SÃO PAULO, EUA (FOLHAPRESS) – Em 2022, analistas esperavam uma recessão nos Estados Unidos em 2023. No terceiro trimestre, porém, o PIB (Produto Interno Bruto) do país avançou 4,9%
Até há poucos meses, as apostas eram altas em uma retração na economia do país e alta do desemprego em 2024 como desfechos inevitáveis de uma política monetária ferrenha no combate à inflação, que atingiu os piores níveis em 40 anos nos EUA.
Agora, apesar de alguns especialistas dizerem que um risco de recessão não está completamente afastado, o mercado vê cada vez mais distante a possibilidade de retração da economia americana.
Em um ambiente de alívio na pressão inflacionária, mesmo com uma atividade econômica resiliente e o mercado de trabalho mais aquecido que o esperado, o Federal Reserve, banco central americano, começou a moderar o tom em seus comunicados de decisão de juros.
Essa mudança fez o mercado passar a enxergar o início do ciclo de corte de juros em 2024, mais precisamente após o primeiro trimestre, o que adiciona otimismo ao cenário.
“A situação nos Estados Unidos está melhor que o previsto. A inflação está caindo mesmo com um nível de desemprego baixíssimo”, diz Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington.
“Os EUA conseguiram fazer com que caísse a inflação sem que a economia desacelerasse. Então, acho que os juros vão cair neste ano. Não vejo lugar para manter a taxa no patamar que está. Não tem por quê”, completa.
Mas o que aqueceu a economia dos EUA, mesmo com juros tão altos para os padrões americanos, com taxa referencial na faixa entre 5,25% e 5,50%? Especialistas citam os incentivos que o governo de Joe Biden concedeu à indústria do país.
“A economia se recuperou mais rápido do que o esperado graças à política econômica de incentivo e subsídios à indústria, algo que deu muito certo”, afirma Barbosa.
Dentro do setor industrial, Barbosa destaca o impulso da indústria bélica, em meio a um contexto geopolítico de guerras e conflitos armados nos quais os EUA aparecem concedendo apoio por meio do fornecimento de armas.
É o caso da Guerra da Ucrânia. Deflagrada em 24 de fevereiro de 2022, em pouco mais de um ano Washington já tinha enviado a Kiev quase 1 milhão de projéteis de 155 mm, o que, em tempos de paz, significariam cinco anos de produção.
“A indústria bélica nos EUA está vendendo como nunca por conta da Guerra na Ucrânia. Então, pode-se dizer que o ambiente internacional está favorável para o país”, diz Barbosa.
Apesar desse investimento do governo na indústria e na guerra representar um rombo ainda maior nas contas públicas do país, o professor Ricardo Teixeira, coordenador do MBA em Gestão Financeira da FGV (Fundação Getúlio Vargas), lembra que 2024 será ano de eleições presidenciais.
Como Biden pode concorrer, ele fará de tudo para entregar um crescimento econômico positivo em 2024, segundo Teixeira, o que representa mais gastos público, mas também injeção de dinheiro na economia.
Teixeira cita ainda a capacidade de resiliência dos EUA. Segundo o especialista, culturalmente o país tem um planejamento muito bem feito de gastos tanto no setor público como no privado.
“A decisão de gastos pelos governos e pelas empresas americanas é sempre bem organizada”, diz. “A economia americana tem uma resiliência que impressiona o mundo há décadas”, completa.
Para ambos os especialistas, uma recessão no país está descartada neste ano.
Já para o gestor de renda variável Marcos Kawakami, do banco europeu BNP Paribas no Brasil, o risco de contração da economia americana em 2024 não está afastada. Para ele, a mudança de tom repentina do Fed pode estar refletindo dados de atividade econômica que não estão completamente claros ainda.
“Sinceramente hoje eu acho que a gente não tem um cenário tão limpo. Houve uma mudança de postura no discurso do [Jerome] Powell [presidente do Federal Reserve] muito grande em relação ao que ele vinha falando antes. A gente acredita que tenha alguma informação aí”, diz Kawakami.
“Será que ele está vendo um cenário mais desafiador de atividade, e por isso ele fez essa mudança de postura? Por isso não dá para descartar um cenário recessivo em 2024”, argumenta.
STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress