Juiz vira alvo do CNJ ao negar pedido de advogada por adiamento

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O juiz Georgenor de Sousa Franco Filho, que disse que “gravidez não é doença” após uma advogada pedir adiamento de uma audiência para dar à luz, será investigado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

Segundo informações do conselho, foi determinada a instauração de uma reclamação disciplinar contra o magistrado, que é presidente da 4ª Turma do TRT-8 (Tribunal Regional do Trabalho que atende os estados do Pará e Amapá).

O pedido da advogada foi feito antes do nascimento do bebê, ocorrido no último dia 6. O caso será analisado pelo plenário do conselho após denúncia de que, em sessão de julgamento desta terça-feira (10), o magistrado teria adotado posturas que, em tese, podem configurar violação de deveres funcionais da classe.

“Gravidez não é doença. Ela não é parte do processo, é apenas advogada do processo. Mandasse outro substituto. São mais de 10 mil advogados em Belém”, disse Franco Filho.

Segundo o CNJ, em outro momento, o magistrado voltou a agir de maneira imperativa, interrompendo a fala de uma colega magistrada e impedindo que ela se manifestasse.

“Desembargadora Alda também calada está, calada permanecerá. Não podemos falar, não fazemos parte do quórum. Calemo-nos”, afirmou.

Ao tomar ciência do caso, o corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, apontou em sua decisão que a postura do desembargador pode ter violado o dever de urbanidade para com os colegas e partes.

Também afirmou que é preciso analisar o possível não cumprimento de direitos processuais próprios das advogadas em período de parto.

A decisão ainda indica assimetria no tratamento das partes envolvidas, o que configuraria a não adoção da resolução do CNJ que considera a perspectiva de gênero nos julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário.

“É preciso, durante todo o processo judicial, questionar se as assimetrias de gênero estão, de qualquer forma, presentes no conflito apresentado, com especial atenção ao tratamento das partes envolvidas, como advogadas, promotoras, testemunhas e outros atores relevantes”, disse.

O corregedor ressalta que o magistrado comprometido com o julgamento com perspectiva de gênero “deve estar sempre atento às desigualdades estruturais que afetam a participação dos sujeitos em um processo judicial”.

Os conselheiros Marcello Terto, Marcos Vinícius Jardim, Luiz Fernando Bandeira de Mello e João Paulo Santos Schoucair, do CNJ, também protocolaram uma representação formal à Corregedoria Nacional de Justiça, solicitando abertura de reclamação disciplinar, por entenderem possível infringência a deveres funcionais por parte do juiz.

Eles argumentaram que “para além das preocupantes manifestações externadas, que, ao desprezar o contexto puerperal vivenciado pela causídica, denotam discriminação de gênero no âmbito da condução de audiência em unidade do Poder Judiciário, com clara violação das prerrogativas da advogada”.

Com a abertura do procedimento pela corregedoria do CNJ, o presidente da 4ª Turma do TRT-8 tem 15 dias para apresentar defesa prévia.

A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Pará publicou um comunicado em seu site no qual “repudia veementemente a grave violação de prerrogativas em função de gênero” contra a advogada.

A entidade disse que a puérpera, cujo bebê encontra-se hospitalizado, requereu o adiamento do julgamento antes da realização da sessão. Ela também teria informado, em reunião presencial com a relatora do caso, que o parto estava previsto para o mesmo dia da sessão —tendo inclusive ocorrido de forma antecipada.

A relatora, segundo a OAB, deferia o pedido de adiamento quando o presidente da turma proferiu apontamentos problemáticos acerca do caso.

“A situação é de severa violação das prerrogativas da mulher advogada, previstas em lei federal e conforme Estatuto da Advocacia. E, ainda, o lamentável episódio evidencia a banalização da discriminação de gênero, inclusive no âmbito do sistema de Justiça”, disse.

Em nota com título de “pedido de desculpas” publicada no site do TRT, o juiz afirmou que foi surpreendido com a repercussão na imprensa e redes sociais sobre a sua intervenção no julgamento.

Ele disse que, revendo novamente a filmagem, verificou que a sua manifestação foi “profundamente indelicada e infeliz”.

“Gostaria de oferecer minhas mais sinceras desculpas não somente à dra. Suzane Odane Teixeira Guimarães, mas a todas as sras. advogadas que tenham se sentido ofendidas com minhas palavras”, afirmou.

“Até mesmo em respeito às mulheres de minha vida (minha falecida mãe, minha mulher, minha filha, minha nora e minha neta), lamento profunda e sinceramente pelo ocorrido e reitero meu respeito a todas as mulheres profissionais que não medem esforços a cumprir com a difícil missão de observarem suas jornadas múltiplas. Quem me conhece minimamente sabe que sou fervoroso e permanente defensor da mulher e seus direitos”, disse.

CONSTANÇA REZENDE / Folhapress

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