SANTOS, SP (FOLHAPRESS) – “Se der um terremoto, caem todos, não só o meu. Então, somos iguais.” Com bom humor, o aposentado Fernando Delgado Antunes brinca sobre o fato de morar em um dos 319 prédios tortos de Santos, no litoral paulista. O número foi atualizado em levantamento feito pela prefeitura a pedido do vereador Zequinha Teixeira (PP).
Dos 319 edifícios, 65 ficam na orla -e são os que apresentam maior desaprumo. Justamente o caso do Maembi, na avenida Bartolomeu de Gusmão, de onde Antunes aproveita a vista do 7° andar e diz não se incomodar com a inclinação.
“Já frequentava o apartamento porque era da minha sogra. A adaptação foi mais natural”, conta. “O pessoal vai lá visitar a Torre de Pisa na Itália da mesma forma que tiram fotos do nosso prédio. Em certo sentido também somos uma atração.”
Atração que, de acordo com o município, é monitorada de forma sistemática. “Todos esses prédios são acompanhados pela Secretaria de Infraestrutura e Edificações. Nenhum oferece risco para o momento”, diz a prefeitura, em nota. O levantamento, de junho, foi divulgado na última semana.
Há, ainda, o Programa dos Prédios Inclinados, que verifica desaprumos detectados em novas medições. As inclinações variam de 0,50 cm a 1,90 m.
A prefeitura não individualiza os prédios com anomalia mais evidente por se tratar de propriedade particular, mas afirma que engenheiros e arquitetos acompanham de perto a situação para apontar eventual necessidade de obras ou reparos. Quando é o caso, condomínios recebem intimação “para a execução dos serviços indicados”.
“Mais recentemente a secretaria vem convocando representantes de alguns edifícios para reuniões presenciais com engenheiros e autores dos laudos de análise estrutural”, diz a prefeitura. “O objetivo é conhecer as providências que os condomínios adotam para execução das obras de recuperação, nivelamento e controle de desaprumo.”
AFUNDAMENTO
O engenheiro civil Guilherme Menezes lembra que os prédios em questão foram construídos nas décadas de 1950 e 1960 e começaram a “afundar” a partir dos anos 1970. Uma união de fatores, diz ele, produziu o desnível, desde o uso de fundações mais rasas até as características geológicas do solo.
“A investigação técnica na época mostrou que o solo até 12 metros de profundidade se demonstrava compacto. O que não se sabia é que, mais abaixo, havia camada mole e outra arenosa”, diz Menezes. “Com o passar dos anos, ocorreu o evento que chamamos de recalque, gerando rebaixamento das fundações apenas de um dos lados”.
Alguns prédios, como o Nuncio Malzoni, já fizeram grandes fundos de reserva de condomínio e conseguiram corrigir da declividade com o uso de macacos hidráulicos, pilares e blocos. Motivo: mais do que eventuais transtornos de equilíbrio pessoal ou portas que se abrem sozinhas, o desaprumo afeta a valorização dos imóveis.
“Quase ninguém quer”, atesta o corretor de imóveis Nilton Carlos. “Já vendi apartamento em prédio um pouco inclinado. Era no 11º andar e dava tontura. Foi o único que negociei. A pessoa tem que gostar muito.”
“Comprei um no qual morei por um tempo. Colegas de trabalho falavam que eu era louco”, conta um empresário. “Mas o que eu tive, especificamente, já era todo reformado e estava alinhado por dentro. A gente não sentia nada de diferente. Só quem olha de fora vê o prédio torto.”
Moradores e proprietários podem consultar informações detalhadas sobre seus edifícios no Deconte (Departamento de Controle do Uso e Ocupação do Solo e Segurança de Edificações) de Santos, na rua 15 de Novembro, 195, 7° andar. O atendimento ocorre em dias úteis, das 9h às 17h.
Procurado, o Crea (Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia) não comentou a situação dos prédios tortos em Santos.
JOÃO PEDRO FEZA / Folhapress