PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Quem entra no prédio da microcervejaria Gewehr, na zona norte de Porto Alegre, dá de cara com tanques em operação, funcionários movimentando barris de chope e sacas de insumos guardadas de maneira organizada.
É um cenário bem diferente do registrado no primeiro semestre do ano passado, quando a enchente histórica da capital gaúcha devastou a estrutura da empresa. A fábrica fica no bairro Anchieta, o mesmo do aeroporto Salgado Filho, também atingido pela catástrofe.
Durante o mês de maio, a água alcançou cerca de 2 metros no pavilhão da cervejaria, que ficou inacessível por mais de 30 dias. A inundação espalhou sujeira, revirou materiais e estragou peças do maquinário.
A empresa conseguiu retomar a produção no local só no início de agosto, mas um problema em um dos equipamentos forçou uma nova parada para manutenção. A operação voltou nos meses seguintes, ainda com necessidade de ajustes pontuais.
“Considerando o que a gente viveu, foi uma reconstrução do zero”, resume Luiz Gewehr, 55, um dos sócios da cervejaria.
Ele toca o negócio em parceria com a mulher, Sonia Gewehr, 54, e Fellipe Riffel, 31. Além dos três sócios, a empresa tem cinco funcionários.
“A vida como empresário não parou, porque os clientes queriam chope, e aí veio um dos dramas. Depois do caos da enchente no começo de maio, as coisas foram voltando, os shoppings estavam funcionando, e tive de procurar alternativas”, lembra Luiz.
“Com a ajuda de outras cervejarias que cederam tanques, a gente pôde produzir e recomeçar a vender naquela época inicial”, acrescenta.
A empresa contou com o apoio de voluntários que atuaram na limpeza e na reorganização da fábrica no bairro Anchieta. A pintura do pavilhão foi recebida por meio de doação de um conhecido.
Para reconstruir o espaço, os sócios montaram uma engenharia financeira. Eles injetaram dinheiro próprio, buscaram crédito por meio do programa Pronampe e também recorreram a auxílio do Sebrae-RS concedido a negócios de menor porte. O prejuízo da cervejaria na enchente é estimado em cerca de R$ 600 mil.
Após a reconstrução, a capacidade produtiva aumentou com a troca de parte dos equipamentos. “Por termos uma estrutura melhor agora, conseguimos vender mais do que antes”, afirma Luiz.
A cervejaria fornece produtos para bares e restaurantes da Grande Porto Alegre, além de atender eventos.
“Às vezes, a gente se acomoda com o que tem. É tipo o sapo sendo cozinhado na panela. A gente estava numa boa antes da enchente. Tirar experiências boas de algo assim, uma tragédia, é o melhor aprendizado”, diz o empresário.
Conforme o gerente da regional metropolitana do Sebrae-RS, Paulo Bruscato, micro e pequenos negócios, de modo geral, ainda enfrentam incertezas na retomada no estado.
“As enchentes, assim como a pandemia, mudaram comportamentos de consumo”, diz. “Isso pode carregar oportunidades e também deficiências no modelo de negócios”, completa.
O Sebrae-RS apostou em um programa chamado Supera, que atendeu a mais de 10 mil empresas no Rio Grande do Sul com aporte direto de recursos, aponta Bruscato. O orçamento da iniciativa ficou em torno de R$ 100 milhões, diz o gerente.
A série Reconstrução Gaúcha, publicada mensalmente no site da Folha, mostra a tentativa de reconstrução do Rio Grande do Sul após as enchentes de proporções históricas que começaram em abril de 2024 e atingiram centenas de municípios do estado. As reportagens, publicadas no fim de cada mês, mostram os desafios em áreas como agropecuária, infraestrutura e setor imobiliário, além do empenho na restauração dessas atividades.
LEONARDO VIECELI / Folhapress