Lula, Bolsonaro e Tarcísio como padrinhos e futuro de Marçal ligam 2024 ao xadrez de 2026

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “São Paulo parece que virou eleições presidenciais”, observou Jair Bolsonaro (PL), na sexta (4), antevéspera do primeiro turno. “Ninguém dava muita bola […] e, de repente, quem está envolvido na eleição de São Paulo ou é do bem ou é do mal.”

O tom nacional da disputa pela prefeitura já estava posto em janeiro, quando Lula (PT) disse que “a eleição em São Paulo será entre eu e a figura”, referindo-se justamente a Bolsonaro.

Nem precisava explicitar que, no tabuleiro que reúne o presidente atual e o ex, além de dois aspirantes ao Planalto, Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Pablo Marçal (PRTB), se misturam os jogos de 2024 e de 2026.

Em campanha atípica, permeada por ataques verbais e físicos e em que as pesquisas variaram de líder a cada rodada, mas sempre num cenário apertado de indefinição, não é possível saber quem vai largar à frente neste domingo (6) na corrida para, não só o Edifício Matarazzo, mas também para o Palácio do Planalto.

Mesmo com a nacionalização, Lula e Bolsonaro estiveram mais ausentes do que seus representantes, Guilherme Boulos (PSOL) e Ricardo Nunes (MDB), gostariam. Deixaram como marcas sobretudo a escalação dos vices, Marta Suplicy (PT) e Ricardo Mello Araújo (PL).

Tarcísio, ao contrário, se jogou na disputa, formando dupla com o prefeito. Marçal correu por fora. Representando a si mesmo, o influenciador roubou a cena com seus factoides e ditou a pauta da eleição na capital paulista.

O Datafolha deste sábado (5) mostra um empate triplo na margem de erro —Boulos tem 29% dos votos válidos, Marçal e Nunes têm 26% cada.

Para Lula e Boulos, a nacionalização do pleito paulistano não é apenas decorrência da importância da metrópole, mas o caminho que poderia levar a esquerda de volta ao posto perdido em 2016. O plano era repetir a vitória que o lulismo teve sobre o bolsonarismo na capital em 2022.

A reconstituição da polarização nos níveis esperados contudo, não se concretizou. Faltou Lula, Bolsonaro não se engajou, Nunes buscou não priorizar o embate ideológico e, sobretudo, surgiu um terceiro elemento competitivo, Pablo Marçal.

Boulos adaptou a estratégia e passou a ligar tanto Nunes quanto Marçal ao bolsonarismo na expectativa de criar a ponte entre a eleição de 2022 e a de 2026.

Em 2022, atendeu a Lula e desistiu de disputar o governo paulista, tornando-se, em troca, o candidato a prefeito defendido pelo PT nesta eleição.

Para 2026, depende do resultado deste domingo. Se vencedor, pode fazer da capital a mola propulsora da reeleição do petista. Se perdedor, terá o padrinho como sócio do fracasso e deixará exposto seu encolhimento no principal colégio eleitoral do país.

Não à toa, Lula disse a Boulos, em live na quinta (3), estar torcendo por ele como se fosse sua própria candidatura.

Na campanha, Lula teve apenas três atos públicos com Boulos, um deles na véspera da votação. Aliados lembram que a agenda presidencial é a prioridade do petista e que nem sempre é possível conciliá-la com outras atividades.

As dificuldades de penetração de Boulos no eleitorado de menor renda foram atribuídas em parte à baixa presença de Lula, embora sua imagem tenha sido explorada no horário eleitoral e nas redes sociais.

Na direita, há mais complexidades e disputas paralelas. Bolsonaro deixou claro que não concorre com seu “candidato dos sonhos” e chegou a receber Marçal e lhe fazer elogios —foi Tarcísio quem mais atuou para que seu padrinho não tomasse outro rumo.

Mas o apoio protocolar do ex-presidente ao prefeito não impediu que Marçal arrebatasse o eleitorado bolsonarista que vê no influenciador, e não no emedebista Nunes, um líder conservador e antissistema.

Inelegível para 2026, Bolsonaro arranjou obstáculos futuros de outra ordem a partir da campanha paulistana, como ter a hegemonia na direita posta à prova nas urnas e assistir à emancipação daquele que chegou ao Palácio dos Bandeirantes graças a sua bênção.

Por enquanto, Tarcísio rejeita concorrer ao Planalto e diz preferir a reeleição. Em qualquer caso, seu capital político depende também da reeleição de Nunes.

Aconselhado por Bolsonaro a não se amarrar ao prefeito para evitar prejudicar sua imagem, Tarcísio fez o oposto —não largou Nunes nas agendas, na propaganda na TV e nas redes sociais.

Ao traçar um caminho independente e buscar, inclusive, influenciar as decisões do padrinho, o governador toma para si o bônus, mas também o ônus, que recairia sobre o ex-presidente a partir da apuração dos votos.

Marçal, por sua vez, não esconde a pretensão de chegar à Presidência. Seu crescimento na direita, mesmo após críticas do ex-presidente e de seus filhos ao autodenominado ex-coach, acendeu o alerta a respeito do potencial do influenciador como liderança do campo.

Instado a entrar na campanha por Tarcísio, Bolsonaro subiu o tom contra Marçal na sua live de sexta, quando afirmou que ele é “idiota” e divide a direita. O pronunciamento, em que ressaltou o papel da eleição de São Paulo para definir os rumos nacionais, antecipou o embate entre as figuras.

“Se alguém acha que vai rachar a direita dessa forma, está errado. Primeiro, quem uniu a direita foi você que está falando? Você, seu idiota, o que você fez pela direita para estar cantando de galo aí? Gente que nunca foi vereador, nas minhas costas teve centenas de milhares de votos. Cresça e apareça, pô”, disse Bolsonaro ao influenciador.

Além da projeção para 2026, Marçal também colheu na eleição paulistana possíveis complicações para a carreira política. Na mira da Justiça Eleitoral por abuso de poder econômico e por causa de um laudo falso divulgado contra Boulos, o influenciador pode ficar inelegível se condenado.

Por não ter se forjado no seio do bolsonarismo, Marçal não tem amarras com Bolsonaro e pode até decidir enfrentar um candidato indicado por ele em 2026 —como Tarcísio.

A campanha para a prefeitura propiciou o primeiro confronto entre eles. Em propaganda de Nunes na TV, Tarcísio declarou que Marçal era “a porta de entrada para Boulos”.

A frase irritou o influenciador, que disse que o governador enterrava a carreira ao citar seu nome. Marçal apelidou Tarcísio de “goiabinha” e atiçou seus seguidores, que inundaram as redes do mandatário.

Quando ataca o governador, Marçal tenta atingi-lo não apenas como cabo eleitoral de Nunes, mas como liderança da direita cotada para a disputa presidencial.

Em sabatina Folha/UOL, em setembro, o influenciador afirmou que será candidato ao Planalto se Lula morrer até 2026 e Bolsonaro estiver inelegível. Indo além, tentou minar o capital político do governador: “Nem Tarcísio vai dar conta, porque apoiou o cara errado, Bolsonaro vai estar inelegível, e eu quero servir ao Brasil”.

O próprio Bolsonaro, porém, não se considera fora do páreo e, apesar de não ter ido a São Paulo fazer campanha para Nunes, viajou por todas as regiões do país para endossar candidatos a prefeito e manter sua base mobilizada para 2026.

Do palanque municipal, o principal cabo eleitoral do PL aproveita para atacar o ministro do STF Alexandre de Moraes, enquanto afirma lutar pela liberdade. A manifestação do 7 de Setembro, na avenida Paulista, foi uma demonstração da força que conserva.

A estratégia é diferente da adotada em 2020, quando Bolsonaro anunciou os apoios, na maior parte, em suas lives eleitorais. Naquelas eleições, o então presidente declarou adesão abertamente a 18 candidatos a prefeito. Apenas cinco se elegeram.

CAROLINA LINHARES, ANA LUIZA ALBUQUERQUE E JOELMIR TAVARES / Folhapress

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