Irmão de Gilmar Mendes, candidato em MT, critica extremismo e se abraça a Bolsonaro

DIAMANTINO, MT, E SALVADOR, BA (FOLHAPRESS) – Era uma terça-feira, 9 de abril, quando Jair Bolsonaro (PL) desembarcou em Diamantino, cidade do interior de Mato Grosso. O ex-presidente participou de um ato político, comeu um pastel em uma barraca e foi recebido em um churrasco na fazenda de Reinaldo Moraes, o “Rei do Porco”.

Entre uma garfada e outra, falou ao telefone com o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes, filho da terra e irmão do candidato a prefeito Francisco Ferreira Mendes Júnior, o Chico Mendes (União Brasil).

Acossado por investigações e com uma relação conflituosa com ministros do STF, Bolsonaro deixou de lado o bolsonarismo raiz para endossar a candidatura do irmão de Gilmar em Diamantino.

O apoio do ex-presidente e a influência política do clã Mendes deixaram Chico Mendes na condição de favorito na disputa contra Carlos Kan (Novo) —são apenas dois candidatos na cidade, que não tem representantes da esquerda na corrida pela prefeitura.

Com 22 mil habitantes, Diamantino é marcada pela onipresença do agronegócio, com uma profusão de caminhões trafegando no perímetro urbano. A reportagem esteve na cidade no último sábado (28), mas em meio a suas largas avenidas não havia sinal de eventos de campanha eleitoral.

Os candidatos aproveitaram o dia para buscar votos nos distritos rurais de Bojuí e Deciolândia —cerca de 2.000 dos 16 mil eleitores de Diamantino vivem na zona rural, em povoados que chegam a ficar mais de 100 km distantes do centro da cidade.

Fundada em 1728 e elevada a vila em 1820, Diamantino é uma das cidades mais antigas de Mato Grosso e já foi o município com maior extensão territorial do estado, de onde se desmembraram outras 22 cidades.

A família Mendes tem tradição na política local. A cidade já foi governada pelo avô e pelo pai de Gilmar. O irmão, Chico Mendes, já foi prefeito de 2001 a 2008, quando se elegeu por PSB e PPS (hoje Cidadania), e agora tenta voltar à prefeitura para um terceiro mandato.

Nos últimos anos, Diamantino se tornou um reduto de Bolsonaro, onde ele teve 62% dos votos válidos em 2022. A 182 km de Cuiabá, a cidade fica em uma região de transição entre a baixada cuiabana, com expressiva votação em Lula, e os municípios do chamado “nortão”, onde Bolsonaro teve adesão ainda maior.

A visita de Bolsonaro ao município é apontada como um ponto fora da curva até por bolsonaristas de Mato Grosso. Diamantino não estava na rota do ex-presidente quando visitou o estado em abril.

A ideia inicial era ir a Sinop, onde ocorreria uma feira agropecuária, mas uma passagem pela cidade de Gilmar foi articulada pelo senador Wellington Fagundes (PL) e pela deputada Amália Barros (PL), que morreu em maio.

Até então, o grupo político de Carlos Kan se ancorava em discurso de moralidade e anticorrupção para vencer o irmão do ministro. Mas a adesão de Bolsonaro ao rival nas urnas pegou a todos de surpresa.

“A gente queria entender, mas quem tem mais força política? O cara que está lá no Supremo ou quem está iniciando? Nós somos pessoas do baixo clero fazendo campanha”, afirma Claudimar Barbacovi, coordenador de campanha de Carlos Kan em Diamantino.

Ele afirma que o eleitorado bolsonarista de Diamantino ainda não compreendeu o apoio do ex-presidente a Chico Mendes, que entrou na disputa aliado ao PSD, partido do senador licenciado Carlos Fávaro, hoje ministro da Agricultura do governo Lula.

O PL de Bolsonaro indicou o empresário Antônio da Carol como candidato a vice e doou R$ 300 mil para a campanha —o valor é equivalente ao repassado pelo partido a Tião Bocalom, em Rio Branco, um dos dois prefeitos de capital do PL e candidato à reeleição.

Empresário do agronegócio e dono de um patrimônio de R$ 56,4 milhões, Chico Mendes viveu um hiato eleitoral de 16 anos, atuando nos bastidores da política local e sem disputar cargos eleitorais.

O prefeito Manoel Loureiro (MDB) não concorre à reeleição nem apoia um dos candidatos. Ele foi alvo de operação da Polícia Civil em 2023, quando foi divulgado um vídeo em que aparece recebendo dinheiro.

No ano passado, antes da operação, Chico, Gilmar e Loureiro estiveram juntos na solenidade que marcou a compra de um hospital pela prefeitura por R$ 6 milhões. Mas o agora candidato a prefeito nega ter relação de proximidade com o atual ocupante do cargo.

Chico Mendes também não conhecia Bolsonaro até o encontro em abril e diz que agora fala com o ex-presidente toda semana, por mensagens de texto. Apesar da proximidade, afirma não embarcar no discurso bolsonarista, que classifica como extremo.

“De repente, não é nem culpa do Bolsonaro. Nós cidadãos é que muitas vezes somos extremistas”, afirmou Chico Mendes à reportagem.

Aliados de Bolsonaro afirmam ver a aliança como um aceno do ex-presidente a Gilmar. Mas o candidato a prefeito nega influência do irmão e diz fazer questão de separar sua atuação política com as posições de Gilmar como ministro do STF.

“Em virtude da vida que o Gilmar leva a gente cuida muito para não transformar aquilo que é um relacionamento de irmão em um relacionamento comercial”, afirmou Chico, que não é sócio do ministro em nenhum de seus negócios.

Gilmar apareceu em um vídeo da campanha eleitoral do irmão. Nele, são mostrados depoimentos dos irmãos Chico, Gilmar, Moacyr e Conceição sobre a trajetória da mãe, Nilde Alves Mendes, que morreu em 2007. O decano do STF fala sobre a perda da mãe em tom emocionado.

Chico Mendes também diz não falar sobre decisões judiciais com Bolsonaro: “A gente fala de tudo, menos de um assunto jurídico. Ele tem uma timidez característica e sequer menciona o assunto. Nós evitamos, até para que eu não seja uma ponte que possa ligar ele ao ministro Gilmar.”

O STF deve se debruçar sobre ações que envolvem Bolsonaro na corte, incluindo os inquéritos que o indiciaram nos casos da falsificação de certificados de vacinas contra a Covid-19 e o das joias, que apura o possível desvio de presentes dados por autoridades estrangeiras ao então presidente.

Bolsonaro também é investigado no inquérito dos ataques de 8 de janeiro, no qual é apontado como líder de uma organização criminosa que planejou um golpe de Estado para se manter no poder.

LÁZARO THOR E JOÃO PEDRO PITOMBO / Folhapress

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