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Grande e sangrenta revolta de escravizados em Minas Gerais é recontada em livro

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma data como 13 de maio é amplamente conhecida. Como se aprende na escola, a princesa Isabel assinou o decreto de abolição da escravidão nesse dia, em 1888. Embora relevante, a decisão sempre merece ser problematizada pela ausência de medidas do governo para compensar aqueles que tinham sido escravizados.

Poucos sabem, porém, de um outro 13 de maio, 55 anos antes da Lei Áurea. A revolta de escravizados de Carrancas, no sul de Minas Gerais, em 1833, tende a ganhar mais visibilidade agora, com o lançamento do livro “Caramurus Negros”.

A obra de Marcos Ferreira de Andrade, professor de história da Universidade Federal de São João del Rei, reconstitui e analisa o levante que levou à morte de pelo menos 33 pessoas. Entre as insurreições ocorridas no Sudeste durante o Brasil Império de que se tem notícia, a de Carrancas é a mais sangrenta.

O episódio resultou na maior condenação coletiva de escravizados à pena de morte durante o longo período de escravidão no país. Foram 17 condenados, dos quais 16 foram, de fato, executados. Apenas um conseguiu escapar da forca, atuando como carrasco dos demais.

Com participação de cerca de 60 escravizados, a rebelião aconteceu em apenas um dia em três propriedades da família Junqueira, próximas das localidades de Carrancas e São Tomé das Letras, no sul de Minas.

Na fazenda Campo Alegre, o líder da revolta, Ventura Mina, e outros escravizados mataram, a pauladas e golpes de foice, Gabriel Francisco de Andrade Junqueira, filho do deputado Gabriel Francisco Junqueira, que mais tarde se tornaria barão de Alfenas.

Da Campo Alegre, os rebelados foram para a fazenda Bela Cruz, onde mataram José Francisco Junqueira, irmão do deputado, e vários de seus familiares. O grupo só encontrou resistência na terceira fazenda, a Jardim, onde Ventura Mina e seus companheiros foram mortos a tiros, uma reação que encerrou o levante.

Ao final daquele 13 de maio, nove membros da família Junqueira e cinco escravizados estavam entre as vítimas fatais. Grande parte dos insurgentes que escaparam dos tiros naquele dia morreram enforcados alguns meses depois.

Um boato que correu pela região, associado ao contexto político da época, foi o fator preponderante para desencadear a revolta, de acordo com Ferreira.

Naqueles anos da década de 1830, eram três as principais correntes políticas no país: os liberais moderados defendiam a monarquia constitucional e a descentralização política; os liberais exaltados seguiam propostas semelhantes, mas tinham atuação popular mais ostensiva; e os caramurus que, em nome de uma antiga ordem, reivindicavam o retorno de dom Pedro 1º ao Brasil. Dois anos antes, em 1831, o imperador havia abdicado do trono e retornado a Portugal.

Em meio a esses embates por poder, um negociante disse a Ventura Mina que os caramurus no comando de Ouro Preto tinham eliminado a escravidão na cidade. Se a então capital de Minas havia libertado os escravizados, por que a família Junqueira mantinha o sistema em suas fazendas? Era a faísca para a rebelião.

Os documentos indicam, segundo o historiador, que a tal abolição era uma informação falsa posta em circulação por um caramuru para insuflar o grupo de Ventura Mina contra Gabriel Francisco Junqueira, uma liderança entre os liberais moderados.

“As elites políticas instrumentalizaram os grupos subalternos, algo que a gente encontra em vários momentos da história. Além disso, entendo que os escravos se apropriaram das identidades políticas em disputa, no caso, os caramurus, daí ‘caramurus negros’, título do livro”, afirma o autor.

Com participação de cerca de 600 insurgentes -mais de 70 morreram durante os conflitos-, a Revolta dos Malês, de 1835, é considerada o maior levante de escravizados da história do país. O motim em Salvador teve, no entanto, quatro homens condenados à morte, número bem inferior ao registrado em Carrancas.

Para Andrade, essa diferença se deve ao fato de que a insurreição mineira envolveu diretamente uma família que conciliava poder político e econômico. “A Revolta dos Malês foi uma luta pela liberdade e contra o governo da Bahia, não contra a elite senhorial propriamente. Já Carrancas atingiu uma família senhorial, aquilo que os senhores mais temiam numa sociedade escravista.”

“Caramurus Negros” é resultado de um trabalho de mais de três décadas do historiador, que, ao lado de colegas, descobriu o processo criminal dos rebelados no Museu Regional de São João del Rei –hoje a documentação está no Iphan da cidade mineira.

Depois desse contato inicial, ele decidiu se aprofundar nos estudos sobre esse período para poder avaliar com cuidado as revelações trazidas pelos autos.

Em meio ao lançamento do livro, Andrade prepara um documentário sobre a Revolta de Carrancas. Um outro 13 de maio, ele espera, terá a atenção que merece.

Caramurus Negros: A Revolta dos Escravos de Carrancas – Minas Gerais (1833)

Preço: R$ 71(256 págs.)

Autoria: Marcos Ferreira de Andrade

Editora: Chão

Lançamentos: No dia 24 de junho, às 19h, na livraria Cabeceira – pça. Alfredo Weiszflog, 38, São Paulo; e em 9 de julho, às 15h, na sede do IHGB – av. Augusto Severo, 8 – 12º andar, Rio de Janeiro

NAIEF HADDAD / Folhapress

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