SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Entre 2021 e 2024, 51% das contratações do programa habitacional Minha Casa, Minha Vida (MCMV) foram feitas por jovens, indicam dados da Caixa e do Ministério das Cidades obtidos pela Folha. Em termos absolutos, os brasileiros entre 18 e 30 anos investiram R$ 123 bilhões e firmaram 782 mil contratos no mesmo período, afirma o banco público.
Desde 2009, início do programa, essa faixa etária fica pouco abaixo da metade dos financiamentos, com 48% do total, de acordo com números das mesmas instituições.
O levantamento consolida o interesse dos jovens pela casa própria, contrariando a tese de que não teriam interesse por patrimônios e bens materiais, e reafirma uma tendência já identificada pelo mercado imobiliário em geral.
Mesmo com uma remuneração mais baixa, o jovem pode comprar o imóvel na planta, novo ou usado pelo programa. A taxa de juros é limitada a 8,16% em áreas urbanas ou rurais. O comprador pode financiar o imóvel com ou sem valor de entrada e FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).
A analista de conteúdo Karen Moura, 28, é uma das jovens que financiaram a casa própria pelo Minha Casa, Minha Vida. Ela comprou um apartamento de 33 m² em agosto deste ano e aproveitou a expansão dos valores máximos de renda das faixas 1 e 2 do programa.
O primeiro teve o teto de renda ajustado de R$ 2.640 para R$ 2.850. Na faixa 2, o intervalo, de R$ 2.640,01 a R$ 4.400, passou a ser de R$ 2.850,01 a R$ 4.700,00.
O apartamento de Karen foi adquirido na planta, com financiamento a partir de um programa da construtora. O imóvel, localizado na zona oeste de São Paulo, deve ser entregue em 2027. “Achava que não daria certo, eu tinha um valor de entrada baixo”, diz.
Ela, contudo, conseguiu dar um sinal inicial e parcelou o restante da entrada. O financiamento em si começa quando receber as chaves do apartamento. “Não vim de uma família com dinheiro. Se terminar de pagar em 30 anos, vai compensar por ser algo meu”, afirma.
O lançamento do novo MCMV ajudou os jovens a entrarem no programa, diz a vice-presidente de Habitação da Caixa e ex-secretária nacional de Habitação, Inês Magalhães. “As alterações vão ao encontro do financiamento para as menores rendas, inclusive o valor de entrada”.
Alberto Ajzental, coordenador do curso de Negócios Imobiliários da FGV (Fundação Getúlio Vargas) afirma que a renda e o desejo por sair da casa dos pais justificam a participação desse público.
“A classificação de compra do MCMV é por renda, não por idade, mas quem está no início da carreira, em média, ganha menos. Quando crescem e deixam de morar com a família, jovens buscam um imóvel para alugar ou comprar, seja ele novo ou usado. É criada uma demanda por este tipo de produto”, diz.
Para a diretora de incorporação da construtora Plano&Plano, Renée Silveira, algumas características marcam a geração Z (nascida a partir de meados dos anos 1990) no mercado imobiliário.
Segundo ela, os jovens priorizam a segurança da compra do imóvel porque gerações anteriores conviveram com a fragilidade do aluguel. Compartilhar espaços, como coworking e áreas comuns do condomínio, também é um fator importante.
Além disso, eles defendem a sustentabilidade. “Não que os jovens não queiram um carro, mas preferem usar bicicleta ou transportes públicos e serem sustentáveis”, afirma Silveira. O mesmo vale para o tamanho dos apartamentos “O pensamento deles é ‘eu preciso de um apartamento de três dormitórios? Não, preciso do básico'”, diz.
A corretora de imóveis Jéssica Fernanda da Silva, 24, fechou o contrato de um apartamento de 35 m² quando tinha 21 anos e também se enquadrava na faixa 2 do MCMV. A previsão de entrega é para outubro de 2024. “Se não tivesse comprado, teria gastado esse dinheiro. Já era um plano comprar uma casa. Meus pais também financiaram, queria isso para mim”, afirma.
Para Ajzental, o debate sobre as preferências da geração Z no mercado imobiliário não se aplica ao Brasil. “É uma discussão baseada na cultura e economia de países mais ricos”, diz.
Essa lógica do desapego é influenciada também pelo valor dos imóveis no país, um fator que afeta mais os jovens, afirma.
“Nos últimos anos, a renda não subiu na mesma proporção que o custo do imóvel. Está mais distante. À medida que fica mais difícil comprar, alugar se torna uma alternativa. Até que ponto a pessoa não está com o discurso de que ‘não quero comprar, prefiro alugar’, devido a falta dessa possibilidade?”
Para Gabriella Hansen, 22, o desejo por um imóvel veio quando saiu da casa da mãe. “Moro com o meu namorado. Decidimos comprar porque começamos a pagar aluguel e era algo sem retorno”, diz.
Para comprar o apartamento, eles se mudaram para um imóvel alugado menor e equilibraram as contas. Hoje, Hansen mora no imóvel financiado, que adquiriu em março de 2023. “Durante esse um ano e meio, conciliamos construtora, aluguel e evolução de obra. Sem aluguel para pagar, é um alívio”. Os valores dos imóveis das três variam entre R$ 205 mil e R$ 222 mil.
MATHEUS DOS SANTOS / Folhapress