BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente Lula (PT) vetou parcialmente o projeto que acaba com as saídas temporárias de presos, que tinha sido aprovado pelo Congresso. Com isso, ele manteve as saidinhas para que os detentos possam visitar familiares em datas comemorativas.
O anúncio foi feito pelo ministro Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) durante pronunciamento no Palácio do Planalto. Ele estava acompanhado do ministro Jorge Messias (Advocacia-Geral da União)
O texto deverá ser publicado no Diário Oficial da União desta sexta-feira (12). O Congresso Nacional pode derrubar o veto presidencial, podendo reestabelecer as restrições.
O termo data comemorativa não está incluindo no texto da lei, mas contempla, por exemplo, visitas às famílias em feriados como o Natal ou os dias das Mães e dos Pais, com o intuito de ressocializar o preso. Cada estado estipula seu próprio calendário.
O benefício da saída temporária é concedido há quase quatro décadas pela Justiça a presos do sistema semiaberto que já tenham cumprido ao menos um sexto da pena, no caso de réu primário, e um quarto da pena, em caso de reincidência, entre outros requisitos.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, menos de 5% dos detentos que tiveram direito à saidinha de Natal em 2023 não retornaram aos presídios, taxa considerada baixa por especialistas.
O projeto dividiu aliados do governo. Alguns ministérios, como Justiça e Segurança Pública, defenderam veto parcial à proposta; outros, como Igualdade Racial, o veto total.
Uma parte da ala política defendia a sanção integral por considerar que eventual veto poderia azedar o clima com o Congresso. Hoje o governo não tem maioria na Câmara e tem relação tumultuada com o presidente Arthur Lira (PP-AL).
Por outro, ministros mais ligados à esquerda também pressionam para que Lula não cedesse à pressão da ala conservadora do Congresso e mantivesse coerência com o discurso progressista sobre a necessidade de implementação de medidas de ressocialização de presos.
O texto foi aprovado na Câmara no dia 20 de março. Ele estava sob relatoria de Guilherme Derrite (PL-SP) -que foi exonerado do cargo de secretário da Segurança Pública do estado de São Paulo, no governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), para reassumir a vaga de deputado federal.
Foi sob sua relatoria que o texto foi aprovado em agosto de 2022. O projeto voltou para a Câmara após mudanças no Senado, em fevereiro.
Durante a votação, os apoiadores da proposta defenderam o endurecimento de penas criminais. Já os deputados aliados do governo foram contrários à proposta sob argumento de que acabaria com mais um direito dos presos e não reduziria os índices de criminalidade.
A primeira versão do projeto aprovado pela Câmara acabava com qualquer tipo de saída temporária para presos do sistema semiaberto, inclusive aquelas para estudar e trabalhar.
O projeto também previa o exame criminológico -que abrange questões de ordem psicológica e psiquiátrica- como requisito para a progressão de regime.
No Senado houve um acordo, e a nova redação do projeto continuou colocando fim às saidinhas em datas comemorativas, mas manteve a autorização para estudar e trabalhar fora do sistema prisional. Além de manter o exame para progressão de regime.
A legislação já negava o benefício a indivíduos condenados por crimes hediondos com resultado de morte. O novo projeto passou a estender essa restrição também aos casos de crimes cometidos com violência ou grave ameaça.
Em razão das mudanças, o texto precisou passar novamente pelo plenário da Câmara. Ele foi aprovado na Casa sem alterações.
O tema se tornou foco de discussões e mobilizou setores da classe política após a morte do sargento da Polícia Militar Roger Dias da Cunha, 29, baleado durante uma perseguição por um homem que estava em saída temporária em Belo Horizonte.
Outro caso que gerou repercussão foi a fuga de dois dos condenados por chefiar a maior facção de tráfico de drogas do Rio de Janeiro, Saulo Cristiano Oliveira Dias, 42, conhecido como SL, e Paulo Sérgio Gomes da Silva, 47, o Bin Laden, após o direito a saidinha de Natal.
Mais de 60 entidades, movimentos e órgãos públicos que atuam no sistema prisional expressam preocupação em relação ao projeto. Segundo entidades, a previsão de exigência para realização de exame criminológico para toda e qualquer progressão de regime fará com que os processos tramitem de forma ainda mais lenta.
Atualmente, segundo as entidades, os exames criminológicos demoram, no mínimo, quatro meses para serem elaborados, em razão da precarização das equipes técnicas das unidades prisionais. Ao menos 296 unidades prisionais brasileiras não possuem nenhum servidor de psicologia contratado, totalizando 19,3% das unidades.
ENTENDA O QUE MUDA NA SAIDINHA
**Como é na lei atual**
– Vale para presos do regime semiaberto que tenham cometido qualquer tipo de delito, exceto para casos de crime hediondo com resultado em morte;
– Podem sair temporariamente em datas comemorativas, para visita à família, cursos profissionalizantes e atividades de ressocialização quem cumprir os seguintes requisitos: 1) comportamento adequado; 2) cumprimento de 1/6 da pena em caso de réu primário e de 1/4 se for reincidente; 3) obtiver autorização judicial;
– Progressão de regime: exame criminológico é exceção, a lei não impõe, mas pode ser exigido pelo juiz mediante decisão fundamentada.
**Como ficou após aprovação no Congresso**
– Além dos crimes hediondos, ficam vedadas saidinhas para condenados por crimes com violência ou grave ameaça;
– Acaba com saidinhas em datas comemorativas e permite apenas saídas temporárias para estudo e trabalho externo;
– Progressão de regime: obriga o detento a passar por exame criminológico.
**Como fica a lei com a decisão do presidente Lula (PT)**
– Manter a saída temporária em datas comemorativas para presos do semiaberto, como Dia das Mães, Natal. Além da liberação para estudar e trabalhar;
– Além dos crimes hediondos, ficam vedadas saidinhas para condenados por crimes com violência ou grave ameaça;
– Progressão de regime: obriga o detento a passar por exame criminológico.
RAQUEL LOPES, RENATO MACHADO E CATIA SEABRA / Folhapress