FLORIANÓPOLIS, SC (FOLHAPRESS) – Quem cruza o litoral de Santa Catarina pela BR-101 não passa por Itapema sem se impressionar com a quantidade de prédios em construção na estreita área que separa a rodovia das belas praias do município. Ao longo de 14 quilômetros de orla, a distância entre o asfalto e o mar atinge entre 480 e 580 metros.
Não por acaso, depois de Balneário Camboriú, a cidade tem o segundo metro quadrado mais caro do Brasil (R$ 12.706), de acordo com o Índice FipeZAP de Venda Residencial de fevereiro, na frente de cidades como São Paulo, Florianópolis e Vitória, e aposta fortemente na verticalização, com arranha-céus que já passam de 60 andares.
Em cinco anos, a área licenciada para novas obras praticamente triplicou. Em 2023, foram emitidos alvarás de construção para 1,4 milhões de metros quadrados. Em 2017, foram 551 mil m2.
Para atrair mais investimentos, a prefeitura anunciou o alargamento de 4 km da faixa de praia. “A verticalização de edifícios está bastante valorizada. Como nosso cartão postal é a praia, nós temos que ter cuidado com a sombra”, afirma o secretário de Planejamento Urbano, Marcelo Márcio Correia. O alargamento deve ser executado em 2024 e custará R$ 100 milhões.
Um exemplo é o do jogador Neymar, que está construindo um prédio de 41 andares que inclui um tríplex de R$ 40 milhões com vista para o mar.
Em 2022, o município instituiu a lei do cone de sombreamento, que limita a altura dos prédios de acordo com projeção da sombra na praia.
A lei se restringe praticamente às primeiras quadras da praia. Nas demais regiões, “o céu é o limite”, afirma o urbanista Francisco Antônio Carneiro, que coordena pesquisas em ecologia e desenho urbanístico na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).
“Essa conta não fecha, há um abismo entre o teto quase ilimitado da altura dos prédios e um baixo índice de capacidade de infraestrutura. Isso provoca uma série de problemas e agrava tantos outros”, afirma Carneiro.
No município, o limite máximo de altura dos prédios é relativo e deve observar a lei do cone de sombra e a taxa de ocupação do solo.
Com 75 mil habitantes, Itapema está entre os menores municípios em área do Brasil, com apenas 58,2 km². Mais da metade do território, 32,4 km², faz parte do Refúgio da Vida Silvestre de Itapema, uma unidade de conservação de proteção integral onde é impensável construir.
Em outubro de 2023, pesquisadores da UFSC emitiram uma nota técnica advertindo sobre os perigos ambientais dos projetos de engordamento de praias no litoral catarinense.
O estudo propõe uma reclassificação desses empreendimentos, exigindo EIA (Estudo de Impacto Ambiental) mais detalhados, devido aos possíveis efeitos negativos, como o aumento da erosão e mudanças na biodiversidade local.
Para um dos autores da nota técnica, Paulo Horta, especialista em Ecologia e Oceanografia, a interferência humana, sem as devidas precauções, pode colocar em risco a biodiversidade marinha do litoral. Segundo ele, a ocupação desordenada do litoral já resultou na perda de até 90% da floresta submersa em regiões do litoral catarinense.
PRESSÃO POR MAIS INFRAESTRUTURA
Presidente do Sinduscon (Sindicato da Construção Civil) da chamada região Costa Esmeralda, Rodrigo Passos Silva destaca o impacto na economia da cidade. “A construção responde por expressiva parcela na geração de empregos no município e fomenta uma grande rede de negócios e serviços em seu entorno.”
Ele diz reconhecer, porém, a necessidade de um melhor planejamento. “Itapema precisa desenvolver seu sistema viário com mais planejamento e implantar um olhar macro sobre a cidade e o futuro que queremos.”
A preocupação de melhorias é compartilhada por investidores, como Ivan Tonon, morador de Florianópolis que investe em imóveis: “O município tem o desafio de fazer melhorias na orla, na praia, mas também na infraestrutura mais pesada, de escoamento sanitário e vias de acesso. Esses investimentos maiores ficam mais difíceis e caros à medida que o município cresce”.
O economista Ricardo Pazzotti, 39, começou a observar a transformação de Itapema por volta dos anos 2000, notando que “Balneário Camboriú já estava começando a ficar lotada”.
A intensificação da construção levou sua família a aceitar uma proposta de permuta em 2016, trocando a casa por apartamentos em um novo edifício. Apesar dos benefícios, como maior oferta de serviços, Pazzotti diz que a cidade perdeu a tranquilidade e o trânsito piorou: “Não existe mais a tranquilidade de antes”.
Dos R$ 604 milhões do orçamento do município para 2024, R$ 122 milhões (cerca de 20%) serão destinados para infraestrutura urbana e serviços urbanos. Do total, R$ 100 mil será destinado para a conservação ambiental.
FÁBIO BISPO / Folhapress