Fronteira acende alerta com alta de apreensões de cigarro eletrônico

CIUDAD DEL ESTE, PARAGUAI (FOLHAPRESS) – Encontrar cigarros eletrônicos nas ruas de Ciudad del Este, primeira cidade paraguaia após cruzar a ponte da Amizade, que a divide de Foz do Iguaçu (PR), é tão fácil quanto achar um motoboy disposto a passar pela fronteira transportando mercadorias contrabandeadas.

Seja com vendedores ambulantes, com comerciantes disfarçados de pedestres nas proximidades da aduana do Paraguai ou mesmo em grandes lojas instaladas em shoppings, os cigarros eletrônicos estão a uma nota de US$ 5 (R$ 24,60) de distância do consumidor.

As apreensões feitas pela PRF (Polícia Rodoviária Federal) no Paraná subiram 1.131% neste ano e acenderam um alerta nos serviços de repressão existentes na fronteira paraguaia.

De 9.500 unidades flagradas entre janeiro e outubro de 2022, o total subiu para 117 mil neste ano, no mesmo período, conforme o superintendente da PRF no Paraná, Fernando César Oliveira.

Ele afirma que, até 2021, praticamente não havia registro de apreensões de cigarro eletrônico não só na fronteira, mas em todo o estado.

“A gente acompanha que o número de fumantes no Brasil vem caindo, mas parece que esses atrativos, digamos assim, como o cigarro eletrônico, o narguilé também, são coisas que acabam atraindo os jovens para o tabagismo. E são contrabando por serem proibidos por uma norma da Anvisa”, diz o superintendente.

Oliveira relata que o estado lidera as apreensões de cigarros convencionais, com 53% do total apreendido no país pela PRF e que metade disso é flagrada em outra fronteira, na da também paranaense Guaíra com Salto del Guairá (Paraguai).

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) sugeriu, no início de dezembro, manter a proibição da venda de cigarros eletrônicos no país e aprovou por unanimidade a abertura de uma consulta pública de 60 dias sobre a proposta.

Essa discussão foi reaberta pela agência há quatro anos e, desde então, recebeu manifestações de entidades médicas, da indústria e de outros países sobre a questão. O órgão recomendou manter o veto, além da adoção de medidas de fiscalização e campanhas educativas.

O debate sobre os cigarros eletrônicos, porém, passa alheio aos olhos e bolsos de consumidores na cidade paraguaia que faz fronteira com Foz do Iguaçu, do lado brasileiro.

“Você compra um cigarro desses por US$ 5 e vende na balada em São Paulo por R$ 150. Óbvio que isso estimula [o contrabando]. Se a pessoa comprar dez cigarros, fará mais de R$ 1.000 de lucro”, conta Cezar Augusto Vianna, chefe da fiscalização da Receita Federal na ponte da Amizade.

As apreensões ocorrem de várias formas. Um casal de idosos foi flagrado numa Range Rover avaliada em mais de R$ 500 mil com cem cigarros eletrônicos. O produto também já foi achado numa ambulância que cruzou a fronteira.

“A orientação não é só procurar em veículos antigos, de valor mais baixo. A ilegalidade pode estar em qualquer lugar”, afirma Vianna.

Veículos utilizados para o transporte de mercadorias contrabandeadas podem também ser apreendidos pelas equipes de repressão, razão pela qual as células criminosas têm optado por carros mais baratos, para o prejuízo ser menor em caso de retenção.

Só neste ano, até setembro, foram apreendidos pela Receita Federal R$ 60,3 milhões em veículos em Foz do Iguaçu.

Na ponte da Amizade, a Folha de S.Paulo acompanhou a apreensão de cartelas de cigarro eletrônico com três mulheres, que alegaram à Receita não saberem que a quantidade caracterizaria contrabando. No caso do produto, a entrada no país é ilegal independentemente da quantidade.

Em Ciudad del Este, as marcas oferecidas são as mais variadas possíveis e as ofertas de compras em grandes quantidades barateiam o custo. Uma embalagem com 30 chegou a ser ofertada por US$ 90 (US$ 3 cada, ou R$ 14,76).

‘TENHO DROGAS, ARMAS E VIAGRA’

Assim como o cigarro eletrônico, a Folha de S.Paulo obteve facilidade para encontrar comerciantes de cocaína e armas em Ciudad del Este.

Um vendedor se aproximou da equipe –que não estava com crachás de identificação no pescoço– e propôs vender um revólver calibre 38 por R$ 1.500. Ao saber que ambos moravam no estado de São Paulo, disse que seria possível entregar a arma na capital paulista ou em qualquer cidade do interior com um frete de R$ 300, totalizando R$ 1.800. “Sem preocupação nenhuma de passar a ponte, vocês ficam tranquilos. Só pagarão quando receberem a arma.”

A reportagem agradeceu a oferta e a recusou, no que o vendedor e outro que se aproximou para ouvir a conversa ofereceram cocaína e maconha. Para comprar, contam eles, bastava nos dirigirmos a uma portinha distante cerca de 50 m de onde estávamos, em meio a bancas de camisas de clubes de futebol falsificadas que permitiam o ingresso a um corredor aparentemente interminável.

Com a nova recusa, foi a vez de uma cartela com 30 comprimidos azuis —o vendedor jurava ser Viagra— ser oferecida por R$ 10. A cartela não tinha inscrições sobre origem, validade e, tampouco, conteúdo.

Nos 100 m seguintes, outros quatro ambulantes ofertaram o que chamaram de medicamento para disfunção erétil pelo mesmo valor. “O meu é de verdade”, arriscou um deles.

A Folha de S.Paulo procurou a embaixada do Paraguai e questionou o governo do país vizinho sobre eventuais medidas tomadas para enfrentar o contrabando e quais seus efeitos, mas não houve resposta.

MARCELO TOLEDO E BRUNO SANTOS / Folhapress

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