Incertezas atrasam elaboração do Orçamento enquanto ministérios pedem mais verba

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A dificuldade para fechar as estimativas de receitas e despesas e as medidas necessárias para equilibrar as contas em 2025 provocou atrasos no processo de elaboração do Orçamento e gerou reclamações de diferentes ministérios.

A grita não se resume à demora no envio do limite para gastos discricionários que cada pasta terá no ano que vem, mas é também uma tentativa antecipada de atenuar qualquer possível redução de verbas diante das restrições enfrentadas pela equipe econômica.

O impasse é agravado pela falta de projeções precisas sobre o impacto de medidas já tomadas pelo governo ou em avaliação. Até agora, o governo anunciou a intenção de fazer um corte de R$ 25,9 bilhões nas despesas obrigatórias no ano que vem, a partir do pente-fino de benefícios sociais, mas os detalhes ainda não foram divulgados.

Do lado das receitas, o governo já calculava ter um rombo de cerca de R$ 50 bilhões a cobrir para alcançar a meta fiscal zero para 2025.

A falta de dados mais exatos dificultou o avanço na formulação do Orçamento nas últimas semanas, e os chamados referenciais monetários dos ministérios não foram distribuídos para o restante da Esplanada. Os órgãos precisam do número para fazerem suas contas e estimarem recursos adicionais necessários. Agora, o envio está previsto para a segunda quinzena de julho.

Uma das fontes de incerteza, conforme relatos feitos à reportagem, é a adesão zero à principal medida de arrecadação de 2024 –a negociação especial para contribuintes derrotados pelo voto de desempate nos julgamentos do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais).

Até o fim de maio nenhum contribuinte aderiu formalmente ao programa, criado com a promessa de gerar R$ 55,6 bilhões neste ano. Técnicos do governo acreditam que parte do recurso poderá entrar no caixa ainda em 2024, mas há dúvida de quanto contabilizar nas estimativas do ano que vem.

Por outro lado, outras iniciativas adotadas pelo governo tiveram um desempenho acima do esperado e devem gerar receitas extras também em 2025. É o caso da taxação de fundos exclusivos de investimento, concentrados nas mãos dos super-ricos, e dos recursos em paraísos fiscais (offshores). O governo ainda está atualizando as projeções dessas medidas.

Do lado dos gastos, a equação ainda é desafiadora. Técnicos dos ministérios envolvidos no pente-fino precisam elaborar notas e pareceres que deem sustentação ao impacto da economia anunciada na quarta-feira (3) pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) após reunião extraordinária da JEO (Junta de Execução Orçamentária), formada pelos ministros da Casa Civil, da Fazenda, do Planejamento e da Gestão.

O encontro foi o terceiro da equipe econômica naquele dia e ocorreu a menos de dois meses do prazo para fechar todos os números e entregar a proposta orçamentária ao Congresso Nacional, em 31 de agosto.

Economistas veem o corte concentrado no pente-fino com ceticismo, embora o anúncio tenha contribuído para a melhora do ambiente no mercado. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por sua vez, tem demonstrado resistência e descartado opções mais estruturais, prolongando o vaivém na discussão fiscal.

O chefe do Executivo já riscou da lista alternativas como desatrelar do salário mínimo o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e alterar a previdência dos militares. “O problema não é que tem que cortar. Problema é saber se precisa efetivamente cortar ou se precisa aumentar a arrecadação. Temos que fazer essa discussão”, afirmou Lula há cerca de uma semana ao portal UOL.

Diante do quadro, a equipe econômica já avisou ministros de que a probabilidade de aumento de verbas em relação a 2024 é baixa, antes mesmo de enviar a informação do espaço para gastos em 2025. Diferentes pastas manifestaram insatisfação internamente com o cenário, e outras vêm ressaltando a necessidade de ampliar recursos.

O Ministério do Turismo, por exemplo, afirma à reportagem que pretende propor aumento de verbas no Orçamento do ano que vem para melhorar a infraestrutura turística do país, com foco na reconstrução do setor no Rio Grande do Sul.

O Itamaraty diz que precisa de verba maior do que a de 2024 devido à organização da COP30 (Conferência da Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas em Belém, em novembro de 2025) e da Cúpula dos Brics, entre outros itens.

Apesar das demandas, a situação de aperto orçamentário é vista em ao menos uma ala da equipe econômica como oportunidade para convencer o primeiro escalão do governo de que as dificuldades fiscais têm implicações sérias para cada pasta. A visão é que muitos titulares da Esplanada ficam alheios à discussão sobre as contas e a necessidade de revisar gastos enquanto fazem internamente pedidos ambiciosos de verbas.

Por isso, técnicos esperam que o processo de elaboração do Orçamento resulte em maior participação dos ministros no debate fiscal, inclusive para defender mudanças e até reformas estruturais para liberar espaço para outras despesas.

Os entraves na discussão se mantêm mesmo após o governo baixar a meta fiscal para 2025, que passou a ser de zero, com uma alta gradual até chegar a 1% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2028.

Na apresentação do novo arcabouço fiscal, a promessa era entregar um superávit de 0,5% do PIB no ano que vem e alcançar um resultado positivo de 1% do PIB já em 2026, último ano de mandato de Lula.

Na época da flexibilização, em abril, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, reconheceu que os reveses sofridos pelo governo na busca por medidas de arrecadação contribuíram para a decisão de rever a trajetória.

“O ano começou mais desafiador em relação a gastos tributários. Estamos enfrentando um revés junto ao Congresso Nacional. É fundamental que venham acompanhadas de compensação, sob pena de comprometer a trajetória de recuperação fiscal”, disse o secretário na ocasião.

FÁBIO PUPO, IDIANA TOMAZELLI E ADRIANA FERNANDES / Folhapress

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