SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A greve envolvendo diversas categorias do funcionalismo paulista desta terça-feira (28) tem como objeto central protestar contra os planos da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) de repassar serviços públicos estaduais à iniciativa privada. O governador tem acusado os sindicatos de agirem com “clara motivação política” para classificar como abusivo o protesto.
É uma pauta política, de fato, segundo especialistas em direito sindical e de relações do trabalho ouvidos pela Folha. Classificá-la como abusiva, porém, não é simples. Há diferentes interpretações de juristas quanto ao que pode ou não ser reivindicado em protestos do tipo.
Aqueles que apontam uma greve de caráter político como invariavelmente abusiva escoram essa posição na jurisprudência do TST (Tribunal Superior do Trabalho), embora o posicionamento da corte nem sempre conte com a concordância de instâncias a ela subordinadas.
A posição do TST pode ser resumida da seguinte forma: a greve legítima é a que trata de direitos que se pretendem ver respeitados ou criados, como reajuste salarial ou vantagens diversas, explica o advogado Maurício Pepe De Lion, especialista em direito do trabalho do escritório Dias Carneiro.
Há pouquíssimo espaço na jurisprudência da Justiça do Trabalho para contestar essa posição, segundo Alexandre de Almeida Cardoso, sócio na área de direito trabalhista e previdenciário do escritório TozziniFreire.
“Entendo que nossa legislação e jurisprudência já definiram de forma clara esse tema, quanto à abusividade de greves com motivação política”, afirma Cardoso.
A greve em curso nos serviços estaduais não estaria, portanto, associada a nenhuma questão relacionada ao contrato de trabalho desses empregados públicos, segundo Ricardo Calcini, professor de direito do trabalho do Insper. “A privatização em nada está relacionada às condições de trabalho desses trabalhadores”, comenta.
Quem avalia como legítimo o direito de que a manifestação carregue posicionamento político escora-se, porém, na doutrina da OIT (Organização Internacional do Trabalho) sobre a liberdade sindical.
A agência das Nações Unidas especializada em relações do trabalho entende que sindicatos podem organizar protestos envolvendo pautas cujo efeito sobre direitos trabalhistas pode se dar de forma indireta, segundo Antonio Rodrigues de Freitas Júnior, professor de direito do trabalho da USP.
“Certas pautas impactam as relações de trabalho e o direito dos trabalhadores, como o vínculo de trabalho, que é o caso desta greve”, diz Freitas. “É por este motivo que o direito se estende a outras pautas”, comenta.
Freitas também afirma que elementos políticos sempre permeiam discussões trabalhistas e, portanto, não faria sentido utilizar esse argumento para classificar como ilegítimo o direito à manifestação dos servidores estaduais. “Custa crer que uma greve qualquer não tenha um ingrediente político.”
Alinhada à amplitude da liberdade de organizações de trabalhadores para escolherem suas pautas, a Constituição Federal assegura o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender, diz Freitas, repetindo o que está escrito no artigo da 9º Carta Magna.
Sindicatos de servidores de órgãos geridos pelo governo estadual prometem parar a cidade de São Paulo nesta terça com uma greve unificada do Metrô, da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), da Sabesp (Companhia de Saneamento do Estado), professores da rede pública e de servidores da Fundação Casa.
Os grevistas pedem a suspensão de projetos de privatização em curso no estado, como o da Sabesp.
A paralisação de metroviários e ferroviários está confirmada para ocorrer das 0h às 23h59. A decisão foi ratificada após ausência de acordo na reunião entre sindicalistas e secretários da gestão Tarcísio, realizada nesta segunda (27) na sede da Secretaria de Parcerias em Investimentos.
Especialmente no caso dos metroviários, em caso de paralisação total irá contrariar decisão da Justiça do Trabalho. O desembargador Marcelo Freire Gonçalves, do TRT-2 (Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região) determinou que funcionários do Metrô trabalhem com 80% da capacidade total nos horários de pico.
Esta será a terceira greve envolvendo metroviários neste ano. Em outubro, um protesto realizado pela categoria também tinha a concessão de serviços à iniciativa privada como alvo.
A primeira paralisação deste ano ocorreu em março e, embora incluísse o fim de terceirizações e privatizações na pauta, também continha argumento diretamente relacionado a direitos trabalhistas.
Nos dois casos anteriores ao atual, trabalhadores descumpriram determinações judiciais contrárias à interrupção do serviço.
Redação / Folhapress