BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro Kassio Nunes Marques, do STF (Supremo Tribunal Federal), reverteu a condenação imposta ao deputado federal Marco Feliciano (PL-SP) por transfobia contra uma atriz que simulou de uma crucificação durante a Parada Gay de São Paulo de 2015.
Ele considerou que Feliciano não extrapolou a liberdade de expressão. Em 2015, a atriz transexual Viviany Beleboni protagonizou a simulação, no papel de Cristo. A manifestação gerou diversas reações, entre as quais a do deputado.
O congressista havia sido condenado pela Justiça de São Paulo ao pagamento de R$ 100 mil em indenização por danos morais no âmbito de uma ação civil pública ajuizada pela ABCDS (Associação Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual). A defesa de Feliciano entrou com uma reclamação no Supremo, e Nunes Marques atendeu o pedido.
“Por não identificar no caso ora em exame os excessos caracterizadores do discurso discriminatório, entendo que o reclamante não desbordou do exercício legítimo da liberdade de expressão, conforme definido na jurisprudência vinculante desta Corte”, afima a decisão.
Ao criticar a performance na ocasião, Feliciano escreveu que, ao ser contrário a esse tipo de ato, não exerce preconceito nem intolerância, somente a liberdade de expressão e religiosa.
Na decisão desta segunda-feira (16), o ministro afirma que negar às religiões cristãs o direito a manifestar juízos de valor com base em seus códigos morais seria o mesmo que retirar-lhes a essencialidade que as define.
Em outro trecho, ele afirma que a liberdade de expressão, como aponta a jurisprudência da corte, encontra limites no discurso de ódio contra grupos historicamente marginalizados. Mas, para o relator, o pluralismo da sociedade exige tolerância às diversas formas de viver e de pensar.
“Essa categoria extrema, entretanto, não pode ser confundida com a mera opinião desfavorável, que encontra guarida no espaço inviolável da consciência de cada indivíduo”, afirmou.
“Tolerância, contudo, não se confunde com concordância forçada, pois, numa democracia, reserva-se às diversas correntes de pensamento o direito de se contraporem umas às outras e de expressarem sua desaprovação a determinadas ideias e comportamentos”, disse.
Em 2019, o STF concluiu o julgamento que enquadrou a homofobia e a transfobia na lei dos crimes de racismo até que o Congresso Nacional aprove uma legislação sobre o tema. O ministro Celso de Mello, relator de uma das ações, disse que a decisão do Supremo desta quinta-feira “não interfere nem compromete a liberdade religiosa.”
A Justiça de São Paulo havia baseado a condenação no entendimento de que Feliciano havia extrapolado o direito à liberdade de expressão. “A conduta ilícita do réu não se baseia na sua liberdade de manifestação e pensamento, mas sim no fato de que, com ela, ao fazer associações com outras manifestações, fora do contexto, reforçando estereótipos, e fomentando a intolerância e discriminação, tudo sob apelo moral e religioso”, diz a sentença.
Na publicação, Feliciano associou o ato protagonizado pela atriz com outras manifestações políticas em que teria ocorrido profanação de símbolos cristãos, como “Marcha das Vadias” e “Marcha da Maconha”, como cita a decisão do magistrado. O deputado não teria circunscrito sua crítica a uma posição contrária, ainda que de conteúdo religioso” e teria gerado confusão ao postar fotos que não eram da Parada Gay, com exceção de imagens da atriz.
Kassio Nunes Marques, no entanto, entendeu que a decisão foi “lacônica” na fundamentação e não fornece elementos suficientes para categorizar a manifestação do deputado como abuso da liberdade de expressão.
ANA POMPEU / Folhapress