SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um homem que pagou o Tinder por quatro anos e não conseguiu encontros procurou o Procon em Porto Alegre (RS) alegando que a plataforma não cumpriu o que os anúncios prometiam sobre impulsionamento do perfil, que aumentariam sua visibilidade e as chances de matches. Ele diz que sempre apareciam os mesmos perfis, alguns deles falsos.
O caso, que ganhou atenção das redes sociais nesta semana, levantou a discussão sobre os direitos de quem opta por pagar um app de namoro. Para especialistas, o aplicativo tem a obrigação de garantir a maior visibilidade prometida na assinatura paga, mas não há como assegurar que ‘vai dar namoro’.
O Tinder não respondeu até a publicação desta reportagem.
Segundo a advogada Aline Barreto, especialista em direito digital, os aplicativos de relacionamento impulsionam o perfil, mas as consequências disso são de total responsabilidade do usuário. “Não há obrigação jurídica de entrega de resultados quando o serviço depende de fatores externos, como as interações e preferências das outras pessoas”, diz. Ela diz que os usuários precisam gerenciar suas expectativas.
Para Stefano Ferri, advogado especializado em direito do consumidor, o Tinder tem a responsabilidade de cumprir o que promete quanto às vantagens específicas da assinatura. “Se o aplicativo sugere, de forma direta ou indireta, que a assinatura aumentará o sucesso em encontrar parceiros, pode haver margem para discutir possível indução ao erro”, diz.
Ferri, porém, observa que, se a frustração do consumidor está associada a uma propaganda que eleva expectativas de forma irreal, tais cláusulas podem ser contestadas, com base na vulnerabilidade do consumidor e na boa-fé objetiva. “Se o aplicativo deixar de informar que os resultados variam amplamente de usuário para usuário, pode haver uma violação do direito à informação adequada”, diz.
O CDC (Código de Defesa do Consumidor) exige que a empresa atue com boa-fé e ofereça informações claras. Para os especialistas ouvidos pela reportagem, o CDC permite, em casos de assinatura, buscar reembolso parcial caso o serviço seja vendido de forma que induza a expectativas irreais. No entanto, eles observam que essa condição não se aplica claramente ao caso. O usuário não revelou o quanto gastou e não pediu reembolso.
No site do Tinder, consta que os pagantes têm acesso a itens virtuais como o Boost, recurso que dá destaque ao perfil por 30 minutos na área escolhida. A plataforma promete aumento de chances de matches e até dez vezes mais visualizações, mas sem garantia de encontros presenciais.
A Secretaria Municipal de Transparência e Controladoria de Porto Alegre, responsável pelo Procon, afirma que o Tinder não se responsabiliza pela segurança dos encontros, já que não há anúncios no aplicativo que prometam isso. Mesmo assim, notificou a empresa e exigiu que prove o serviço de impulsionamento contratado.
O Procon já recebeu outras queixas sobre o Tinder, a maioria sobre cancelamentos não processados e cobranças indevidas, mas esta é a primeira sobre ausência de encontros, diz a secretaria.
PRÓXIMOS PASSOS
O prazo inicial para responder ao Procon se encerrou na quinta-feira (7), mas a empresa pediu mais cinco dias. Depois de receber a resposta, o Procon entrará em contato com o usuário para verificar se ele está satisfeito. Se aceitar a explicação, o caso será arquivado. Caso contrário, mediará nova tentativa.
Caso o usuário busque reembolso, os termos de uso do Tinder deixam claro que isso não se aplica a itens virtuais. “Todas as compras e resgates de itens virtuais feitos através dos nossos serviços são finais e não reembolsáveis. O Tinder não é obrigado a oferecer reembolso, independentemente do motivo.”
GUSTAVO GONÇALVES / Folhapress