SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma desembargadora do Tribunal de Justiça paulista encontrou indícios de excesso em uma abordagem policial e mandou soltar um homem que havia sido algemado, amarrado e agredido por policiais militares após furtar três barras de chocolate em um mercado no Tatuapé, na zona leste de São Paulo.
Os policiais disseram que foram xingados e que foi necessário o uso progressivo de força para contê-lo. Um PM sofreu uma lesão em um dos dedos durante a prisão e precisou de atendimento médico.
O homem que havia sido detido no dia 19 de julho e cumpria prisão preventiva no CDP (Centro de Detenção Provisória) Pinheiros II, na zona oeste da capital, foi solto na manhã desta quarta-feira (30).
A desembargadora Jucimara Esther de Lima Bueno tomou como base as imagens registradas pelas câmeras corporais presas aos uniformes dos PMs e acatou o pedido de liberdade feito pela defensora pública Cristina Emy Yokaichiya, do Dipo (Departamento de Inquéritos Policiais).
“A despeito da gravidade dos crimes supostamente cometidos, da reincidência do paciente, do fato de ele estar em cumprimento de pena, em regime aberto pela prática de crime de roubo, inviável a manutenção do cárcere. Nenhum delito, por mais grave que seja, justifica a prática de outro, em especial pelos agentes investidos pelo Estado para preservarem a ordem pública”, afirmou a magistrada.
Conforme a desembargadora, as imagens das câmeras corporais mostram que o homem já estava algemado, na viatura, quando foi retirado, amarrado e agredido.
Bueno declarou ter visto um dos PMs posicionar o joelho sobre o rosto do homem.
“Um dos policiais militares amarra os pés do paciente com uma corda e a outra ponta é amarrada nas algemas. A calça do paciente abaixa e ele fica com as nádegas expostas. Chegam outros policiais militares ao local, o paciente tenta falar que seu rosto está machucado, mas os policiais dizem: ‘cala a boca, cala a boca, você vai para o hospital’. Dois dos policiais militares presentes suspendem o paciente pela blusa e o jogam no porta-malas da viatura policial e dizem ‘você não é malandrão, agora você vai se fuder’, descreveu a Bueno em seu despacho.
De acordo com documento da Defensoria Pública, o homem relatou durante audiência de custódia no dia 20 de julho ter sido agredido. Fotos do dia mostram o preso com ferimentos no rosto e um hematoma em um dos olhos.
Na audiência, o homem negou ter resistido à prisão e relatou que os policiais o agrediram com socos na cabeça e nas costelas. Ele também apontou para partes do corpo em que disse ter recebido chutes. O homem ainda explicou para a magistrada que os PMs amarraram suas mãos e pernas juntas, em uma espécie de pau de arara, conforme suas palavras.
Mesmo com todo relato, a juíza da audiência de custódia, que não teve acesso às filmagens, decidiu manter o homem preso, por não verificar irregulares na ação dos policiais.
“Muito importante a decisão da desembargadora. É essencial reconhecer que policiais não podem sair agredindo e machucando as pessoas de forma gratuita. Uma coisa é conter o crime, outra é bater, humilhar, tratar como bicho. Todos sabem que tortura e maus-tratos são intoleráveis, ainda mais por agentes do estado. A Justiça não pode fechar os olhos para essa situação, e a decisão demonstra de forma categórica que, quando há violência, há irregularidade”, afirmou a defensora Cristina Emy Yokaichiy à reportagem.
SÉRIE DE FURTOS E ROUBOS
Segundo o processo, o homem realizou uma série de furtos e roubos no dia 19 de julho.
O primeiro caso ocorreu por volta das 5h30 daquele dia, no estacionamento de um mercado na rua Cantagalo. Após simular estar armado, ele roubou de dentro do carro de uma mulher uma mochila, uma toalha de mão, duas camisetas, um cartão e um boné.
No mesmo mercado, mas às 12h30, ele furtou três barras de chocolate, avaliadas em R$ 30,87.
Chamados, os policiais o encontraram nas proximidades do ponto do furto com os produtos tomados do mercado. Foi nesse momento que ele teria resistido e xingado os policiais, machucando um deles.
PAULO EDUARDO DIAS / Folhapress