SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Investidores têm ampliado suas apostas em ações de empresas consideradas “boas pagadoras de dividendos” em um dos movimentos de mercado que refletem a alta de juros no Brasil.
Quem não quer ir totalmente para a renda fixa tende a buscar ações de empresas mais consolidadas e de setores mais seguros. Prova disso é a performance do IDIV, o índice de dividendos da B3, que sobe mais de 7% no ano, enquanto o Ibovespa acumula alta de 1,82%. Mas, para especialistas, é necessário cuidado.
Esse movimento é conhecido no mercado como “fly to quality”. “É uma busca por ativos mais previsíveis e seguros em termos de resultado e carrego, que são características que as empresas de dividendos costumam entregar. Elas têm suas operações mais maduras e, em alguns casos, os seus negócios são mais ‘blindados'”, afirma o analista Bernardo Viero, especialista em dividendos da Suno Research.
Companhias boas pagadoras de dividendos usualmente distribuem dinheiro aos acionistas pelo fato de não estarem em expansão. O lucro entra no caixa e, pela falta de “um lugar onde gastar”, posteriormente vira provento. Essas empresas têm menor “custo de carrego”, como falado pelo especialista, já que não tomam tanto risco (com ações menos voláteis) e pela maior retribuição ao acionista.
O mesmo não acontece com empresas que estão buscando crescer, que tendem a reinvestir a maior parte dos seus ganhos. Não raro, elas também sofrem com uma menor geração de caixa em um momento como o de alta dos juros por serem mais endividadas (já que costumam tomar mais crédito para bancar a expansão).
Fora isso, como mencionado por Viero, as boas pagadoras de dividendos também costumam estar em setores mais estáveis. “São setores resilientes. Com crise ou sem crise as pessoas continuarão usando água, acendendo a luz e utilizando os bancos”, acrescenta Carol Stange, planejadora e educadora financeira.
Entre as 20 maiores pagadoras de dividendos em 2024, ao se levar em conta o dividend yield (valor dos dividendos sobre o preço da ação), boa parte dos nomes está nos setores financeiro ou de utilidades, com 11 representantes. As companhias de commodities também são destaque, com sete nomes.
A Petrobras, com duas diferentes ações, ocupa as primeiras posições, seguida por Cemig e a Auren, ambas do setor de energia.
CUIDADOS AO INVESTIR PENSANDO EM DIVIDENDOS
Mas quem está interessado em começar a aportar de olho nos proventos deve tomar alguns cuidados. Especialistas apontam que um dos erros mais comuns cometidos por novos investidores em dividendos está, justamente, em olhar para o passado na procura de dividends yields altos.
“Escolher uma empresa por causa do dividend yield é a pior coisa que um investidor pode fazer. Nem sempre o rendimento que a empresa teve no passado é sustentável”, diz Stange. “Às vezes uma empresa paga um dividendo alto em um determinado momento por um fato isolado, pontual. Venda de ativo ou de patrimônio, por exemplo. Passado esse período, ele volta ao patamar ‘normal.'”
Ruy Hungria, analista responsável pela carteira de dividendos da Empiricus, menciona por exemplo o caso da Vivo. A companhia, no passado, já foi conhecida por ser uma boa pagadora de dividendos, mas nos últimos anos se alavancou para adquirir parte da Oi e para investir em fibra óptica –e agora tem proventos mais enxutos.
“Algumas vezes uma empresa que historicamente paga dividendos atrai um monte de gente que não tem a menor ideia se ela realmente vai conseguir continuar pagando. São pessoas que só olham para o passado, sem fazer análises profundas. Quando de repente percebem que os proventos não irão sair, vendem as ações e geram quedas fortes”, diz o especialista.
Felipe Pontes, diretor de gestão de patrimônio da Avantgarde e escritor do livro “O Investidor de Ações de Dividendos”, explica que é preciso monitorar, mais do que o setor, o momento no qual a empresa se encontra. “É preciso ainda avaliar como a empresa está performando. Uma pegadinha normal para os novos investidores é que algumas ações ficam com yields elevados porque o preço do papel, que é o divisor no cálculo, caiu”, acrescenta.
Einar Rivero, CEO da Ayta Consultoria, por fim, aponta que comprar ações em dividendos nem sempre é o suficiente para ver o seu patrimônio crescer.
“Se você ganha dividendos, gasta e a ação cai, na verdade você está destruindo capital. O provento, vale lembrar, sai do preço da ação”, menciona, afirmando que a distribuição de caixa é descontada do preço do papel. “Dividendos são algo bom? Sim, mas é necessário também ter estratégias.”
VITOR AZEVEDO / Folhapress