BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Após o acordo costurado para o presidente Lula (PT) ceder dois ministérios ao PP e Republicanos, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse em entrevista à Folha de S.Paulo que as bancadas desses partidos na Casa agora fazem parte da base de apoio ao governo.
Lira ainda afirmou que a Caixa Econômica está nas negociações com o governo e reconheceu que as indicações políticas para as 12 vice-presidências do banco passarão por ele.
“Há uma aproximação de partidos de centro que não faziam parte da base do governo para essa adesão. É claro que, quando um partido indica um ministro que era líder de um partido na Câmara [caso de André Fufuca, do PP, que virou ministro do Esporte], a tendência natural é que esse partido passe a ser base de apoio ao governo na Câmara dos Deputados, como Republicanos, como outros partidos”, disse.
Lira afirmou que o PP na Câmara passou a integrar a base de Lula, apesar de o presidente do partido, o senador piauiense Ciro Nogueira, defender a oposição ao governo.
“Estamos tratando de base de apoio. Não estamos tratando de outros tipos de projetos [políticos], por enquanto. Não quer dizer que [isso] não possa avançar, mas por enquanto nós estamos falando de apoio político no Congresso.”
No entanto, Lira afirmou que não é possível garantir que todos os 49 deputados do PP votem conforme os interesses do Palácio do Planalto. “Não [é possível], porque nenhum partido dá todos os votos. Mas eu acredito em uma base tranquila”.
Com a entrada do PP e Republicanos no primeiro escalão governo, o presidente da Câmara acredita que a base de apoio ao petista na Casa fique entre 340 e 350 votos, suficiente para aprovação de PEC (proposta de emenda à Constituição).
“O acordo foi mais amplo, envolve outros partidos, envolve outras composições, tem parte do PL que quer fazer parte e já vota com o governo”, explicou ele.
Lira nega que as negociações que ocorreram nos últimos meses tenham caráter de fisiologismo.
“Eu sempre combati isso [presidencialismo de coalizão]. Mas essa é a maneira escolhida pelo governo que foi eleito democraticamente. O presidente Lula escolheu essa maneira de formar sua base, trazendo os partidos para ocupar espaço na Esplanada dos Ministérios”.
Ele afirmou que esse acordo político com PP e Republicanos tem o mesmo fundamento que o acerto do início do governo, que deu ministérios para PSD, União Brasil e MDB.
“Não há diferença entre PP, Republicanos, PSD, União Brasil, enfim, todos esses partidos que não fizeram parte da base de apoio da eleição do presidente Lula. [Alguns] aderiram num primeiro momento e outros aderiram agora, numa composição.”
Lira negou que haja ruídos por causa da demora na conclusão da reforma ministerial ou críticas de parlamentares à condução do processo pelo ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais).
“Eu não ouvi isso. Na realidade, não é o ministro Padilha quem dá o ok. Ele serve de interlocutor. O tempo é o tempo do governo. Aquela cadeira não é fácil.”
O presidente da Câmara deixou claro, porém, que ainda há parte do acordo a ser cumprido.
Lira afirmou que a Caixa terá indicações políticas e reconheceu que as nomeações passarão por ele. Mas a ideia é contemplar não só o PP, e sim mais partidos do centrão, grupo político ligado a Lira, como União Brasil, Republicanos e mesmo parte do PL.
“Ali as coisas têm que ser tratadas com muita transparência e vão ser tratadas com muita clareza. E vão ter, claro, indicações políticas que não serão criminalizadas por isso. A turma terá responsabilidade. A exoneração é o primeiro convite para quem não andar corretamente”, disse.
Outra parte do acordo que ainda falta ser efetivado é que o Republicanos ficará com os cargos da Funasa (Fundação Nacional de Saúde), que foi recriada por decisão do Congresso.
Lira disse que, a partir do próximo ano, o modelo de distribuição de emendas parlamentares terá que mudar, devolvendo ao Congresso um poder maior na gestão desses recursos e ampliando as emendas de bancada ou de comissão.
Depois que o STF (Supremo Tribunal Federal) acabou com as emendas de relator, que eram usadas como moeda de troca em negociações políticas na gestão Jair Bolsonaro (PL), houve um acordo entre Lula e a cúpula do Congresso para que parte do dinheiro das extintas emendas ficasse no caixa de ministérios. Mas com a promessa que atenderiam a pedidos de parlamentares.
Esse sistema não tem funcionado, na avaliação de parlamentares. Houve ajustes, de acordo com Lira, e as liberações começaram a ocorrer, mas ainda é necessário rever o modelo.
“Penso que nós temos que evoluir, seja com emendas de bancada obrigatórias, emendas de comissão obrigatórias, ou as individuais para que a política pública siga para o que ela se destina. Eu sempre defendi emenda parlamentar e continuarei defendendo, porque ninguém conhece mais o Brasil do que o parlamentar.”
Segundo Lira, está superado o episódio em que o ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse que a Câmara está com muito poder. Na entrevista, o presidente da Câmara não descartou a possibilidade de o plano de déficit zero, de Haddad, ser apoiado pelos deputados. “Se tomarmos as medidas, sim [é factível].”
Ele também afirmou que mantém uma boa relação com Padilha, apesar dos percalços da articulação política do governo.
Na reta final de sua gestão à frente da Câmara, o presidente quer dar prioridades para projetos de economia verde.
Além disso, ele pretende concluir a votação da PEC da Reforma Tributária assim que o texto sair do Senado. A previsão para isso, segundo ele, é outubro. Lira prevê ainda a aprovação do projeto de lei das offshores, após negociação com o governo que mudou alguns pontos, como a questão da variação cambial.
“O acordo que foi feito com o governo, depois da não votação da medida provisória e do reenvio da nova medida provisória de onshore com o novo projeto de offshore, é que haverá, a princípio, taxação cambial e variação cambial. Haverá uma tributação de 15% a 22%, a depender do tempo das aplicações dos fundos. Prazo de investimento mais curto, mais imposto, mais longo, menos imposto.”
O presidente da Câmara afirmou também que a medida provisória que permite ao governo federal tributar, a partir de 2024, o aumento de lucro gerado por incentivos fiscais de ICMS (imposto estadual) está enfrentando resistência e que conversará com Haddad a respeito do tema.
“Esse tá tendo muita grita. Quando está tendo muita grita, tanto aqui em Brasília quanto nos estados e nos setores produtivos, eles reclamam de que na realidade a medida provisória, ela veio além da decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça)”, diz.
“Criou-se uma nova legislação ali. E isso acaba com os créditos presumidos, alguns incentivos lá em cima, principalmente no Nordeste muito duramente.”
JULIA CHAIB, THIAGO RESENDE E CAMILA MATTOSO / Folhapress