SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Coincidências são raras no mundo dos videogames. Ainda assim, tanto Nintendo quanto Sega juram de pés juntos que os lançamentos de “Sonic Superstars” e “Super Mario Bros. Wonder” com apenas três dias de diferença foram apenas isso, uma coincidência após anos de desenvolvimento e planejamento dos novos jogos de suas principais mascotes.
“Nós ficamos muito surpresos quando descobrimos que a Nintendo estava publicando seu jogo bem perto do nosso”, diz Takashi Iizuka, produtor do novo game do Sonic, lançado no último dia 17.
“É pura coincidência, não há nenhuma coordenação [com a Sega] em relação ao timing do lançamento”, afirma Bill van Zyll, diretor sênior e gerente geral para a América Latina da Nintendo, sobre o jogo que chegou às lojas no dia 20.
As coincidências não se resumem apenas à data de lançamento. Ambos os games buscam, com gráficos modernos e novas mecânicas, renovar a jogabilidade clássica dos jogos 2D de plataforma, que estão na origem dos mais de 30 anos de sucesso das duas franquias.
“No passado os jogos eram apenas diversão e entretenimento. Algo que você podia pegar e jogar, sem ter de explicar muito. Em Sonic Superstars nós quisemos trazer de volta essa experiência casual, de apenas diversão, diversão e diversão. Provavelmente a Nintendo chegou a essa mesma ideia”, diz Iizuka.
Van Zyll, por sua vez, vê essas coincidências como uma prova da popularidade dos jogos de plataforma 2D. “Eles têm muitos fãs, alguns desde o NES [um dos primeiros consoles da Nintendo, lançado em 1985 nos EUA]. As pessoas adoram. Continuam sendo jogos divertidos e desafiadores”, afirma.
Apesar dos elogios ao gênero, a Nintendo não criava um jogo de plataforma 2D do Mario totalmente novo desde 2012, quando “New Super Mario Bros. U” foi lançado para o Wii U.
Nesse intervalo de mais de dez anos, é verdade que a empresa fez algumas experiências com o formato, lançando a série “Super Mario Maker” com fases criadas pelos próprios jogadores e “Super Mario Run” título para celulares, com jogabilidade ainda mais simplificada. No entanto, só em “Super Mario Bros. Wonder”, a Nintendo de fato revisitou a fórmula clássica dos jogos do personagem de uma forma que cativou fãs e críticos.
“O que é realmente empolgante sobre Wonder é que há muitos níveis diferentes nos quais você pode jogar. Crianças ou pessoas que são novas na série serão capazes de pegar e jogar, mas também aqueles que jogam há décadas podem ser muito desafiados. É um jogo realmente para todos”, resume Van Zyll.
A Sega, por sua vez, vem apostando mais no gênero, mas com jogos que apelam mais à nostalgia do que à inovação. São os casos, por exemplo, de “Sonic Mania” lançado em 2017, que misturava jogos clássicos em uma espécie releitura e “Sonic Origins” relançamento de 2022 dos primeiros títulos do personagem, para Mega Drive e Game Gear.
“Sonic Superstars”, porém, representa um novo rumo e é visto pela empresa como uma nova base para o futuro da franquia. Um salto que Iizuka compara ao lançamento de “Sonic Frontiers”, responsável por reformular a série de jogos 3D de Sonic com a introdução de elementos de jogos de mundo aberto.
“Tentamos manter a sensação clássica de jogar Sonic, com os mesmos controles e design de níveis”, diz Iizuka. “Quando conseguimos isso, adicionamos novos elementos, como as esmeraldas do poder [que dá novas habilidades aos personagens] e o modo de jogo cooperativo”, completa.
Mesmo que involuntariamente, os lançamentos reavivam uma rivalidade de quase 30 anos, que moldou a história dos videogames.
Mario foi um dos primeiros grandes mascotes da indústria. Os primeiros jogos protagonizados pelo encanador bigodudo, no fim dos anos 1980, ajudaram a Nintendo a se estabelecer como uma das líderes mundiais do incipiente mercado de consoles.
Já Sonic, desde a concepção, foi pensado para ser uma espécie de “anti-Mario” como mascote do Mega Drive (ou Sega Genesis, nos Estados Unidos), lançado pela Sega para concorrer com o Super Nintendo.
Da cor azul mesmo tom do logo da Sega aos sapatos vermelho e branco inspirado na capa do álbum “Bad”, de Michael Jackson, tudo foi pensado para criar um personagem moderno e ousado, que representasse o lema “Genesis does what Nintendon’t” (O Genesis faz o que o Nintendo não faz), mote da campanha de marketing recheada de celebridades da empresa.
A estratégia foi bem-sucedida. Lançado em 1991 e vendido em conjunto com o Mega Drive, o primeiro “Sonic the Hedgehog” ajudou a Sega a tomar da Nintendo a liderança do mercado americano de consoles. Até hoje, esse é o maior sucesso comercial da franquia, com cerca de 15 milhões de cópias vendidas.
Nos anos seguintes, no entanto, erros na concepção e lançamento de seus próximos aparelhos de videogame custaram caro à Sega. Ao mesmo tempo, a empresa patinava ao tentar adaptar os jogos do mascote às novas tecnologias.
Meses após a Nintendo lançar com o Nintendo 64 o jogo “Super Mario 64”, que virou paradigma para os jogos 3D de plataforma, por exemplo, a Sega lançou o medíocre “Sonic 3D Blast”, um dos derradeiros títulos do Mega Drive.
A empresa saiu definitivamente do mercado de consoles em 2001, com a fabricação do último Dreamcast. O fim da competição na área de hardwares, porém, abriu espaço para o início de uma nova era no relacionamento entre as duas empresas e, consequentemente, entre os dois personagens.
Iizuka, por exemplo, chegou a trabalhar com a Nintendo na série “Mario & Sonic at the Olympic Games”, primeira protagonizada pelos dois personagens e cujos jogos são compostos por minigames inspirados em esportes olímpicos.
“Temos um relacionamento muito bom. Pude ver de perto como eles realmente se importam e respeitam não só o Mario, mas o Sonic também. Trabalhar com a Nintendo foi uma grande honra”, disse Iizuka. “Eles fazem hardwares excelentes, que as pessoas amam. Gostaria muito de voltar a trabalhar com eles no futuro.”
Elogios que Van Zyll também dirige ao antigo concorrente. “Nós temos uma longa história com a Sega, de um bom e sólido relacionamento”, afirmou o executivo da Nintendo.
MARIO VENCE SONIC EM BUSCAS NO GOOGLE
Na internet, o encanador da Nintendo vence a disputa de popularidade contra o ouriço da Sega.
Segundo dados do Google Trends, plataforma que mede o interesse de busca por termos e assuntos, Mario é quatro vezes mais pesquisado do que o ouriço azul no Brasil. Os dados globais dão uma vantagem semelhante para o personagem da Nintendo.
Os únicos meses em que Sonic ultrapassou seu rival estão ligados ao lançamento de suas adaptações para o cinema, “Sonic”, em fevereiro de 2020, e “Sonic 2”, em abril de 2022. O encanador também teve um pico de buscas com o lançamento de seu filme, em abril deste ano.
TIAGO RIBAS / Folhapress