BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A política econômica conduzida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi mais uma vez alvo de controvérsia dentro do PT. Uma ala do partido tentou suprimir de um documento oficial da sigla a crítica ao que é visto como um “austericídio” em execução pelo governo do presidente Lula (PT) mas a expressão foi mantida.
Com isso, o partido torna oficial a crítica à política de reequilíbrio fiscal defendida por Haddad. Recentemente, o ministro convenceu o restante do governo a manter a meta de zerar o déficit público em 2024, o que gerou contrariedade entre integrantes do partido.
“Não faz nenhum sentido, neste cenário, a pressão por arrocho fiscal exercida pelo comando do BC, rentistas e seus porta-vozes na mídia e no mercado. O Brasil precisa se libertar, urgentemente, da ditadura do BC ‘independente’ e do austericídio fiscal, ou não teremos como responder às necessidades do país”, afirma o documento.
A iniciativa para remover a crítica foi encampada pelo líder do governo na Câmara, José Guimarães (CE), e recebeu apoio do líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), e dos deputados Carlos Zarattini (SP) e Washington Quaquá (RJ). Eles queriam excluir o ataque à condução da política fiscal de uma resolução que seria publicada pelo Diretório Nacional do partido, após uma prévia do texto ter sido apresentada na sexta-feira (8).
O grupo desistiu da iniciativa diante do argumento de que o prazo para apresentação de recursos havia expirado. Vice-presidente do PT, Quaquá alega que não valeria a pena brigar pela retirada da expressão, uma vez que “o estrago já estava feito”. “Erro político é igual merda de gato. Se mexer, fede mais. Melhor enterrar”, afirmou.
O objetivo de eliminar o rombo nas contas públicas vem gerando há meses divergências entre o governo e representantes do PT. No último sábado, a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, defendeu um déficit equivalente a 1% ou 2% do PIB (Produto Interno Bruto).
Gleisi negou que a crítica do documento seja direcionada aos integrantes do Executivo, mas defendeu que o país não pode ser guiado por austeridade fiscal. Ela e outros integrantes do PT já expressaram preocupação com as consequências de uma possível política de contenção de gastos para o nível de atividade econômica, a popularidade de Lula, o comportamento do Congresso e o desempenho eleitoral do partido no ano que vem.
“O austericídio não é uma crítica ao governo. Não podemos nos guiar por uma política de austeridade fiscal, em que isso venha contra a gente. Queremos que os investimentos aconteçam, que os programas sociais saiam”, disse ela no sábado (9).
A versão final do texto foi votada pelo Diretório Nacional após discussão que se arrastava desde a última sexta (8) quando a ala política liderada por Lula, a tendência petista Construindo um Novo Brasil (CNB), apresentou ao partido a proposta de resolução.
Esse não foi o primeiro embate interno do PT em relação à política econômica. Integrantes do partido já vinham se posicionando abertamente contra medidas de Haddad, como na formulação do arcabouço fiscal.
A resolução ainda diz que o resultado do PIB não tem sido maior “por causa da deletéria política de juros” do Banco Central presidido por Roberto Campos Neto.
A resolução diz que é preciso superar a “trava imposta pela política monetária da direção do Banco Central”, além de descrever Campos Neto como um aliado do bolsonarismo.
“Indicado por Jair Bolsonaro e pelo igualmente deletério ex-ministro Paulo Guedes, o ainda presidente do BC, Roberto Campos Neto, mantém com seus diretores a maior taxa de juros do planeta, sem que haja nenhuma justificativa plausível para essa barbaridade”, afirma o documento.
As forças conservadoras e fisiológicas do chamado Centrão, fortalecido pela absurda norma do orçamento impositivo num regime presidencialista, exercem influência desmedida sobre o Legislativo e o Executivo, atrasando, constrangendo e até tentando deformar a agenda política vitoriosa na eleição presidencial
Em resolução do Diretório Nacional
O presidente Lula também já fez diversas críticas à alta taxa de juros no Brasil, além de ataques a Campos Neto, no primeiro ano de governo. O petista pegou o costume de chamar o presidente do BC apenas de “cidadão”. Também já questionou se o chefe da autarquia não estaria “louco” e disse que ele não tinha compromisso com o Brasil.
O documento final também defende a atuação da Petrobras para o crescimento do país e defende a retomada do controle público da Eletrobras, privatizada em 2022 .
“Neste sentido, devemos aprofundar a reconstrução do papel estratégico da Petrobras no desenvolvimento do país e seguir nos esforços para recuperar o controle público da Eletrobras, entre outras empresas estatais que foram e seguem sendo vítimas da sanha neoliberal privatista”, afirma.
Outro alvo de críticas do partido, nesta resolução, é o centrão. O texto aprovado pela direção do partido diz que o campo político alinhado a Lula “segue minoritário no Congresso Nacional”.
“As forças conservadoras e fisiológicas do chamado Centrão, fortalecido pela absurda norma do orçamento impositivo num regime presidencialista, exercem influência desmedida sobre o Legislativo e o Executivo, atrasando, constrangendo e até tentando deformar a agenda política vitoriosa na eleição presidencial”, diz a resolução.
Na conferência do PT, Gleisi chegou a citar o risco de o apoio a Lula cair caso o cenário econômico se deteriore, o que se refletiria no comportamento dos parlamentares.
“Se cair a popularidade do presidente, vocês não tenham dúvida do que o Congresso vai fazer. Fizeram com a Dilma”, afirmou. Se baixar a popularidade do presidente, esse Congresso engole a gente”, disse. A declaração dela foi criticada nos bastidores por líderes de partidos do centrão.
A resolução aprovada pelo diretório do partido ainda afirma que é urgente para o PT se organizar para “alterar esta correlação de forças” dentro do Congresso.
CATIA SEABRA, THIAGO RESENDE E MATEUS VARGAS / Folhapress