa nesse cenário praiano, com o casal longe dos holofotes e da badalação dos anos anteriores.

Os fatos da história são conhecidos: o ciúme de Doca, que era sustentado por Ângela; o crescendo de violência; os três tiros no rosto e um quarto, na nuca. Até por isso, as escolhas da realização poderiam ter maior sofisticação.

Os atos de violência são exibidos de maneira bastante frontal, quando talvez pudessem, ao menos em parte, ficar subentendidos em elipses ou ao menos fora de quadro.

O quanto de violência precisa ou deve ser mostrada quando o objetivo é criticá-la? A reprodução de cenas violentas é uma maneira de reiterá-las, repeti-las? Não há resposta fechada para tais perguntas, mas elas se tornam mais problemáticas em casos da agressão à mulher praticada por homem —e filmada por homem.

Ao mesmo tempo, é importante que fique visível o caminho do beijo roubado ao crime final. É um caminho tristemente corriqueiro e que precisa ser identificado, reconhecido.

Não estamos, de fato, diante do filme mais inventivo ou esteticamente complexo. Seu ponto alto é a interpretação e a beleza dos planos e cenários, sobretudo na casa à beira-mar.

Além disso, os comportamentos de Ângela, uma mulher ousada, em sintonia com os próprios desejos e inconformada com as expectativas de passividade que oprimiam —e oprimem— as mulheres, fazem eco com discussões absolutamente presentes no contexto atual.

No ano em que a tese da “legítima defesa da honra” foi considerada inconstitucional em casos de feminicídio, “Ângela” é um filme que merece ser visto e sua história, discutida.

ÂNGELA

Avaliação Bom

Quando Estreia nesta quinta (7), nos cinemas

Classificação 18 anos

Elenco Ísis Valverde, Gabriel Braga Nunes e Alice Carvalho

Produção Brasil, 2023

Direção Hugo Prata

LÚCIA MONTEIRO / Folhapress

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