SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Com duas decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) nas mãos, a diretoria do Jockey Club de São Paulo afirma que espera uma correção no cálculo do valor que precisa pagar anualmente de IPTU (Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana) para retomar o pagamento do tributo.
Neste ano a cobrança é de R$ 20.298.317,00. A reportagem apurou que nenhuma parcela foi paga até o momento.
Nas duas decisões, relativas aos impostos cobrados em 1990 e 1991, a corte decidiu que o clube estava isento de pagar qualquer valor relativo àqueles dois anos em razão de distorções na base de cálculo.
Com revés nesses dois processos, a prefeitura teve que anular toda a cobrança de IPTU de 1990 e 1991, deixando então de arrecadar quase R$ 140 milhões, em valores atualizados.
Os advogados que atuam para o Jockey argumentam que os dois casos foram os únicos da disputa que transitaram em julgado, ou seja, não cabem mais recursos das decisões. Ao todo, os processos demoraram quase 20 anos para uma decisão final.
O STJ reconheceu os fatores apontados pelo clube para contestar o lançamento do imposto: área construída maior, fator obsolescência (coeficiente de depreciação do valor do imóvel pela idade) e o padrão da construção.
No lançamento do imposto feito pela prefeitura, por exemplo, consta como área construída 108 mil metros quadrados, enquanto a perícia apurou 87 mil metros quadrados.
Além dessas duas ações de execução fiscal, há pelo menos outras seis em andamento, referentes aos impostos de 2011 a 2020. Os advogados do Jockey convivem com a expectativa de o STJ tomar decisões iguais às de 1990 e 1991.
A gestão Ricardo Nunes (MDB) afirmou em nota que não acredita em novas derrotas. “As decisões referem-se apenas ao IPTU devido em dois processos específicos”, diz.
“É objeto de provas e de interpretações, e não a uma tese jurídica que seria replicada para os anos futuros”, completa a administração municipal.
Segundo a gestão Nunes, há 500 ações judiciais em andamento e o clube tem débitos inscritos em dívida ativa no valor de R$ 862.404.767,37, a grande parte relativa ao IPTU e o restante, ao ISS (Imposto Sobre Serviços).
O Jockey atribui à prefeitura a falta de atitude para solucionar o imbróglio. O clube afirma que concordou em abrir mão das contestações de valores a serem pagos até 2010 em troca de uma avaliação especial, um processo administrativo em que as duas partes debatem os pontos nebulosos da cobrança, inclusive com perícias nas áreas discutidas.
Os advogados do clube argumentam que os pedidos são feitos e negados sistematicamente desde 2011.
A composição, segundo eles, faria parte do acordo que transferiu a propriedade da chácara Jockey, um terreno de 151 mil metros quadrados na região do Butantã, em 2011, para o poder público.
Mas, o que prometia ser uma pacificação entre as duas partes, tornou-se mais um capítulo da disputa. O clube calcula ter direito a receber pelo menos R$ 340 milhões pela área. O valor, dizem seus advogados, é a atualização da diferença entre o que foi pago pela prefeitura no ato de desapropriação e a avaliação feita posteriormente por um perito judicial.
No processo que se arrasta desde 2014, o Tribunal de Justiça de São Paulo fixou uma indenização de R$ 125.081.724,16 –valores da época– a ser paga pela prefeitura ao Jockey. O restante do valor a ser pago, segundo os advogados, refere-se a custas, juros e correção monetária.
A gestão Nunes, no entanto, contesta o valor. Nos autos, o município sustenta que o valor da indenização é de R$ 75.246.138,90, incluindo a dedução de um perímetro de quase 4.000 metros onde há um lago, que, diz a prefeitura, é público. Esse valor foi definido por um assistente técnico do município.
“[O lago] trata-se de uma área pública, que havia sido indevidamente ocupada pelo Jockey, razão pela qual não lhe cabe indenização”, afirma a prefeitura.
Já o assistente técnico do clube se propôs a mostrar que o lago não corresponde à área pública e, por isso, deve ser considerado nos cálculos da indenização.
Se já não era boa antes, a relação entre os dois lados ficou estremecida de vez quando Nunes sancionou uma lei, em julho, que proíbe as corridas de cavalos com apostas na capital paulista.
A Justiça concedeu uma liminar, em caráter provisório, para suspender os efeitos da lei. A lei é vista nos corredores do clube como uma forma de inviabilizar a sua atividade fim, pois seria o único afetado pela mudança.
Sob a presidência do vereador Milton Leite (União Brasil), o Legislativo municipal também havia aprovado a revisão do Plano Diretor pondo o hipódromo entre os 186 parques públicos propostos para a capital, o que facilita ao Executivo declarar a utilidade pública do imóvel.
Leite foi acusado na ocasião de ter feito a inclusão da área como parque sem o devido debate.
Fundado em 1875 como Club de Corridas Paulista na Mooca, na zona leste, o hipódromo mudou para Cidade Jardim, zona oeste, em 1941. O terreno de 600 mil metros está em uma das áreas mais valorizadas da cidade, o que faz com que críticos das mudanças no plano diretor vejam o interesse da especulação imobiliária nas imediações do clube.
A instituição é presidida por Benjamin Steinbruch, proprietário da CSN e que tem se articulado para tratar do imbróglio com a gestão Nunes.
Como o Painel revelou, em março deste ano, Steinbruch teria escalado o presidente nacional do PSDB, Marconi Perillo, para fazer lobby pelo Jockey. O tucano, como conselheiro do clube, chegou a se reunir com Nunes, mas não conseguiu frear a manobra de Leite.
CARLOS PETROCILO E LEONARDO FUHRMANN / Folhapress