WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Com ventos de 200 km/h, o furacão Idalia atingiu a Flórida às 8h45 desta quarta-feira (30), no horário de Brasília, na região de Keaton Beach. Ao atravessar o estado americano, ele deixou um rastro de destruição casas submersas em enchentes, árvores caídas até no palácio do governador.
A velocidade é pouco inferior à da marca utilizada para classificar um furacão de categoria 4, de cerca de 210 km/h. Durante a madrugada, o Idalia chegou a esse patamar, mas enfraqueceu ligeiramente, retornando para a classe 3 na sequência. Fortes chuvas e enchentes acompanham o fenômeno.
Apesar do impacto, não há um dado oficial de mortes até o momento. Relatos da imprensa local afirmam que duas pessoas teriam perdido a vida em acidentes de carro associados ao furacão, o que não foi confirmado pelas autoridades estaduais.
O fenômeno atingiu o estado como um furacão de categoria 3, a mesma do Katrina em 2005, que devastou Nova Orleans, na Louisiana. Ao longo do dia, ele perdeu força, e no fim da tarde já era classificado como tempestade tropical.
Ainda assim, a Flórida permanece em alerta, assim como a Geórgia, a Carolina do Sul e a Carolina do Norte, estados que se preparam para sentir o impacto mais forte do fenômeno até quinta-feira.
Os estragos provocados pelo Idalia na Flórida se concentraram sobretudo na região costeira. As chamadas “storm surges”, o avanço das ondas sobre o litoral, foram agravadas pela superlua, quando o satélite está mais próximo da Terra e na fase cheia.
Em Cedar Key, no oeste do estado, entre Tampa e Tallahassee, o nível da água subiu quase 3 metros. O mesmo aconteceu com o nível do rio Steinhatchee, próximo de Keaton Beach.
O governador Ron DeSantis declarou estado de emergência e emitiu uma ordem de retirada de moradores em 22 dos 67 condados. Aeroportos, pontes e rodovias foram fechados, e aulas, suspensas.
Uma parceria com a Uber liberou corridas de graça para moradores de regiões afetadas em direção a abrigos de emergência. O governo da Flórida também afirma ter negociado com hotéis para que os estabelecimentos recebam hóspedes com animais de estimação.
Nos últimos dias, autoridades orientaram a população a estocar alimentos e a deixar equipamentos eletrônicos carregados. Mais de 200 mil pessoas ficaram sem energia, situação que deve perdurar por dias, devido ao impacto dos ventos sobre a rede de infraestrutura elétrica.
O foco das autoridades agora é resgatar vítimas, restaurar a energia elétrica e avaliar os danos. Há preocupação também com saqueadores. A Fema (Agência Federal de Gerenciamento de Emergências) está auxiliando o governo federal nesses esforços.
A brasileira Danielle Dowling, 37, conta que se preparou comprando água e alimentos que possam ser preparados na churrasqueira, caso fique sem energia. Ela mora em Sanford, a cerca de 40 km de Orlando, com o marido e os dois filhos, de 9 e de 16 anos.
As autoridades locais avisaram que o pior impacto do furacão na região aconteceria por volta das 15h. Danielle, no entanto, relatou apenas ventos fortes e chuva. “Viver nos EUA é isso, todo ano sabemos que temos que nos preparar. Mas as coisas podem sempre mudar de última hora, então estou acompanhando as notícias por todos os aplicativos”, diz ela, que está no país há seis anos e comanda uma empresa de limpeza de casas de luxo.
No ano passado, a previsão também era de que Sanford não sofreria grande impacto do furacão Ian, mas Danielle diz que acabou enfrentando uma enchente com água até os joelhos.
A conjunção de enchentes e tornados provocada pelo furacão complica a estratégia de moradores para se proteger: enquanto a orientação para evitar a água é ficar na parte mais alta das casas, a tática para fugir dos fortes ventos é ficar na mais baixa. Apesar do apelo, imagens da rede de notícias CNN mostraram, por exemplo, dois homens no mar em cima de uma espécie de embarcação inflável.
Os ventos derrubaram um carvalho de cem anos no palácio do governador em Tallahassee, de acordo com uma postagem da primeira-dama, Casey Santis, no X, ex-Twitter.
O Idalia chega aos EUA pouco depois de a tempestade tropical Hilary provocar enchentes e deslizamentos na Califórnia e em Nevada. A Administração Nacional Oceânica e Atmosférica prevê uma temporada de furacões, que vai de junho a novembro, mais agitada que o normal neste ano.
A piora é atribuída às temperaturas recordes do Atlântico. Quanto mais quente a água e o ar, mais força um furacão ganha. Neste ano, há risco de ocorrência de 6 a 11 furacões só na Costa Leste, de acordo com autoridades meteorológicas dos EUA. No ano passado, a Flórida já tinha sido atingida pelo que ainda é considerado o furacão mais letal registrado no estado. O Ian deixou 150 mortos, e DeSantis foi criticado por não ter disparado alertas de esvaziamento das casas a tempo.
“Ninguém mais pode negar o impacto da crise climática. É só olhar ao seu redor”, afirmou o presidente americano, Joe Biden, na tarde desta quarta.
Os desastres climáticos também têm um efeito econômico, ao aumentar os custos de seguradoras e, consequentemente, os valores das apólices residenciais. De acordo com o Instituto de Informações sobre Seguros, seis empresas do segmento ficaram insolventes, sem recursos para quitar dívidas e cumprir obrigações, na Flórida no ano passado, e ao menos 12 deixaram o estado ou colocaram uma moratória na emissão de novas apólices.
O valor anual médio, por sua vez, chegou a US$ 4.200 (mais de R$ 20 mil), o triplo do nacional.
O Idalia é um teste crucial para DeSantis, que disputa a indicação republicana para a vaga do partido na corrida pela Presidência americana no ano que vem. Em segundo lugar nas pesquisas, bem atrás de Donald Trump, ele ainda não conseguiu deslanchar. Uma boa resposta ao fenômeno em seu estado pode ajudá-lo. Por outro lado, se sua gestão da crise for mal avaliada, pode ser a pá de cal na candidatura.
DeSantis, que estava em campanha em Iowa, cancelou eventos e retornou ao estado para coordenar a preparação para o furacão. Apesar da sequência de desastres climáticos associados ao aquecimento global, o governador da Flórida assinou uma lei neste ano que impede autoridades estaduais e locais de usarem como critério o chamado ESG ao escolher prestadores de serviços e investimentos.
No ano passado, ele já havia aprovado uma legislação semelhante, impedindo a adoção dos parâmetros de boas práticas em fundos de pensão estaduais. Para o governador, ESG é uma tentativa das “elites de Davos” em referência à sede do Fórum Econômico Mundial de “impor sua ideologia”.
No debate entre pré-candidatos republicanos, DeSantis não respondeu se, para ele, a crise climática é resultado de ações humanas. Quando os moderadores pediram que os participantes levantassem a mão se achassem que sim, o governador se negou a participar do jogo. “Não somos crianças de escola.”
FERNANDA PERRIN / Folhapress