Indústria de cosméticos usa IA para consumidor ‘testar’ produtos na tela

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Conferir a cor de um batom ou de uma base na tela muitas vezes não é o suficiente para fazer uma boa escolha. Da mesma maneira, comprar um xampu ou condicionador sem saber ao certo a real necessidade do cabelo pode parecer um tiro no escuro. Do ponto de vista do fabricante, pode ser extremamente arriscado lançar um produto de beleza no mercado sem ter certeza do quão eficiente ele é.

A indústria de cosméticos e beleza tem usado a inteligência artificial para aumentar o nível de segurança nestas situações, envolvendo a compra ou o lançamento de produtos. Empresas como as multinacionais L’Oréal, Natura & Co. e a brasileira Boticário vêm investindo cada vez mais em tecnologia a fim de garantir assertividade nas escolhas, seja por parte do consumidor ou das suas próprias apostas no mercado -que, por sinal, só cresce.

O Brasil é o segundo maior mercado de perfumaria do mundo, só atrás dos Estados Unidos. As vendas em 2022 movimentaram US$ 6,8 bilhões (R$ 32,6 bilhões), segundo a consultoria Euromonitor. Em maquiagem, o país está entre os dez maiores consumidores globais, com faturamento de US$ 2 bilhões (R$ 9,5 bilhões) no ano passado.

A L’Oréal, o maior conglomerado do mundo no setor de beleza, com faturamento de US$ 38,26 bilhões em 2022 (R$ 183,1 bilhões), vem usando a ferramenta de realidade aumentada ModiFace para incrementar suas vendas. “É uma ferramenta poderosa de recomendação para a consumidora”, diz Guilherme Eler, diretor de novos negócios e inovação da L’Oréal Brasil. A companhia comprou a ModiFace em 2018 e, desde então, ofereceu mais de 1.400 serviços por meio da realidade aumentada, envolvendo rosto e cabelos.

Entre eles está o Clube da Beleza virtual, uma parceria da marca Maybelline, da L’Oréal, com a Shopee: no aplicativo da varejista online, é possível “experimentar” as cores e os efeitos de batons, bases e máscaras de cílios.

Outro serviço foi o Effaclar Spotscan, da marca La Roche-Posay. A ferramenta de análise de pele utiliza um banco de dados de 6.000 imagens científicas de homens e mulheres com diferentes tipos de pele e diferentes níveis de severidade de acne para apontar qual o melhor tratamento.

“O cliente tira três selfies e recebe uma recomendação personalizada da rotina de cuidados que ele deve adotar”, diz Eler. Segundo o executivo, depois que a ferramenta foi lançada, a taxa de conversão em vendas dobrou e o tíquete médio ficou 25% maior.

Em junho, a L’Oréal participou do Viva Technology 2023, em Paris, quando apresentou as novidades em dispositivos de diagnóstico alimentados por dados. Entre elas, está o Kérastase K-Scan: uma ferramenta de diagnóstico capilar online. Ao responder a uma série de perguntas, que dura cerca de dois minutos, a consumidora recebe a indicação da rotina de beleza que o seu cabelo precisa.

Algo semelhante já é oferecido pela multinacional brasileira Natura & Co., dona das marcas Natura, Avon e The Body Shop. A empresa lançou a recomendação personalizada de produtos Lumina via diagnóstico capilar. Por meio de um aplicativo, da câmera do smartphone e de uma lente portátil acoplada ao aparelho, é possível aumentar em até 20 vezes a resolução de imagem do fio de cabelo para observar os danos presentes.

Para padronizar as imagens e obter assertividade no diagnóstico, um banco de dados foi construído contendo mais de 18 mil imagens de referência de fios, contemplando cabelos de diferentes curvaturas, cores e níveis de danos, incluindo a diversidade da população.

Dessa forma, foi possível reconhecer padrões nas imagens referentes ao dano da superfície dos fios, o que permitiu gerar o algoritmo de IA para o diagnóstico personalizado com uma precisão que vai se aprimorando, à medida que são incluídas novas imagens no banco de dados. Ou seja, o próprio sistema vai reaprendendo e se atualizando, por meio do processo de machine learning.

A inteligência artificial do diagnóstico capilar hoje é capaz de recomendar mais de 15 mil combinações de produtos da linha Natura Lumina. A inovação está presente em nove lojas físicas da Natura.

Já no Boticário, a IA começa a ser usada no controle de qualidade dos produtos. Por meio de um software proprietário, o Lyra, a empresa vem trabalhando no cruzamento de dados sobre fórmulas e embalagens com os testes de estabilidade de produtos, antes mesmo do lançamento. O teste serve para conferir a eficácia de itens como cremes e maquiagens.

“Reunimos os dados dos últimos 14 anos, envolvendo 3.000 estudos de estabilidade, com 7.500 testes feitos ao ano, e vamos começar a cruzar essas informações”, afirma Juliana Canellas, diretora de qualidade do grupo Boticário -dono de marcas como Boticário, Eudora e Quem Disse, Berenice?.

O objetivo, segundo ela, é diminuir o tempo de chegada do produto ao consumidor final, além de reduzir custos com os testes. “A nossa expectativa é adiantar o lançamento de um produto entre 60 e 90 dias, além de gerar uma economia de R$ 6 milhões ao ano com testes de estabilidade.”

A empresa foi a primeira a fazer uso da inteligência artificial para produzir um perfume -o Egeo, lançado em 2019. Desde então, os investimentos em tecnologia se aceleraram. Nos últimos quatro anos, a empresa multiplicou por dez os investimentos na área (não revelados). Em pessoal, a equipe passou de 200 para 2.500 pessoas, no esforço para trazer mais inovação e qualidade aos produtos.

DANIELE MADUREIRA / Folhapress

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