BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Câmara e Senado desembolsaram ao menos R$ 600 mil para bancar a ida de 30 congressistas à edição deste ano do Fórum Jurídico de Lisboa. O evento tem como idealizador o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes e foi realizado na semana passada na capital portuguesa.
De acordo com dados tornados públicos até o momento, o gasto variou bastante conforme o parlamentar: O custo de passagens Brasil-Portugal, por exemplo, foi de R$ 4.314 a até R$ 28,5 mil. A quantidade de diárias solicitadas também variou de 2,5 a até 7.
Os custos para a participação dos parlamentares no fórum são maiores porque o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), por exemplo, não informa os gastos relativos à sua ida ao evento. Lira participou da mesa de abertura do evento, realizado de 26 a 28 de junho.
Dos 25 deputados federais e 5 senadores que tiveram gastos bancados pelo Congresso, apenas 8 constaram na programação oficial como palestrantes ou debatedores. Outros parlamentares também foram ao encontro, mas ou arcaram com as despesas ou tiveram os custos bancados por organizadores.
Os deputados Eduardo da Fonte (PP-PE) e Lula da Fonte (PP-PE), pai e filho, por exemplo, não foram listados na programação como participantes de nenhuma das mesas dos três dias de evento.
Em suas redes sociais, Dudu não fez menção à viagem a Portugal. O filho postou fotos de almoço com o ex-presidente Michel Temer (MDB), além de vídeo em que se disse orgulhoso de representar o povo pernambucano em um fórum que reúne “importantes personalidades do Brasil e do mundo”.
Ele também registrou, em sua fala, que está concluindo o curso de direito no IDP, em Brasília. A reportagem procurou os dois parlamentares, por meio da assessoria, mas não obteve resposta.
O fórum, que neste ano promoveu sua 12ª edição, é realizado pelo IDP, faculdade que pertence a Gilmar Mendes, pela FGV Justiça e pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
O custo médio de passagens pagas aos parlamentares foi de R$ 14,7 mil, sendo que Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) teve o maior valor: R$ 28,5 mil. O congressista, que participou da mesa sobre o impacto das reformas tributárias sobre renda e consumo, não respondeu ao contato da reportagem.
Aguinaldo foi um dos relatores da reforma tributária aprovada pelo Congresso no ano passado.
Outros deputados cujas passagens de ida e volta também custaram aos cofres públicos cerca de R$ 28 mil cada uma, Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) e Felipe Carreras (PSB-PE), argumentaram que o valor alto se deu porque os bilhetes foram comprados em data próxima à viagem.
“Era a passagem disponível no dia da reserva. Foi comprada muito próxima a data da viagem. Nada que não esteja dentro da legalidade”, disse Carreras, por meio da assessoria.
Andrada disse, também por meio de sua assessoria, que participou como palestrante e que o preço da passagem “foi o mais barato na data da compra, sem nenhuma regalia especial”.
Já em relação às diárias, o senador Ângelo Coronel (PSD-BA) foi responsável pelo maior gasto R$ 22,2 mil por sete diárias. No Fórum Jurídico, o senador apenas acompanhou os debates, afirmou a assessoria.
“Ele [o senador] participou antes, nos dias 24 e 25, como palestrante do Workshop do Fibe (Fórum Brasil Europa) sobre tributação e investimentos. Como foi antes para Lisboa, em função desse primeiro evento, e considerando que o Senado inclui nas diárias os dias de deslocamento, pode ser essa a diferença na quantidade de diárias.”
O valor das diárias oscila de acordo com a variação do câmbio, mas ficaram em torno de R$ 2.500 por parlamentar, em média.
O fórum foi apelidado de “Gilmarpalooza” devido às atividades paralelas na capital portuguesa, quase todos promovidos por grupos empresariais, e à profusão de políticos, empresários, acadêmicos, magistrados e demais integrantes do meio jurídico.
O empresário Flávio Rocha, dono da rede de lojas Riachuelo, por exemplo, patrocinou recepção a políticos e autoridades brasileiras em um apartamento de cobertura de sua propriedade em Lisboa. João Camargo, presidente do conselho do grupo de empresários Esfera, promoveu jantar em que aproveitou para comemorar o aniversário de Lira, que completou 55 anos durante o evento.
Aliado às festividades juninas, o fórum de Lisboa tem contribuído já faz alguns anos para que a última semana de junho de cada ano se transforme em um recesso informal no Congresso, que só realiza sessões e votações pró-forma, com baixa presença de parlamentares.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, dados dos portais de transparência apontavam na semana passada a ida ao fórum de ao menos 160 autoridades da Justiça, dos governos estaduais, da gestão Lula (PT) e de outros órgãos públicos.
Só o governo do Tocantins, por exemplo, formou uma comitiva com 14 nomes, entre eles o governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) e a primeira-dama e secretária estadual de Participações Sociais, Karynne Sotero. O governo do estado não se manifestou sobre a viagem
Os organizadores afirmam financiar o evento sem outros patrocinadores, mas se negam a detalhar os custos. Há ainda uma discrepância de informações sobre quem banca a ida de convidados a Lisboa.
Enquanto o IDP afirma que os organizadores não pagam despesas de nenhum dos convidados, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, e o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, disseram ter parte dos custos pagos pela FGV. A fundação se negou a dar informações sobre esses casos.
Além de Lira, o fórum de Lisboa teve a participação de outros parlamentares que ocupam posto de relevo no Congresso.
Estiveram presentes, entre outros, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), que é presidente nacional do PP, Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo Lula no Senado, e o deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA), cotado para suceder Lira no comando da Câmara, no ano que vem.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), foi convidado e constava na programação oficial, mas não compareceu.
RANIER BRAGON E ANA POMPEU / Folhapress