Luana Piovani critica PL Antiaborto, Bolsonaro e Lula e diz que não teme Neymar

CASCAIS, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – Se há três décadas Luana Pìovani chamou a atenção do público a partir da sensualidade de sua personagem na minissérie “Sex Appeal”, hoje, vivendo em Portugal e distante da televisão brasileira há 12 anos, ela é mais lembrada por se envolver em debates polêmicos, sobretudo os de cunho político e social.

Piovani não parou de atuar. Depois de fazer novelas e séries portuguesas, ela ensaia seu primeiro stand-up musical, “Cantos da Lua”, para uma curta temporada em Lisboa. No entanto, são as controvérsias em que a atriz se envolve o que mais chama a atenção.

Piovani, que também se considera ativista, vem fazendo publicações contra o PL Antiaborto por Estupro. Ao receber a reportagem, ela ainda debateu a ascensão da ultradireita na Europa e seu desprezo por Jair Bolsonaro e contou por que tampouco é simpática ao presidente Lula.

Ela contou ainda como sua vida em Portugal e o processo que move contra o ex-marido, o surfista Pedro Scooby, a fez chegar à conclusão de que o sistema judiciário português é pior que o do Brasil, algo distante da beleza da paisagem de Cascais, a cidade a 30 quilômetros de Lisboa que ela escolheu há cinco anos para viver e criar seus três filhos -Dom, de 12 anos, e os gêmeos Bem e Liz, de sete.

Piovani pediu para dar a entrevista num restaurante à beira-mar, onde ela gosta de estar. Esta, aliás, foi uma das brigas recentes que ela comprou contra outra celebridade, Neymar, a quem acusou de apoiar a chamada “PEC das Praias”, depois que o jogador anunciou uma parceria com uma incorporadora que deve criar 28 empreendimentos no litoral de Pernambuco e Alagoas.

Não há evidências, porém, de que o atleta tenha se manifestado a favor da privatização de praias nem de que a PEC autorize a privatização das praias. O texto, do senador Flávio Bolsonaro, do PL do Rio de Janeiro, prevê a transferência de terrenos de marinha em áreas urbanas da União para estados, municípios ou proprietários privados.

“Ah, gente, por favor”, ela diz, ao ser questionada. “Está óbvio. Ele estava celebrando um empreendimento imobiliário que precisa que essa PEC seja aprovada para dar certo. Para ele ter um pedaço gigantesco da praia só para ele.”

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PERGUNTA – Você equilibra a vida de atriz com uma presença forte na internet. Hoje você se vê mais como atriz ou influenciadora?

LUANA PIOVANI – Eu não me vejo como atriz. Eu sou atriz. O resto vem quase que por osmose. Sou uma influenciadora a partir do momento que tenho 5 milhões de seguidores. Eu e a torcida do Flamengo, né? Hoje o que mais tem é influenciador.

P – Estar envolvida em tantas polêmicas é um fardo?

LP – O que pesa não é a polêmica, mas a realidade da mulher. É isso que me destrói. O fato de eu estar na internet tendo que falar que sou a favor do aborto de uma criança estuprada.

P – O que você pensa sobre o PL Antiaborto por Estupro?

LP – Quem sabe do corpo da mulher é a mulher. É inacreditável e inadmissível que um homem queira decidir alguma coisa tão intrínseca e tão importante como gerar e parir um filho. Nessa situação [a de estupros], então, é impensável. Eu sou a favor do aborto como é aqui em Portugal. Você vai até o sistema de saúde, diz que está grávida, e [a depender do período gestacional] o Estado te ajuda a fazer o aborto.

P – Você sempre foi a favor do aborto?

LP – Sempre. Confesso que há uns 20 anos eu não estava pensando em aborto. Mas pensei na hora que comecei a entender as pautas, as brigas, as lutas, o lugar onde a mulher servia. E eu já passei por um aborto espontâneo, então sei como é.

P – Você falou sobre um limite de semanas que existe para o aborto ser feito de forma legal em Portugal. Para você, qual deveria ser esse limite?

LP – Acho que 15 semanas, mas eu não quero me pautar nisso. Isso é só um detalhe sobre outro processo que não interfere no que está sendo debatido no Brasil.

P – A atriz Cássia Kis, que já fez um aborto, agora defende o PL Antiaborto.

LP – Cara, não vou ficar dando opiniões aleatórias. Eu sei que deve ser muito tentador ter na frente uma pessoa como eu, que tem opinião e fala das coisas todas. Mas a gente não pode ficar aqui fazendo uma mercearia de opiniões.

P – Em março, você participou de uma roda de conversa com mulheres em Portugal.

LP – Esse é um projeto social que eu tenho, chamado Oráculo, que começamos no Brasil, e aí conseguimos ter um aqui. O judiciário de Portugal é uma máquina de moer mulher. Aqui, se uma mulher sofre violência doméstica, é ela quem sai de casa com a criança. O agressor fica.

P – A briga judicial que você trava aqui contra seu ex-marido, Pedro Scooby, está em que pé?

LP – Ele ganhou um processo que eu chamo de mordaça. Não posso tecer nenhum tipo de comentário sobre a paternidade dele na internet. Tive uma crise de ansiedade horrorosa na audiência. O problema é que, ao assinar o acordo, aceitei o judiciário português como meu, mas eu quero o judiciário brasileiro, que cuida melhor dos interesses das crianças.

P – Essas dificuldades não fazem você desanimar de ficar aqui?

LP – Não, porque a vida dos meus filhos é muito boa. Eu vim aqui por eles. Não vim à procura de ser protagonista de novela portuguesa nem para me aproximar do mercado europeu de cinema.

P – Como você avalia a força que ganhou o partido Chega, de ultradireita, em Portugal?

LP – Cara, não é só o Chega. É o Bolsonaro, é o Trump. Não afeta minha vida diretamente porque sou completamente privilegiada. Mas afeta a vida de irmãos meus. Se o mundo está querendo impedir dois homens de casar e ter filhos, eu estou infeliz, porque tenho amigos assim, posso ter sobrinhos e netos assim. Eu luto pelo todo.

P – Sempre pensou sobre política?

LP – Quando a gente é novo, não pensa muito em política. Mas quando você começa a entender que está pagando imposto, que dinheiro é aquele que estão te tomando, para que serve, quando você começa a se questionar como cidadão, aí você vai entrar mais na política.

P – Você se encaixa em algum lado do espectro político?

LP – Não, porque ainda não existe um nicho da política com compaixão pelo próximo. A esquerda é orgulhosa e a direita tem ambição demais. Ainda não se criou o nicho do meio, verdadeiramente.

P – Você chegou aqui em janeiro de 2019, então não viveu no Brasil sob o governo Bolsonaro.

LP – Com a graça de Deus, saí na hora certa. E eu não sou Lula, mas é que Bolsonaro não conta. É desumano. Acho que ele não poderia nem se candidatar. Uma pessoa que brinca com a vida das pessoas. Como é que ele finge que está morrendo na televisão? Isso está até hoje atravessado em mim.

P – Você vota nas eleições brasileiras?

LP – Voto, mas na última eu justifiquei. Já nem sei mais onde eu estava.

P – Mas teria votado em Lula, então?

LP – Teria, mas fiquei puta. É como se no Brasil só existissem os dois. E a gente tinha várias opções. O brasileiro é de foder.

P – Como você avalia o governo Lula até agora?

LP – Não está havendo melhora. A gente está tendo que lutar por coisas muito básicas. Só que pelo menos não tem um tirano rindo da cara das pessoas, andando de jet ski enquanto acontece a tragédia no Rio Grande do Sul.

P – O que te despertou a vontade de criticar o Neymar e a PEC das Praias?

LP – Eu já tinha feito isso. Num podcast em Londres, pouco famoso, eu desço a lenha nele. Mas se tem um negócio que não pode tirar do brasileiro é cerveja gelada, futebol e praia. Se mexe na praia, o bicho pega.

P – Inclusive para você, que mora em Portugal.

LP – Claro. Vai pegar na minha praia? Tá maluco? Eu frequento Fernando de Noronha há 30 anos e nunca fui nessas pousadas milionárias que têm uma jacuzzi para cada quarto. Por quê? Porque não tem água doce na ilha. Então sou a favor dos ilhéus.

P – Não te amedronta bater de frente com essas personalidades?

LP – Medo do quê? Ele poderia fazer o quê? Ele pode abrir um processo contra mim sobre injúria e difamação? Eu contrato um advogado. Não sou idiota nem leviana, gente, pelo amor de Deus. Não minto. Nunca menti. Tudo que eu falei está ali escrito, datado.

P – Mas ele não se pronunciou a favor da PEC. Ele fez uma propaganda de um investimento imobiliário.

LP – Que está esperando a PEC ser aprovada para poder ser concluído, né? Quero dizer, está engatado. O pessoal só está querendo arrumar uma cortina de fumaça para andar com a PEC. Tipo “Sasha, a filha de Xuxa, se separou”. Aí é que eles botam o negócio para votação.

P – O seu temor então é que essa propaganda que ele fez calhe na aprovação da PEC?

LP – Não é um temor. Está óbvio. Ele estava celebrando um empreendimento imobiliário que precisa que essa PEC seja aprovada para dar certo. Para que ele tenha um pedaço gigantesco de uma praia incrível e maravilhosa só para ele. Não! É esse o mundo que os milionários querem, mas a gente não vai deixar acontecer isso com o Nordeste.

P – Como vai ser seu novo espetáculo?

LP – Estreia no final de outubro. Chama-se “Cantos da Lua”. Eu que escrevi. São histórias da minha vida que eu costuro com algumas canções. Eu quero que seja um espetáculo meio off-Broadway, alternativo. Fico um mês em cartaz em Lisboa e depois viajo com ele pelo país até eu ter pauta no teatro de Portugal de novo, o que é dificílimo. Estou tentando um patrocínio. Mas, se for preciso, eu bancarei o projeto.

P – É difícil penetrar o cenário português?

LP – Um pouco. Eu tenho muitos privilégios. Cheguei com o tapete vermelho estendido, todo mundo me chamando para fazer novela. Os portugueses conhecem um pouco quem já trabalhou na Globo, porque vende-se muita novela. Mas o teatro é mais fechado.

P – Ser atriz aqui, em vez de no Brasil, melhorou a sua vida financeira?

LP – No Brasil, eu ganhava mais dinheiro, mas minha vida era muito tumultuada, exibida, falada. Aqui a gente ganha menos, mas tem uma vida bem mais em paz. Aqui o Estado te dá o básico. No Brasil, você paga imposto e ainda tem que arrumar dinheiro para pagar educação, segurança, saúde, e a gente vive numa agonia constante.

P – Você consegue ter uma vida de classe A aqui?

LP – Mas eu nem vim buscar uma vida de classe A aqui. Eu vim buscar uma vida mais comum, porque a vida de classe A no Brasil me incomodava. Vim porque quero que meus filhos usem transporte público, não motorista particular.

P – Por que esse desprezo pela ideia de seus filhos viverem como ricos?

LP – Abomino isso porque tive uma criação absolutamente comum e sei quão importante é. Eu vi muita gente sucumbindo ao sucesso. Não são esses os meus valores. Eu não acho que a gente veio para essa rápida passagem pelo planeta para adquirir tênis e exibir carro. Viemos para permear encontros, criar elos, conquistar memórias e fazer algo pelo todo. É isso que dá sentido para a vida.

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GUILHERME LUIS / Folhapress

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