SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A cantora Luedji Luna disse que fez seu novo disco, “Um Mar Pra Cada Um”, lançado nesta segunda-feira (26), para se resgatar. “Quis resgatar a Luedji de 2017, que estava feliz só por poder fazer música”, ela disse à imprensa na semana passada. “Nisso de trabalhar com o mercado, com tantas demandas, é fácil a gente ceder, escolher outros caminhos.”
Luedji se refere ao seu primeiro álbum, “Um Corpo no Mundo”, lançado há oito anos e que alçou a baiana à fama nacional com músicas como “Acalanto” e o hit “Banho de Folhas”. Agora, ela chega ao quarto disco de estúdio da carreira, depois dos dois volumes de “Bom Mesmo é Estar Debaixo D’água”, de 2020 e 2022.
“Acho legítimo também a gente querer ser famosa, ter reconhecimento e dinheiro, mas lembro que quando eu fiz o ‘Corpo no Mundo’, não foi sobre isso”, disse. “Fiz tudo o que quis em ‘Um Mar Pra Cada’. Não sei se se conversa com o mercado atual, se vai ter um hit, se vai dar certo, se vão gostar e sentir, se é sobre o povo, se é sobre Grammy…”
A nova obra, diz Luedji, encerra uma trilogia de investigação do desejo que usa a água e o mar como metáfora recorrente. “Fui o mais profundo que eu podia dentro desse tema”, ela afirma. “É tão pessoal quanto o [segundo] ‘Bom Mesmo é Estar Debaixo D’água’, só que vai além da superfície. Estou me desnudando, dizendo que já tenho tudo -marido, filho e essa experiência de amor que poucas mulheres negras têm-, mas por que não é suficiente?”
“Um Mar Pra Cada Um” registra essa busca e traz respostas para esses questionamentos -que, ela diz, vêm de traumas de infância e vão além do amor romântico. A música “Harem”, na qual Liniker participa cantando, por exemplo, leva o assunto do álbum à dimensão das amizades. Ela é precedida por “4hz”, faixa que traz um áudio que Luedji enviou a uma amiga que vivia uma relação com “pouco amor e pouca dignidade”.
A resposta às perguntas levantadas por Luedji também estão no novo disco, influenciado no tema e na sonoridade -permeada de arranjos e solos de sopros- em “A Love Supreme”, clássico do jazz de John Coltrane. “Encontro esse amor em Deus, em mim mesma -no Deus que habita em mim”, diz a cantora.
Além das influências de neosoul, R&B e rap, a artista traz para o jazz para o universo música popular, algo que ela já vinha fazendo nos últimos discos e agora deixa ainda mais evidente. A saxofonista britânica Nubya Garcia toca na faixa “Dentro Ali” e a música que abre o disco, “Gênesis” é um jazz instrumental tocado por músicos da Bahia -Bira Marques no piano, Bruno Mangabeira no sax, Nei Sacramento na bateria e Angelo Santiago no contrabaixo.
“É muito no sentido de tirar esse estigma do jazz de ser um gênero burguês, afastado das massas e da pretitude, mesmo sendo tão preto”, ela afirma. “A gente acaba fazendo essa associação porque criamos estereótipos do que é preto. No Brasil é pagode ou samba, nos Estados Unidos é trap ou rap. Sempre quis trazer o jazz para perto. A gente [tem que] se reapropriar do jazz. Não é algo burguês e elitista em nada. E a gente pode se apropriar dele.”
O jazz, diz Luedji, é um estilo que está presente na sua vida desde a infância, já que os pais tinham o costume de ouvir músicas do gênero ou de artistas brasileiros influenciados por ele, como Milton Nascimento e Luiz Melodia. Este último, inclusive, surge na faixa “Joia” através de citações na letra e de um sample da música “Pérola Negra”.
A cantora também levou seu canto a lugares que não tinha ido ainda. “O canto brasileiro é um canto de saudade -remete ao mar e toda essa história que temos com ele, dos portugueses e negros escravizados que vieram. Então é muito melancólico e sereno”, ela diz. “Quando vamos para o jazz, neosoul e R&B, nos Estados Unidos, uma outra diáspora, chegamos às negronas. É o soul, um canto mais doloroso, quase um grito.”
Segundo Luedji , essas referências musicais pediram um outro tipo de voz. “Como usei essas referências, quis me desafiar nesse lugar -alcançar notas que geralmente não vou, usar técnicas como melismas, vibratos e falsetes que são típicas de lá. Não cabia cantar bossa, e nem como fiz em ‘Corpo no Mundo’. Demandou estudo, foi um desafio. Mas estou me arriscando no disco todo e resolvi me arriscar também no canto.”
No processo de cura que “Um Mar Pra Cada Um” apresenta, Luedji usou propositalmente frequências de sound healing -um tipo de terapia que usa vibrações sonoras para restaurar a harmonia do corpo e mente. Fez isso após se interessar por experimentos que estudam como as moléculas da água se expressavam em contato com determinadas músicas ou sons.
A cantora também recriou com inteligência artificial a voz da historiadora e intelectual negra Beatriz Nascimento, que foi assassinada aos 52 anos, ao tentar defender uma amiga de um namorado agressor. A voz recriada declama um poema de sua autoria na última faixa do disco, “Baby te Amo”. “Usei uma poesia póstuma da Beatriz que ela nunca publicou e nunca recitou”, diz.
UM MAR PRA CADA UM
Quando Lançado nesta segunda-feira (26)
Onde Nas plataformas digitais
Autoria Luedji Luna
Gravadora Independente
LUCAS BRÊDA / Folhapress

