SÃO CARLOS, SC (FOLHAPRESS) – Os restos fossilizados do mais antigo girino do planeta, descobertos na Argentina, indicam que a fase larval dos atuais sapos, rãs e pererecas já podia ser encontrada em lagoas temporárias há mais de 160 milhões de anos, na Era dos Dinossauros.
O fóssil achado na província de Santa Cruz, na Patagônia, mede 16 cm de comprimento, o que é comparável a alguns dos maiores exemplares atuais, dentro da faixa considerada de gigantismo para girinos.
Detalhes sobre a descoberta foram publicadas nesta quarta-feira (30) na revista científica Nature, uma das mais importantes do mundo. A análise do fóssil foi coordenada por Mariana Chuliver, da Universidade Maimônides, em Buenos Aires, junto com colegas de outras instituições argentinas, do Reino Unido e da China.
Segundo Chuliver e os coautores do estudo, tudo indica que o girino pertencia à espécie Notobatrachus degiustoi, que vivia na mesma região durante o período Jurássico. Muitos indivíduos fossilizados já tinham sido identificados ali anteriormente, e, além disso, eles apresentam semelhanças anatômicas consideráveis com a recém-descoberta fase larval.
Embora a evolução dos anfíbios seja muito mais antiga que o período Jurássico, a presença dos girinos é bem mais recente. Isso porque, ao que tudo indica, ela está associada à diversificação dos anuros, o grupo dos sapos e afins. A anatomia dos anuros é bem diferente da de anfíbios mais primitivos, que mantinham a cauda e um corpo mais afilado por toda a vida, mais ou menos como as atuais salamandras.
O fóssil, encontrado numa pedreira na localidade conhecida como Estancia La Matilde, vem de rochas que se formaram num ambiente de água relativamente parada próximo à foz de um rio, além de apresentarem também influência piroclástica (dos fragmentos de rocha lançados por erupções vulcânicas).
A combinação desses fatores acabou preservando muitos detalhes da anatomia do girino. Isso inclui impressões de alguns dos chamados tecidos moles, como olhos e nervos, bem como estruturas do ouvido, da boca e das brânquias.
Os detalhes branquiais e bucais indicam que o pequeno animal era um filtrador, retirando matéria orgânica em suspensão na água para se alimentar uma estratégia que é considerada o padrão básico dos girinos até hoje.
Já o estado das cartilagens no crânio do anfíbio ajudou os pesquisadores a estimar que, antes de sua morte e fossilização, ele tinha alcançado um estágio relativamente avançado de seu ciclo de vida, pouco antes da metamorfose que transformaria o girino na forma de rã característica da fase adulta.
Embora o espécime argentino seja o mais antigo a ser achado até hoje, os pesquisadores estimam que o surgimento da estratégia da fase larval tenha acontecido numa época anterior provavelmente a transição entre o período Triássico e o Jurássico, há cerca de 200 milhões. De fato, é muito difícil que o primeiro aparecimento de uma característica na trajetória evolutiva de um grupo de animais tenha a sorte de ser registrado na forma de fóssil costuma haver um “atraso” desse tipo.
REINALDO JOSÉ LOPES / Folhapress