Greta Gerwig diz em Cannes que ainda é uma diretora independente após ‘Barbie’

CANNES, FRANÇA (FOLHAPRESS) – Com um longo vestido de listras azuis e brancas, evocando um tema náutico que combina com a paisagem costeira emoldurada pela janela logo atrás, Greta Gerwig chegou ao Palácio dos Festivais nesta terça-feira (14), primeiro dia do Festival de Cannes, que a escolheu como presidente do júri desta 77ª edição.

Tarefa árdua? “Neste momento, na verdade, eu estou mais preocupada com o corset que estou vestindo”, diz a diretora do sucesso “Barbie”, se remexendo com desconforto na cadeira à frente deste repórter. “Olha, as mulheres do século 19 eram realmente corajosas.”

Sem abandonar o sorriso largo e com seus cabelos loiros, Gerwig parece uma edição vintage da boneca da Mattel. Mas que, logo reconhece, tem preocupações maiores que o corset que a incomoda. “Ainda estou me beliscando para saber se isso tudo é real, e me sinto completamente sob pressão.”

Gerwig é a primeira diretora americana e a segunda diretora em geral a ocupar a presidência do júri da competição pela Palma de Ouro, depois de Jane Campion, em 2014. Também é, aos 40 anos, a mais jovem no cargo desde Sophia Loren em 1966, quando a diva italiana tinha apenas 31.

“É uma escolha óbvia, já que Greta Gerwig abraça de forma audaciosa a renovação do cinema mundial, algo que Cannes é, todos os anos, precursor e amplificador”, disseram Iris Knobloch, presidente, e Thierry Frémaux, diretor do festival quando a cineasta de “Lady Bird” e “Adoráveis Mulheres” foi anunciada.

A escolha aconteceu em dezembro, quando as contas de bilheteria de 2023 estavam para fechar e o sucesso de “Barbie”, com US$ 1,5 bilhão, cerca de R$ 7,7 bilhões arrecadados, ainda gerava debates sobre quão autoral de fato era o filme bancado pela Warner Bros. com a ajuda da Mattel.

“Eu ainda me considero uma cineasta independente, mas que consegue fazer filmes com grandes estúdios. Eu sinto que fiz os filmes que fiz da maneira que queria, sem ter que comprometer qualquer coisa que seja”, afirma, citando medalhões como John Ford e Alfred Hitchcock como diretores que conciliavam a parte autoral com a comercial do trabalho.

“Eu não categorizo os filmes que vejo por quão comerciais ou artísticos eles são. Eu busco a pessoa por trás da obra, e isso qualquer filme pode oferecer. Até porque a noção do que é comercial está em constante mudança, e o importante é gerar uma conexão com o público”, continua. É uma filosofia que ela promete levar para a escolha dos premiados desta edição do festival.

Passarão pelo seu crivo gente que ela admira –”quero chegar aos 80 fazendo filmes como o Coppola”, diz– e também o brasileiro Karim Aïnouz, que compartilha com ela um olhar sensível para temas e personagens femininos. O cearense exibe, na semana que vem, o thriller erótico “Motel Destino”, enquanto o cineasta americano apresenta o projeto dos sonhos “Megalopolis”.

“Eu vou ver todos os filmes com coração e mente abertos. Eu não acho que eles devem seguir determinados critérios, eu não tenho uma agenda” diz Gerwig ao ser confrontada com sua relação com pautas feministas. Neste ano, apesar da sua presidência no júri, da Palma de Ouro honorária para Meryl Streep e da exibição do curta “Moi Aussi”, sobre o movimento MeToo, a competição oficial tem apenas quatro diretoras entre seus 22 longas.

“E eu não estou sozinha, a escolha será uma conversa sobre cinema entre todos os membros do meu júri, que é uma coisa que eu amo”, afirma ainda, citando “O Piano”, de Campion, e “Taxi Driver”, de Martin Scorsese, como alguns de seus premiados em Cannes favoritos.

Fazem parte do júri que Gerwig comanda os atores franceses Omar Sy e Eva Green, a atriz americana Lily Gladstone, o ator italiano Pierfrancesco Favino, a roteirista turca Ebru Ceylan, o cineasta japonês Hirokazu Kore-eda, a cineasta libanesa Nadine Labaki e o cineasta espanhol Juan Antonio Bayona.

Uma curiosidade que o grupo descobriu no jantar da noite anterior foi que todos eles têm cachorros. O tema, e as fotos e vídeos dos pets compartilhados entre eles, dominou o encontro do grupo, que se denominou o júri do festival “canin”, numa brincadeira com a palavra francesa para canino. “Foi muito fofo, mas agora queremos trazer nossos cachorros a Cannes.”

LEONARDO SANCHEZ / Folhapress

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