SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O grupo terrorista Hamas, que hoje enfrenta Israel com violência inédita, não foi exatamente a mesma entidade islâmica que disputou e venceu os não-religiosos da Autoridade Nacional Palestina e assumiu há 17 anos o controle da Faixa de Gaza. Naquela época o Hamas afirmava querer um “governo limpo”, crítica à corrupção atribuída aos palestinos que ainda mantêm o poder na Cisjordânia.
Mas com o passar do tempo, a popularidade local do Hamas, que tem o apoio dos grupos mais radicais nas mesquitas, se corroeu porque ficou claro que não sabia administrar o território. Sua única e obsessiva preocupação era destruir Israel, algo irrealista em razão da superioridade militar do Estado israelense, que derrotou em sucessivas guerras os vizinhos árabes que sonhavam destruí-lo.
A aniquilação de Israel e a expulsão dos judeus do Oriente Médio está na carta pela qual o Hamas foi criado em 1987. Em outra de suas loucuras, o grupo terrorista queria transformar a Palestina numa república islâmica, a exemplo do Irã, que em 1979 depôs uma monarquia pró-ocidental e instituiu o regime dos aiatolás.
O Irã patrocina o Hamas, fornecendo-lhe dinheiro e armas. Faz o mesmo com o Hizbollah, grupo religioso que controla do sul do Líbano e é parceiro em Gaza dos fanáticos que também têm em Israel um inimigo que acreditam ser destrutível.
O Hamas não dialoga e não negocia com o governo israelense, ao contrário da OLP (Organização para a Libertação da Palestina), uma espécie de confederação de grupos que era dirigida por Yasser Arafat (ele morreu há 19 anos) e que herdara o nacionalismo árabe não-religioso. Essa ideologia possuía como liderança em todo o Oriente Médio, a partir de 1954, o presidente egípcio Gamal Abdel Nasser. Ao politizar as mesquitas, o Hamas representou uma nova ruptura com o antigo nasserismo. Algo semelhante já havia ocorrido com o Irã, com o Afeganistão e com grupos criminosos como a Al Qaeda.
A islamização da política não estava presente em episódios históricos importantes, como a guerra da independência da Argélia, que terminou em 1962. Quanto ao Hamas, ele nasceu como um braço do grupo egípcio Irmandade Muçulmana, do qual descende Ahmed Yassin, primeiro dirigente do grupo terrorista e que morreu em atentado em 2004.
Gaza era um território egípcio até a Guerra dos Seis Dias (1967), quando passou para o controle de Israel, que por sua vez o cedeu aos palestinos, numa época em que ainda era cogitada a tese dos “dois Estados” (Palestina e Israel).
O Hamas militarizou ao extremo o território de Gaza, com seus 2,2 milhões de habitantes e pouco menos de 40 km de extensão. Construiu uma rede de túneis para armazenar armas, longe do registro dos drones operados por Israel. E produziu mísseis de baixa tecnologia que passou a lançar sobre cidades israelenses mais próximas.
Tais disparos, antes da operação desencadeada agora em outubro, já faziam periodicamente vítimas civis israelenses. O Hamas dispunha também de voluntários para se explodirem como homens-bomba e produzirem grande número de vítimas em locais movimentados de Israel.
Em 2018 o governo israelense e o Hamas chegaram, com intermediação egípcia, a negociar uma trégua. Na época, o ministro israelense da Defesa, Avigdor Lieberman, em sinal de protesto acabou pedindo demissão.
Em 1993, quando reivindicou seu primeiro atentado suicida, o Hamas já era considerado um grupo terrorista. É assim que o enxergam Israel, Estados Unidos, todos os países da União Europeia, o Reino Unido e o Egito. O grupo tem como aliado o Irã e de maneira intermitente chegou a flertar com a Síria e a Turquia. Um de seus grandes inimigos na região é a Arábia Saudita, que antes do atual conflito se aproximava de Israel e tentava negociar uma solução para o problema palestino.
JOÃO BATISTA NATALI / Folhapress