SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Judiciário brasileiro tem apenas 15% de juízas e juízes negros em um universo de 13.272 magistrados. Em 36 dos 92 órgãos da Justiça que participaram do recadastramento feito pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), não há magistrados negros.
Os dados foram divulgados durante Seminário de Questões Raciais no Poder Judiciário, realizado pelo órgão nesta segunda-feira (4).
O estudo destaca que, ao longo dos anos, a metodologia das pesquisas sobre representação de negros no Judiciário mudaram. O Censo do Poder Judiciário, feito em 2013 e publicado em 2014, foi uma tentativa de contagem de toda a população que trabalhava neste Poder. Naquela ocasião, participaram do censo 64% dos magistrados e 60% dos servidores.
Em 2018, outra pesquisa que também buscou traçar perfil sociodemográfico na magistratura brasileira contou com a adesão de 63% dos juízes, desembargadores e ministros.
Já o Relatório Negros e Negras no Poder Judiciário de 2021 foi uma pesquisa realizada a partir dos registros administrativos dos tribunais.
Neste ano, o relatório traz uma metodologia diferente de coleta de dados.
A partir de iniciativa do Pacto Nacional do Judiciário pela Equidade Racial, com adesão de todos os tribunais, foi realizada uma campanha de recadastramento de juízes, servidores e estagiários. Os dados foram previamente enviados ao CNJ, e as informações coletadas pelo sistema Módulo de Produtividade Mensal.
Os TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) de Tocantins, Rio de Janeiro, Paraíba, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul e os tribunais da Justiça estadual do Amazonas e do Rio Grande do Sul não responderam ao levantamento.
Dentre as cortes que participaram do estudo, os ramos da Justiça com menor percentual de magistrados negros são a Militar (3%), as cortes superiores (11%) e a Justiça Federal (14%).
Embora a maior presença de magistrados negros tenha sido registrada na Justiça do Trabalho (16%) é nesse ramo que está o tribunal com menor percentual de juízes negros, o TRT-4, com 1,9%. O tribunal abrange os estados de Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Na Justiça estadual, o menor número está no TJ-MT (Tribunal de Justiça de Mato Grosso), com 2% de juízes negros. Na eleitoral, o percentual mais reduzido está no TRE de Mato Grosso do Sul, com 3%.
Apesar disso, a Justiça Eleitoral e Justiça Estadual aparecem como o segundo e terceiro ramos com maior representação de negros, com 16% e 14% de juízes, respectivamente.
O estudo do CNJ mostra ainda que alguns tribunais têm mais de 50% de magistrados negros, caso dos TJAC (Tribunal de Justiça do Acre), com 67%, e do Amapá, com 61%. Na Justiça do Trabalho, o maior percentual é verificado no TRT-20, de Sergipe, com 47%.
O levantamento também mostra como essa representação aparece em termos de cargos no Judiciário.
Enquanto brancos ocupam majoritariamente os postos de desembargadores, juízes substitutos de 2º grau e ministros ou conselheiros, com percentuais próximos a 90%, a maior representação de magistrados negros está entre juízes substitutos, com 17%, e juízes titulares, com 15%.
A juíza auxiliar da presidência do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e supervisora do programa de Equidade Racial, Karen Luise de Souza, afirma que os dados mostram que não houve avanço substancial apesar da política de cotas.
De acordo com o levantamento, apenas 3% de juízes negros ingressaram na magistratura por meio da ação afirmativa. Entretanto, o número pode ser maior, porque em 19% dos registros a informação estava indisponível.
Na abertura do seminário, a ministra Rosa Weber afirmou que a descriminação e a intolerância vitimam majoritariamente homens, mulheres e crianças em diferentes graus e dimensões de violência. Como exemplo, ela citou o assassinato a tiros no dia 17 de agosto da ialorixá e liderança quilombola baiana, Bernadete Pacífico.
“[Mãe Bernadete] que lutava com a sua voz corajosa contra esta odiosa impunidade é exemplo candente que o estado brasileiro falhou”, afirmou.
Ao final de seu discurso, a ministra afirmou que o Conselho Nacional de Justiça quer construir estratégias efetivas para buscar medidas de combate ao preconceito racial.
“Não se trata de questão, compromisso ou projeto de negros, brancos ou indígenas, cuida-se isto sim de quetão que diz com a nossa dignidade de seres humanos, uma questão de direitos humanos albergada na nossa lei fundamental. Nessa medida, trata de uma questão que afeta todos nós brasileiros e brasileiras, negros e brancos, negras e brancas”, concluiu.
GÉSSICA BRANDINO E PRISCILA CAMAZANO / Folhapress