BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro Fernando Haddad (Fazenda) apresentou, nesta terça-feira (9), ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a proposta de compensação da perda de arrecadação com a desoneração da folha de pagamento de 17 setores e dos municípios por meio de um aumento de 1 ponto percentual na alíquota da CSLL (Contribuição Social Sobre Lucro Líquido), tributo que incide sobre o lucro das empresas.
A elevação da carga tributária seria temporária e vigoraria por dois a três anos.
O governo também informou a Pacheco que parte da desoneração será compensada com medidas de corte de despesas obrigatórias. O corte de despesas será obtido com a economia ainda neste ano da revisão de benefícios sociais, como o BPC (Benefício de Prestação Continuada) concedido aos idosos e pessoas com deficiência de baixa renda.
Os cálculos do governo apontam que o aumento da alíquota significaria uma elevação de R$ 17 bilhões nas receitas da União por ano.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, medidas legais para garantir a economia nas despesas já serão incluídas no relatório do senador Jaques Wagner (PT-BA) do projeto que estabelece a desoneração integral da folha neste ano e o aumento gradual da tributação entre 2025 e 2027.
O custo da medida em 2024 foi calculado em R$ 26,3 bilhões, mas o entendimento jurídico do governo é que essa compensação poderá se dar ao longo dos próximos anos, desde que o Congresso aprove uma fonte de financiamento perene.
De acordo com um integrante do governo, havia outra opção de alterar o JCP (Juros sobre Capital Próprio), mas a equipe econômica optou pela mudança na alíquota da CSLL.
O JCP é um instrumento usado por grandes empresas que permite que a remuneração (distribuição de lucros) aos acionistas seja enquadrada como despesa -e, assim, abatida do Imposto de Renda.
Segundo duas pessoas a par das negociações, a proposta foi mal recebida por Pacheco.
Nesta quarta (10), o presidente do Senado conversou pessoalmente com Lula (PT), Haddad e Wagner no Palácio do Planalto. Pacheco afirmou à imprensa que o presidente considerou muito boas as ideias da Fazenda e da renegociação da dívida dos estados com a União.
O presidente do Senado disse, porém, que as duas propostas precisam de “ajustes” e que ainda não há definição sobre a CSLL. Pacheco também indicou que a votação do PL da desoneração pode ocorrer na semana que vem.
“Não há definição ainda em relação a isso, o importante desse projeto é materializar o acordo que foi feito, a reoneração gradativa ao longo do tempo, mantendo 2024 como está hoje, e adotar aqueles programas que eu acredito são programas suficientes para fazer frente à desoneração.”
Segundo o titular da Fazenda, houve avanço nas tratativas. “Eu fiquei de fazer a redação de um último objeto de negociação feito com o presidente. Vou sentar com a Receita agora para redigir aquilo que foi adiantado para o presidente e vou remeter para o senador Jaques até hoje [quarta] à noite, se tudo der certo”, disse.
Haddad classificou a situação como “delicada”, mas disse que tem havido “sensibilidade” de Pacheco para concluir as tratativas. “Tem que ser votado [antes do recesso parlamentar]. Até porque eu preciso disso para fechar o Orçamento [de 2025]”, afirmou.
Desde a devolução de parte da MP (medida provisória) que limita a compensação de créditos de Pis/Cofins -apresentada originalmente pela Fazenda para compensar a desoneração-, senadores têm afirmado que há resistência a propostas que aumentam a carga tributária.
O governo, por outro lado, entende que as medidas de compensação sugeridas pelo Senado não são suficientes para compensar a renúncia fiscal com a desoneração, e algumas delas de difícil cálculo do impacto na arrecadação.
Pacheco apresentou quatro propostas: regularização de valores de imóveis na declaração do Imposto de Renda; taxação do e-commerce até US$ 50; abertura de um novo prazo de repatriação de recursos no exterior e Refis para empresas com multas e taxas vencidas cobradas pelas agências reguladoras.
Após a reunião desta quarta, Wagner afirmou à imprensa que só “entrará” aumento de imposto, se as demais medidas não atingirem o valor estimado para compensar o rombo. Ele disse que a alta na CSLL valeria por dois anos e citou percentuais menores, como 0,25 e 0,5.
Segundo ele, Haddad afirmou na reunião com Lula que precisa de uma medida de compensação “segura”, diante das incertezas em relação às ideias aventadas pelo Senado, como a atualização de ativos.
“Eu posso precisar só de 0,25, só 0,5 [ponto percentual na alíquota da CSLL]. Dois anos. Se eu não alcançar. A divergência está aí. O Haddad diz: eu não posso lançar uma proposta sem botar coisa segura. Aí o Rodrigo diz: mas aí vai sobrar [dinheiro]. Então a condição é: eu não quero que sobre.”
Em entrevista coletiva na manhã de terça, Pacheco afirmou que o pacote pode “perfeitamente fazer frente ao custo da desoneração”, estimado em cerca de R$ 18 bilhões neste ano.
Já o ministro da Fazenda afirmou a jornalistas, durante a tarde, que “não tem de onde tirar R$ 18 bilhões”. Haddad disse que valerá a decisão do STF, se as propostas de compensação forem insuficientes.
“Nós encaminhamos propostas que cobrem [a desoneração de setores e prefeituras]. Infelizmente, se não cobrir, nós vamos fazer valer a decisão do Supremo Tribunal Federal, que determina o equilíbrio das contas”, disse o ministro.
“Não tem de onde tirar R$ 18 bilhões. Nós vamos ter claro isso. Depois tem esses solavancos no mercado e ninguém entende por quê. Nós vamos dar um sinal claro de que os Três Poderes vão perseguir um equilíbrio”.
Governo e Congresso têm menos de dez dias para chegar a um consenso sobre a reoneração da folha de pagamento. Governistas admitem que há resistências no Senado à proposta, mas afirmam que será melhor para todos, se houver consenso.
A necessidade de compensação para o atendimento de regra prevista na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) foi o argumento utilizado pela União para pedir ao STF (Supremo Tribunal Federal) a suspensão da desoneração em abril.
Entre os grupos beneficiados com a desoneração está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha de S.Paulo. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, entre outros.
Em maio, o ministro do STF Cristiano Zanin suspendeu por 60 dias a decisão proferida por ele no final do mês de abril que restabeleceu, a pedido do presidente Lula a reoneração da folha de pagamentos.
O magistrado determinou que se não houver solução no prazo, a liminar terá eficácia plena. Ou seja, os setores voltarão a pagar impostos sobre a folha de pagamento de seus funcionários.
ADRIANA FERNANDES, MARIANNA HOLANDA, THAÍSA OLIVEIRA E NATHALIA GARCIA / Folhapress