Matthew McConaughey, longe de Hollywood, busca o sentido da vida nos livros

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Decepcionado com o sonho americano, Matthew McConaughey decidiu se afastar do glamour de Hollywood para buscar o sentido da vida na literatura. Depois de escrever um livro de memórias em 2021, “Greenlights”, ou faróis verdes, o ator lança agora “Só Porque”, direcionado ao público infantil.

Se no antecessor, que ficou cem semanas na lista de mais vendidos do New York Times, McConaughey narrava acontecimentos que lhe trouxeram algum aprendizado ou epifania filosófica sobre a vida —criando máximas como “eduque antes de acusar” e “sou bom no que amo, não amo tudo no que sou bom”— o novo livro parece condensar essas lições em morais para pequenos acontecimentos cotidianos.

“Só porque cheguei ao topo, não significa que não posso cair”, ele escreve sobre a ilustração de uma garotinha que subiu em um trepa-trepa, mas está com medo de descer. “Só porque tive medo, não significa que deixei de dar meu melhor”, diz outra página, em que um menino hesita antes de descer uma rampa com seu skate.

A inspiração para o livro surgiu observando as dúvidas e angústias de seus filhos Levi, 16, Vida, 15 e Levingston, 12, conta McConaughey por videochamada. Uma barba longa é o visual que o ator adota no momento em que diz estar tentando ser o melhor que pode, enquanto dedica sua atenção à família.

“O mundo diz que você precisa ser de um jeito ou de outro, que você deve ser melhor do que é, que só tem um jeito de fazer algo. Não aprendemos a fazer algo certo até fazermos errado. Não descobrimos quem somos sem antes descobrir quem não somos”, defende, apaixonadamente, o ator.

O conselho é para os filhos, mas parece servir também para si próprio, que já mudou o rumo de sua vida algumas vezes. Conhecido como o galã das comédias românticas até 2009, McConaughey deixou para trás o sonho na Califórnia e voltou para o Texas, seu estado natal, com a sua mulher, a modelo brasileira Camilla, então grávida de seu primeiro filho.

“Quando me afastei de Hollywood, eu estava fazendo muito sucesso com comédias românticas e ação, mas estava entediado”, diz. “Meu agente disse que meu nome não era mais ouvido em Hollywood, e pensei que nunca trabalharia ali novamente. Mas, por mais assustado que eu estivesse, nunca me arrependi da minha decisão.”

O gelo foi quebrado com ofertas de papéis em filmes independentes, como um fugitivo isolado em “Amor Bandido” e um stripper em “Magic Mike”. As performances chamaram a atenção dos produtores de “Clube de Compras Dallas”, que escolheriam McConaughey para interpretar Ron Woodroof, um eletricista com HIV que começa a importar ilegalmente drogas do México para ajudar no tratamento de pacientes soropositivos.

O papel rendeu a McConaughey o Oscar de melhor ator, que no mesmo ano foi aplaudido pela cena curta, mas marcante, de “O Lobo de Wall Street”, de Martin Scorsese, em que vive um irreverente agente do mercado financeiro viciado em cocaína.

Um ano depois, em 2014, McConaughey protagonizou “Interestelar”, drama distópico sobre o tempo e buracos negros, de Christopher Nolan, e se tornou o investigador Rust Cohle, que levaria a série “True Detective” ao sucesso.

“Olhando para trás, muitas coisas que conquistei na minha vida aconteceram porque não pedi permissão e fui resiliente, suportando um momento que parecia difícil”, diz.

Foi assim que o ator conseguiu seu primeiríssimo papel, em “Dazed and Confused”, ao aparecer, calculadamente, no mesmo bar em Austin onde sabia que o diretor de elenco do filme iria beber alguns drinks no mesmo dia. “Mas eu acreditava que existia, você conhece aquele provérbio, um pote de ouro no fim do arco-íris.”

Depois de chegar ao topo, como da primeira vez, McConaughey voltou ao Texas. Os blockbusters perderam importância para o que parece ser uma busca existencial, ligada à dedicação à sua comunidade e à escrita.

Não por acaso, em “Só Porque”, McConaughey expõe as crianças a situações nas quais a saída é acreditar na possibilidade de melhora, e que as nossas ações podem provocar mudanças positivas —perspectivas que, segundo ele, são negadas às novas gerações.

“O sonho americano, para muitas pessoas, é uma ilusão, uma miragem. Está definitivamente ficando cada vez menos claro, não só na América, mas em todo o mundo, o que é sucesso. Antes era bem definido, você deveria ter um emprego, se casar, ter filhos e comprar uma casa que pode pagar. Esse caminho não é o mesmo. Há muitos obstáculos a mais para conseguir isso.”

Em 2021, o ator agitou as eleições ao anunciar que estava cogitando se candidatar para governador do Texas, o que o tornaria uma ameaça para o candidato democrata, Beto O’Rourke, na disputa contra o republicano Greg Abbott. Mas desistiu, e Abbott venceu no estado historicamente conservador.

Agora, ele se diz ansioso para o resultado da eleição presidencial nos Estados Unidos. Apesar de versado em política, McConaughey nunca divulgou seu apoio a algum partido e critica democratas e republicanos por terem se afastado das pessoas.

“Nossos líderes devem se perguntar sobre questões básicas. Qual é a utilidade da política? O que significam dois partidos? O que é a democracia? [As novas gerações] não estão animadas com o futuro e com a incerteza”, diz. Recentemente, o ator também criticou Hollywood por desprezar o eleitorado conservador.

Mas McConaughey decidiu não concorrer e prefere se empenhar no financiamento de instituições com impacto social em Austin, onde mora.

Quando questionado sobre o que é necessário para que ele aceite um grande papel em Hollywood hoje, o ator diz que quer sentir que seria o único capaz de fazer o personagem. “Essa sensação de que você é bom em algo que ama é maravilhosa, poderosa e libertadora. Mas quero senti-la antes de aceitar algum papel”, pondera. No momento, está empenhado em interpretar melhor a si mesmo.

“Quando atuo, o roteiro é de outra pessoa, filmado pelo olho de outra pessoa e editado. São muitos filtros dos quais não tenho controle. Um ator não é feito de palavras, mas um organismo vivo. Algo escrito em um parágrafo pode ser comunicado por um ator apenas com o olhar. Essa é a parte bonita de atuar”, afirma.

Mas o desafio de causar o mesmo impacto com as palavras o excita mais. “Quando você lê algo e consegue se sentir ali, ver aquilo, cheirar, saborear. É a beleza da transfusão através da palavra.”

SÓ PORQUE…

– Preço R$ 59,90 (32 págs.); R$ 34,99 (ebook)

– Editora Sextante

– Tradução Debora Fleck

ALESSANDRA MONTERASTELLI / Folhapress

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