Livro mostra como imperatriz Amélia popularizou o café depois do almoço e o rosa no Brasil

BELGRADO, SÉRVIA (FOLHAPRESS) – Revelar a história da segunda mulher de dom Pedro 1º, a imperatriz Amélia de Leuchtenberg (1812-1873) era obsessão antiga da pesquisadora independente Cláudia Thomé Witte.

Depois de 20 anos de trabalho, em que ela fuçou em quase 50 arquivos públicos e privados de dez países –Brasil, Portugal, Itália, Alemanha, Suécia, França, Áustria, Rússia, Inglaterra e Suíça–, chega às livrarias “D. Amélia: A História Não Contada — A neta de Napoleão que se tornou imperatriz do Brasil” (Ed. LeYa, 604 pág., R$ 95). A primeira sessão de lançamento está marcada para esta terça (22).

A obra apresenta facetas inéditas ou pouco conhecidas da personagem. Por exemplo, que foi ela a responsável por trazer ao Brasil o hábito do cafezinho curto após o almoço. E que sua chegada ao Rio fez acabarem os estoques de tecidos cor-de-rosa, pois todas as mulheres de alta classe queriam se vestir assim.

Além do prosaico, Thomé Witte também recompõe a relação de Amélia com os filhos de dom Pedro — tanto os dos primeiro casamento quanto os tidos com sua mais famosa amante, a Marquesa de Santos– e conta como a nobre fez fortuna depois da morte do imperador.

“Eu não considero que ela tenha sido uma mulher à frente do seu tempo. Ela foi uma mulher do seu tempo, muito ciente e ciosa de sua posição e desdobramentos que os posicionamentos dela podiam ter”, diz a autora.

“E dentro dessas limitações de uma mulher da realeza do século 19, Amélia conseguiu não só se manter independente financeiramente depois de viúva, como se tornou uma grande investidora. Ainda mandou construir um hospital na ilha da Madeira e acabou sendo responsável por todo um sistema de apoio aos órfãos em Portugal”, conta.

FAMA DE MULHERENGO

Neta de Napoleão Bonaparte, Amélia nasceu em Milão. Quando o avô foi obrigado a abdicar do poder, em 1814, seus pais se mudaram para Munique, onde ela foi criada. O parentesco ilustre passou a ser um obstáculo para que a família conseguisse transitar entre a nobreza europeia e, assim, galgar postos mais elevados.

Quando morreu a imperatriz Leopoldina, Amélia aceitou se casar com Pedro 1º, embora sua fama de mulherengo e a mudança para o outro lado do Atlântico não fossem nada atraentes. Era, contudo, o único caminho viável para que ela alcançasse o status régio.

“A fama de dom Pedro já tinha corrido o mundo. Quando ela foi consultada sobre o casamento, ponderou durante três dias. Deu uma resposta por escrito, em carta para a mãe”, relata a biógrafa.

No documento, Amélia demonstrava ciência sobre a vida agitada do futuro marido e, embora ressaltasse que não acreditava em tudo, concordava que seria um grande desafio o casamento. Mas ela impõe suas condições.

“Acho fascinante isso porque ela entendeu essa natureza das negociações dinásticas”, pontua Thomé Witte. “Sendo um compromisso de compra e venda, ela bota um preço. Eles precisavam de uma noiva jovem, católica e bonita que se dispusesse a atravessar o Atlântico, assumindo um viúvo com cinco filhos e péssima reputação.”

Em troca, ela pediu que fossem restituídos a seus familiares os títulos de nobreza perdidos com a queda de Napoleão. “Ela queria que sua família tivesse de volta o status perdido”, resume a biógrafa.

Em 16 de outubro de 1829, a jovem de 17 anos desembarcou no Rio.

ROSA

No dia seguinte, demonstrando seu propósito de se redimir do passado mulherengo, o imperador instituiu a Ordem da Rosa, um título honorífico em homenagem à esposa, cujo lema era Amor e Fidelidade.

“Essa condecoração foi distribuída em homenagem ao casamento e as pessoas enlouqueceram”, conta Thomé Witte. “Só que não tinha para todo mundo, era uma condecoração e os que ganhavam tinham de merecer.”

“O comércio do Rio começou a fazer réplicas, em tecidos”, diz a pesquisadora. “A cor entrou na moda e isso acabou esgotando os tecidos cor-de-rosa no Rio. Virou uma febre, um fenômeno.”

Uma outra curiosidade que o livro recupera é o hábito brasileiro de se tomar um cafezinho logo após o almoço. A bebida já era popular no país, mas costumava ser tomada em um copo grande no café da manhã. “Que era uma refeição reforçada, com carne e legumes”, diz a biógrafa. “Na Baviera [região onde a imperatriz foi criada, hoje parte da Alemanha], eles tinham o hábito de tomar uma xícara pequena de café forte depois do almoço, momento em que no Brasil e em Portugal se costumava tomar um licor, um vinho do porto.”

Ela manteve o seu hábito e as pessoas da corte passaram a imitá-la.

A biógrafa também recuperou cartas que demonstram como era a relação da segunda imperatriz com os enteados.

“Os mais novos tinham entre 7 e 4 anos, mal se lembravam da mãe Leopoldina”, acrescenta. “Amélia ouviu de sua mãe, quando embarcou ao Brasil, que deveria fazer com que as crianças nunca soubessem a diferença entre uma mãe e uma madrasta. E elas realmente a chamavam de mãe, como ela também as chamavam de filhos, com muito orgulho. Ela abraçou esse papel materno.”

Biógrafo da família imperial brasileira e curador da coleção “A História Não Contada” — que publica este livro –, o pesquisador e escritor Paulo Rezzutti considera essa, a parte mais surpreendente da obra de Thomé Witte. “Ela traz as revelações de como Pedro 2º sempre a tratou como mãe”, ressalta ele.

“Na lista de pessoas que dom Pedro 2º manda avisar assim que deu o golpe da maioridade [assumindo o trono brasileiro], a primeira pessoa que ele coloca é ‘minha mãe’, referindo-se à Amélia. Isso é muito carinhoso”, completa Rezzutti.

Mas a aventura tropical de Amélia duraria pouco. Em 10 de junho de 1831, Amélia acompanhou o marido no desembarque na Europa –ele havia abdicado do governo brasileiro em favor do filho e iria lutar pela recuperação do trono português.

Grávida, a nobre acabaria se estabelecendo em Paris naquela tormentosa temporada.

Somente em setembro de 1833, com o poder já encaminhado para as mãos de Pedro, é que Amélia e a filha se mudaram para Portugal

EDISON VEIGA / Folhapress

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