CASCAVEL, PR E VINHEDO, SP (FOLHAPRESS) – O casal Antonio Zini Júnior e Kharine Pessoa Zini foram as primeiras vítimas do acidente aéreo da Voepass veladas em Cascavel (PR), de onde o voo partiu na manhã de sexta-feira (9) com destino ao aeroporto de Guarulhos. Das 62 pessoas a bordo, ao menos 28 moravam na cidade e arredores.
Os corpos foram liberados pelo IML (Instituto Médico Legal) de São Paulo na noite de segunda-feira (12) e transportados de carro até o local onde a família vive, já que os parentes optaram por não esperar o translado disponibilizado em avião da FAB (Força Aérea Brasileira) nesta terça-feira (13).
O salão do Clube Comercial de Cascavel começou a ser preparado para receber o velório na manhã de terça. Fotos do casal, uma bola e uma chuteira também foram colocados porque Zini Júnior atuou como goleiro do time local de futebol de salão.
O casal estava junto havia 14 anos. O voo da Voepass para Guarulhos fazia parte do itinerário até a Alemanha, onde Kharine ia fazer um curso de medicina germânica. O casal iria passar 15 dias no país europeu e era a primeira viagem sem os dois filhos, de 8 e 10 anos.
Zini Júnior é um dos quatro filhos do empresário Deoclides Zini, dono da transportadora e rede de postos Pra Frente Brasil, onde ele trabalhava como diretor de logística e era responsável pela supervisão de cerca de 800 caminhões por dia.
Laços pretos em sinal de luto foram colocados nos postos de combustível espalhados pela cidade.
Visto como um pai dedicado, Zini Júnior tinha o costume de deixar reuniões para buscar as crianças na escola todo dia, às 18h. “Ele dizia que tinha um compromisso de família e saía”, diz Andrelise Daltoé, gerente de comunicação da empresa.
O velório causou comoção na cidade e centenas de pessoas foram ao local acompanhar as homenagens, entre amigos, familiares e funcionários.
Mais de 300 coroas de flores foram enviadas por famílias, empresas locais, times esportivos, clínicas, bancos e sindicatos. O espaço do salão não foi suficiente para organizar todas, e algumas tiveram que ser colocadas nos corredores. Dois caminhões foram destacados para levar as coroas até o cemitério onde o sepultamento será realizado, na manhã de quarta-feira (14).
Amiga de infância de Kharine, a psicóloga Karine Rizzard contou que iria embarcar no mesmo voo com o marido para ir a um casamento em Santa Catarina. “Meu marido falou pra gente ir de ônibus. Ele sentiu alguma coisa no coração. Quando veio a notícia, a gente caiu em si, íamos deixar três crianças”, disse. “É um misto de emoções, feliz por estar viva mas ao mesmo tempo triste por termos perdido pessoas tão queridas.”
FAMÍLIAS RECUSAM VELÓRIO COLETIVO
Assim como a família Zini, outras 17 representantes de vítimas da tragédia recusaram a proposta da prefeitura de realizar um velório coletivo no centro de eventos municipal.
A gestão do prefeito Leonaldo Paranhos (Podemos) começou os preparativos do local nesta segunda-feira (12), quando foram instalados tecidos pretos para organizar espaços reservados aos parentes, e transportados vasos de plantas e móveis para apoiar os caixões.
A Secretaria de Assistência Social está em contato com os familiares e afirmou que 11 deles decidiram velar suas vítimas em locais privados. Quatro velórios serão realizados em cidades próximas, dois em Guaíra e dois em Toledo.
Outros corpos serão transportados para as cidades de Três Barras (PR) e Fernandópolis (SP). O piloto Danilo Romano foi enterrado nesta segunda na zona leste de São Paulo, onde morava.
Ainda falta a definição de três vítimas cujas famílias não foram contatadas pela gestão municipal.
Os velórios da influenciadora digital Ana Caroline Redivo e da professora universitária Silvia Cristina Osaki também foram realizados nesta terça após a chegada das urnas funerárias em voo da FAB.
Uma terceira vítima também foi transportada no voo, mas desembarcou em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Sua identidade não foi divulgada.
Um comboio acompanhou o carro que levou Ana Caroline até a paróquia de Santa Tereza do Oeste, a cerca de 20 quilômetros de Cascavel, onde ela morava com a família.
Professora de medicina veterinária e ciências biológicas na Universidade Federal do Paraná (UFPR), Silvia morava em Palotina e foi velada na cidade.
Em Santa Rosa, no noroeste do Rio Grande do Sul, um laço branco com duas alianças unia os caixões de Daniela Schulz Fodra e Hiales Carpiné Fodra, que estavam casados desde 2017.
Daniela era natural de Santa Rosa, tinha uma empresa de produtos fitness e participava de campeonatos de fisiculturismo. Pelas redes sociais, divulgava sua rotina de exercícios para mais de 40 mil seguidores.
Hiales era engenheiro agrônomo e agente da PRF (Polícia Rodoviária Federal) no Paraná. Em nota, a corporação lamentou a morte e manifestou solidariedade aos familiares das vítimas.
Os caixões foram levados para a cidade paranaense de Moreira Sales, terra natal de Hiales, para um segundo velório e o sepultamento, que aconteceu na manhã desta terça-feira.
Daniela e Hiales moravam em Ubiratã, no oeste do Paraná, e estavam de viagem marcada para os Estados Unidos, onde Daniela competiria na próxima semana em um evento em Tupelo, no Mississippi. Em abril, ela havia conquistado o IFBB PRO Card, que credencia fisiculturistas como profissionais.
As demais famílias aguardam a finalização do processo de identificação dos corpos e o posterior translado até as cidades de origem.
COMO ESTÁ A INVESTIGAÇÃO
O Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção a Acidentes Aeronáuticos) informou, em nota, que a extração dos gravadores de voo da cabine da aeronave foi concluída e que a íntegra das conversas está com o órgão, responsável pela apuração das causas do acidente.
Até a tarde desta terça-feira, 45 corpos de vítimas da queda do voo 2283 da Voepass haviam sido identificados. Desses, 27 já foram liberados aos familiares, que são os primeiros a serem comunicados sobre o andamento do trabalho de reconhecimento.
Outros cinco corpos estão em processo de documentação para a liberação às famílias, de acordo com boletim emitido pelo Governo de São Paulo.
Em Vinhedo, os trabalhos de remoção dos pertences das vítimas foram interrompidos no fim da tarde de segunda-feira porque material genético das vítimas foi encontrado no local da tragédia, o que exigiu o retorno da Polícia Científica.
Esse material, uma vez coletado, foi encaminhado durante à noite para o IML de São Paulo, onde acontece a identificação.
Na manhã desta terça, veículos da perícia retornaram ao local para realizar fotometria e escaneamento da área. Segundo o chefe da Defesa Civil de Vinhedo, Maurício Barone, o órgão ainda aguarda a conclusão do trabalho para avaliar possíveis danos à estrutura de três imóveis potencialmente atingidos pelo impacto da aeronave ao solo.
Uma das casas -situada exatamente no local da tragédia- está interditada. Não há previsão de quando a área onde a aeronave caiu será liberada ao proprietário. Vizinhos relatam que o morador está traumatizado, e que pode não voltar ao imóvel.
Além dos pertences das vítimas, que incluem bagagens, carteiras e celulares, ainda estão no local os destroços do avião. Empresa contratada pela Voepass fará a remoção dos objetos assim que a área for liberada pela perícia.
Alheios aos trabalhos, moradores e prestadores de serviço seguem suas rotinas normalmente no condomínio Recanto Florido. Na portaria, pessoas param para olhar e tirar fotos. Algumas deixaram flores em frente ao local.
MARIANA ZYLBERKAN E LUIS EDUARDO DE SOUSA / Folhapress