A inflação da Argentina voltou a bater recordes nesta quinta-feira (12). O IPC (Índice de Preços ao Consumidor) subiu 138,3% no acumulado dos últimos 12 meses, divulgou o Indec, o IBGE da nação vizinha.
Esta é a maior alta de preços desde agosto de 1991, época que o país lutava contra a inflação com a chamada “conversibilidade”, quando o governo decretou que um peso valeria um dólar.
Naquele período, a inflação saltou 144,4%. Este recorde já havia sido quebrado em agosto, quando o IPC somou 124,4%.
Na evolução mensal, a alta foi de 12,7%, a maior desde fevereiro de 1991, quando os preços na Argentina subiram 27%. O dado veio maior do que os 11,5% esperados pelos economistas.
A crise econômica do país piorou nos últimos meses, em meio à campanha para a eleição presidencial, que ocorre em 22 de outubro.
Em agosto, o candidato da situação e o ministro da Economia, Sergio Massa, determinou uma desvalorização de 21% da moeda oficial, logo depois das eleições primárias.
A medida havia sido acordada com o FMI (Fundo Monetário Internacional) para destravar desembolsos do empréstimo de US$ 44 bilhões feito com o órgão.
Nesse meio-tempo, o dólar blue (o mais usado, apesar de ilegal) foi de 685 pesos para até 1.040 no início de outubro. Nesta quinta, estava a 980 pesos. O câmbio oficial é de 365 pesos por dólar.
Segundo o economista Federico Zirulnik, do Centro de Estudos Económicos e Sociais Scalabrini Ortiz, a inflação de setembro ainda reflete a desvalorização do peso, pois ela ocorreu em 14 de agosto. “Estatisticamente é o que se chama efeito de arrasto”, disse.
Apesar do salto nos preços, Zirulnik descartou se tratar de uma nova hiperinflação. “Agora estamos estabilizados em uma inflação alta, mas estabilizados. Se estivéssemos em uma hiperinflação, como [a inflação] no mês passado foi de 12%, este mês seria de 15% ou 20%, ou ainda de 25%. Essa é a diferença”.
Outro fator que contribuiu para o salto na cotação do dólar, e consequentemente na inflação, foi o bom desempenho do candidato ultraliberal Javier Milei. Uma das suas propostas é dolarizar a Argentina, abolindo o peso e o Banco Central e adotando a moeda dos Estados Unidos como divisa oficial. O êxito do político nas pesquisas desencadeou uma corrida dos argentinos por dólares.
“Nos dados de outubro veremos se essa corrida pode ter pressionado novamente os preços. Se o governo conseguir manter o câmbio oficial, talvez em outubro fiquemos abaixo desse índice de inflação de 12%. Senão, os preços podem seguir escalando e, aí sim, em algum momento haver hiperinflação”, afirmou Zirulnik.
Em setembro, os maiores impactos na alta dos preços vieram de vestuário e calçados, com alta mensal de 15,7%, e de lazer e cultura, que registraram avanço de 15,1%.
Na variação anual, o que mais encareceu foram os alimentos, que mais que dobraram de preço, com alta de 150,1%.
Nesta quinta, o Banco Central argentino voltou a aumentar a taxa de juro anual do país de 118% para 133% (11% efetivos mensais) para prazos fixos. Apesar de elevado, ele ficou abaixo da inflação. Segundo a autoridade monetária, há uma desaceleração nos preços desde o pico registrado na terceira semana de agosto, o que sugeriria que a inflação mensal pode ter uma desaceleração significativa em outubro.
Apesar de um novo pico inflacionário e uma nova alta de juros, a Bolsa de Valores de Buenos Aires fechou em alta de 1,62%.
A Argentina já teve dois episódios de hiperinflação em 1989, de 3.079% ao ano, e em 1990, de 2.314%. O país adotou então a “conversibilidade” do peso com o dólar, em uma paridade fixa de 1 para 1, apoiada em privatizações, desregulamentações e uma abertura total da economia.
A inflação anual caiu para um dígito na época, mas o aumento das importações aumentou a dívida em moeda estrangeira, arruinou a indústria e provocou uma grave recessão que precipitou a crise política de 2001 e a desvalorização do peso.
O relatório FocusEconomics de setembro, que reúne mais de 40 analistas de bancos e consultorias, estima que a inflação fechará em 2023 maior do que no ano anterior, “impulsionada pelo colapso do peso em meio ao financiamento monetário do déficit fiscal” ou seja, a impressão de dinheiro para financiar a dívida pública.
JÚLIA MOURA / Folhapress