Gael García Bernal e Diego Luna enfrentam a despedida do sucesso em ‘A Máquina’

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Atormentado por uma derrota desastrosa nos ringues, o lutador Esteban Osuna sente falta dos dias de glória. Conhecido como “La Máquina”, ele busca uma forma de resgatar o sucesso de sua carreira, que construiu ao lado do empresário e melhor amigo, Andy Lujan. Ao estabelecer um acordo com uma organização do submundo dos esportes, a dupla se afunda em uma intriga que pode acabar com todos que amam.

“Nós queríamos contar uma história de como dizer adeus ao sucesso. O boxeador está no topo de sua carreira e chega um momento em que ele precisa se despedir. É algo muito complicado, porque a mente e a maturidade do lutador estão em um ótimo estado para compreender esse momento. Mas o seu corpo não consegue”, diz Gael García Bernal, protagonista, produtor-executivo e um dos criadores da minissérie “A Máquina”. Lançada pela Disney+ na última quarta-feira (9), a produção é dividida em seis episódios.

Aos 45 anos, o ator mexicano detalha o tempo que passou ao lado do colega de elenco, e amigo de longa data, Diego Luna, 41, que vive Andy e também assina a produção executiva e a criação do seriado. Embora já tivessem atuado juntos na televisão, os dois tiveram sua primeira grande colaboração, nos cinemas, com a estreia do diretor mexicano Alfonso Cuáron, com “E Sua Mãe Também”, em 2001, e seguiram trabalhando dentro e fora das telas.

“[A Máquina] surgiu há bastante tempo, quando estávamos tentando descobrir o que vinha a seguir para nós como atores. Começamos a discutir o projeto durante o Festival de Berlim, dez anos atrás, enquanto apresentávamos um filme. Gael tinha acabado de sair de um treinamento de boxe e eu tinha finalizado um documentário sobre o esporte”, conta Luna. Ele explica que a série quase foi lançada como filme e sofreu muitas transformações.

“Entendemos que aquele era o contexto perfeito para uma história sobre a amizade desses dois homens que precisam dar um passo atrás se quiserem seguir em frente”. Em 2018, os dois fundaram a La Corriente del Golfo, que produz “A Máquina” e tem como foco projetos mexicanos que interseccionem o teatro, a televisão e o cinema.

“Acho que é o melhor que pode acontecer quando se conta histórias. Ter a liberdade de falar sobre o que nos importa e celebrar o nosso país, nossa cultura e nossas comunidades”, comenta Luna.

Apesar da preocupação de Esteban com as lutas, a produção se concentra nas operações criminosas que acontecem por detrás do palco. “Seguimos por uma história não arquetípica, uma espécie de anti fábula. É um campo fértil para muitas cores, muitas ambiguidades e muitas contradições. Tudo está em jogo nesse sentido. O boxe é apenas a ‘ponta do iceberg’ “, afirma Bernal.

Essa complexidade é também evidente pelo conturbado relacionamento entre o lutador e sua ex-esposa, Irasema. Interpretada por Eiza González, a jornalista investiga o lado obscuro dos ringues e revela várias camadas que separam as aparências da realidade. Nem por isso a minissérie proíbe que uma vitória seja celebrada em noites de karaokê ou que uma estrela ressentida se apaixone novamente.

“Sempre desejamos que o humor fosse parte de uma reflexão maior. Eu sinto que o formato [do streaming] permite essa mistura de gêneros. Ainda temos muitos momentos de suspense e cenas bastante melodramáticas entre os personagens”, diz Luna. Dividido entre a pressão da mãe para que tenha um filho e a falência gradual de seu cliente, seu personagem talvez seja um dos melhores exemplos dessa miscelânea.

A intersecção entre diferentes estilos também abre espaço para sequências mais lúdicas. Perseguido por erros antigos, “La Máquina” enfrenta alucinações ocasionais, que suspendem aquilo que entende por realidade. De Alejandro González Iñárritu à M. Night Shyamalan, Bernal já trabalhou com diversos diretores que flertam com o fantástico, enquanto Luna se habituou ao imaginário de Star Wars após um filme e uma temporada como o guerreiro Andor.

“Eu sinto que o cinema sempre oferece uma forma de escapar. Uma espécie de mundo de fantasia em que você pode avançar. Isso se tornou uma espécie de segunda natureza do projeto. Queríamos jogar com os personagens de forma que eles não pudessem escolher o próprio destino”, explica Bernal. Ele compara esse aspecto com o Cinema Novo, movimento dos anos 1960 e 1970 que introduz novas formas de se abordar questões políticas e socioculturais do Brasil da época.

Outro diálogo que a minissérie estabelece com o país está na corrupção desse cenário esportivo, que em terras brasileiras tem levado a diversas investigações sobre as bets, as apostas esportivas. Apesar da atmosfera corrupta, a história com Bernal e Luna torna tudo mais leve.

“Esse é um projeto muito pessoal, do qual temos muito orgulho. É como se fosse exatamente o contrário da história que estamos contando. A história desses dois homens que não podem deixar de ir e não podem aceitar que o tempo passou. Estamos aqui refletindo sobre como amadurecemos, mais velhos e vivendo de forma muito mais saudável e emocionante do que nossos personagens”, afirma Luna.

DAVI KRASILCHIK / Folhapress

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