BRASÍLIA, DF E MACEIÓ, AL (FOLHAPRESS) – Os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP-AL), respectivamente, indicaram que a proposta da isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5.000 -anunciada pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) na quarta (27)- não deve avançar em um futuro próximo pelo Congresso Nacional.
Nesta sexta-feira (29), ambos se pronunciaram em apoio às medidas de corte de gastos e austeridade fiscal, mas criticaram possíveis mudanças na arrecadação com impostos.
O movimento foi visto como um aceno ao mercado e chegou a aliviar a alta do dólar ao longo do dia, mas não foi suficiente para conter a disparada da moeda americana, que fechou cotada a R$ 6 pela primeira vez na história.
“Não é pauta para agora e só poderá acontecer” se houver condições fiscais para isso, ou seja, se houver garantia de receitas que compensem a perda de arrecadação, afirmou Pacheco sobre a mudança no IR.
“A questão de isenção de IR, embora seja um desejo de todos, não é pauta para agora e só poderá acontecer se (e somente se) tivermos condições fiscais para isso. Se não tivermos, não vai acontecer. Mas essa é uma discussão para a frente, que vai depender muito da capacidade do Brasil de crescer e gerar riqueza, sem aumento de impostos”, continuou o presidente do Senado.
Pacheco defendeu ainda que, em temas de política fiscal, é preciso afastar o medo da impopularidade que, segundo ele, ronda a política.
“Nesse sentido, é importante que o Congresso apoie as medidas de controle, governança, conformidade e corte de gastos, ainda que não sejam muito simpáticas. Inclusive outras podem ser pensadas, pois esse pacote deve ser visto como o início de uma jornada de responsabilidade fiscal”, declarou.
Por meio de suas redes sociais, Lira adotou o mesmo tom.
“Toda medida de corte de gastos que se faça necessária para o ajuste das contas públicas contará com todo esforço, celeridade e boa vontade da Casa”, disse ele, também nesta sexta.
“Qualquer outra iniciativa governamental que implique em renúncia de receitas será enfrentada apenas no ano que vem, e após análise cuidadosa e sobretudo realista de suas fontes de financiamento e efetivo impacto nas contas públicas”, completou, sem citar especificamente o Imposto de Renda.
Na quinta-feira (28), durante reunião com senadores, Haddad reafirmou que o aumento da faixa de isenção está condicionado à existência de fonte de receita.
Integrantes do governo não enxergam uma afronta nas manifestações, mas um movimento para aplacar tensão no mercado, que respondeu positivamente.
Após as falas dos parlamentares, o dólar, que vinha operando acima dos R$ 6,00 pela manhã -chegando a R$ 6,115 na máxima do dia-, passou a cair e atingiu a mínima de R$ 5,955 perto das 13h.
“O Congresso dizer que vai barrar qualquer coisa que não esteja de acordo com o objetivado com o pacote fiscal coloca um pouco de gelo nas coisas”, afirma Matheus Matheus Massote, especialista em câmbio da One Investimentos.
O alívio, porém, não se sustentou por muito tempo, e a moeda logo voltou a subir, ainda em reação às preocupações fiscais. Encerrou em alta de 0,19%, cotada a R$ 6,001.
Ao longo de novembro, a divisa avançou 3,62%, e, na semana, 3,25%. No acumulado do ano, a valorização é de 23,46%, segundo a plataforma CMA.
Ainda que o valor seja recorde na base nominal -a que desconsidera a inflação do cálculo-, a maior cotação real foi atingida em setembro de 2002, na esteira da primeira eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Corrigido pela inflação, o valor do dólar naquela ocasião seria hoje o correspondente a R$ 8,75.
Colaboradores de Lula lembram que, desde a quarta, Pacheco e Lira se comprometeram a trabalhar pela aprovação das medidas. Relatam ainda que, na conversa dos dois com o presidente, ficou claro que o debate sobre o aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda só ocorrerá no ano que vem, e com calma. Nem se debateu o mérito, já que é uma agenda para 2025.
Há no governo até quem aposte que a nota de Pacheco tenha sido divulgada em consonância com a equipe econômica, uma vez que o próprio ministro da Fazenda tem falado em neutralidade ao detalhar a proposta.
Em reunião em Alagoas com o governador Paulo Dantas (MDB), deputados federais e estaduais, o deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB) seguiu a mesma linha do que foi dito por Lira e Pacheco.
Ele é o principal nome para assumir a presidência da Câmara dos Deputados em fevereiro. Motta reiterou a necessidade de condições fiscais para que seja feita a mudança no IR, que deverá ser discutida somente no ano que vem.
Segundo ele, essa é uma posição que o Congresso vem tomando ao longo dos anos tanto para aprovação de reformas propostas pelo governo Lula ou anteriores. “Nós devemos agora nos debruçar sobre os cortes, que é aquilo que tem que ser votado até dezembro para que consigamos cumprir o arcabouço fiscal que é tão importante para nós e para a economia”, disse.
Haddad detalhou na quinta (28) o pacote do governo para a contenção de gastos públicos, estimando uma economia de R$ 71,9 bilhões em 2025 e 2026.
Uma das principais medidas é a limitação do ganho real do salário mínimo, que vai acompanhar as mesmas regras do arcabouço fiscal -cujo limite de despesas tem expansão real de 0,6% a 2,5% ao ano.
Após semanas de expectativa pelo anúncio, no entanto, a proposta final acabou decepcionando o mercado financeiro, ao excluir medidas de maior impacto fiscal e por ter sido divulgada ao mesmo tempo de uma mudança no Imposto de Renda, que pode significar mais problemas para as contas públicas.
Nessas medidas, o governo propôs elevar para até R$ 5.000 a faixa de isenção de Imposto de Renda, tendo como fonte de compensação a taxação de quem tem renda superior a R$ 50 mil mensais.
RICARDO DELLA COLETTA, JOÃO GABRIEL, JOSUÉ SEIXAS E CATIA SEABRA / Folhapress