SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta segunda-feira (11) que não sabia da existência do Tribunal Penal Internacional (TPI). A declaração foi dada em uma entrevista coletiva após a cúpula do G20, em Nova Déli, na Índia.
“Eu nem sabia da existência desse tribunal”, disse o petista, acrescentando que pretendia investigar a razão pela qual o Brasil era signatário do Estatuto de Roma, tratado fundador da corte, enquanto grandes potências como Estados Unidos e China não eram. “Me parece que os países do Conselho de Segurança da ONU não são signatários, só os ‘bagrinhos'”, completou.
Na verdade, dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, EUA, Rússia e China não aderiram ao TPI. França e Reino Unido, porém, são signatários do Estatuto de Roma e membros da corte. No total, a instituição reúne 123 países.
A corte, que tem sede em Haia, na Holanda, e foi criada em 1998, é responsável por investigar e julgar pessoas acusadas de infrações como crimes de guerra e crimes contra a humanidade, além de contra outros países. O Brasil assinou o documento em 2000, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, e o incorporou à legislação brasileira em 2002, mesmo ano em que o TPI passou a funcionar de fato antes, portanto, de o petista assumir seu primeiro mandato na Presidência, em 2003.
Há, porém, uma série de evidências de que Lula tem, sim, conhecimento da existência do tribunal. Em fevereiro de 2003, ele se envolveu na indicação da primeira juíza brasileira a participar da corte, Sylvia Steiner. Além disso, conforme mostrou o Painel, ele e outras lideranças petistas manifestaram-se favoravelmente ao TPI nos últimos anos, defendendo que o órgão julgasse Jair Bolsonaro (PL) por crimes contra a humanidade relacionados à pandemia de Covid-19.
Em abril, por exemplo, durante visita à Espanha, o presidente disse que “um dia [Bolsonaro] será julgado em tribunal internacional pela atuação na pandemia”. Embora não tenha mencionado o TPI pelo nome, essa é a única corte internacional em que uma pessoa física pode ser julgada por crimes contra a humanidade.
A adesão do Brasil ao Estatuto de Roma voltou a ser tema de debate depois de um comentário de Lula a uma emissora indiana no sábado (9). Na ocasião, ele afirmou que o presidente da Rússia, Vladimir Putin, poderia vir ao Rio de Janeiro para participar da cúpula do G20 no ano que vem sem correr risco de ser preso. “Se eu for presidente do Brasil, e se ele [Putin] vier para o Brasil, não tem como ele ser preso”, disse.
A questão é que o russo é desde março alvo de um mandado de prisão do TPI por supostos crimes de guerra na Ucrânia. E o Brasil, como signatário do documento fundador do tribunal, em tese deveria se comprometer a cumprir suas ordens neste caso, prender Putin, que sempre negou as acusações.
Lula já tinha recuado da promessa no início do encontro com jornalistas desta segunda, afirmando que a decisão sobre uma eventual prisão de seu homólogo caberia à Justiça e não ao governo ou ao Congresso Nacional. “Espero que [até lá já] tenha acabado a guerra, espero que o tribunal tenha refeito sua posição, para que a gente possa voltar à normalidade”, afirmou.
O mandado do TPI, que acusa o presidente russo de não agir para impedir a deportação ilegal de crianças ucranianas de territórios ocupados por seu Exército, já o impediu de comparecer a pelo menos um evento internacional de peso este ano a cúpula do Brics, ocorrida no mês passado em Joanesburgo.
A África do Sul, que também é signatária do Estatuto de Roma, até desenhou uma estratégia para permitir a entrada do russo no país, afirmando que concederia imunidade a todos os líderes do Brics. Mas a pressão, inclusive interna, sobre o governo de Cyril Ramaphosa acabou fazendo com que ele e o Kremlin acordassem que a participação de Putin nos encontros fosse apenas virtual. A representação oficial do país coube, assim, ao chanceler Serguei Lavrov, que também substituiu seu chefe na cúpula do G20 deste fim de semana.
Redação / Folhapress