SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Economistas mantêm suas projeções de alta para a Selic (taxa básica de juros) mesmo com o resultado melhor do que o esperado para a inflação de agosto.
Segundo dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nesta terça-feira (10), o IPCA (Índice de Preços ao Consumidos Amplo) registrou deflação de 0,02%. A expectativa do mercado financeiro era de leve variação positiva de 0,01%, de acordo com a mediana das projeções de analistas consultados pela agência Bloomberg.
O mercado avaliou os números como positivos, especialmente a desaceleração mensal de serviços, que foi de 0,75% em julho para 0,24% em agosto e vinha preocupando o Banco Central.
“Observou-se um recuo de todas as pressões observadas em julho, notadamente do núcleo [parte menos impactada pela volatilidade nos preços] e da inflação de serviços”, diz André Valério, economista sênior do Inter.
Alexandre Maluf, economista da XP, diz que parte da surpresa com o resultado melhor do que esperado do IPCA de agosto acontece justamente devido aos serviços subjacentes, dado que está na mira do BC por refletir os preços ligados ao impacto dos salários. Ele pondera que grande parte desse movimento veio dos gastos com alimentação fora do domicílio.
“Mas gostaria de ressaltar que isso não é suficiente para trazer um grande alívio. Olhando bem para as métricas dessazonalizadas, a gente ainda vê essas métricas rodando em um patamar muito alto”, diz Maluf. “É uma leitura fora ainda do ritmo de cumprimento da meta, de 3% de inflação”, diz.
Analistas também chamam atenção para o efeito de curto prazo da queda de preços.
“Os dados recentes reforçam a dinâmica da inflação corrente positiva, mas o esgotamento de vetores importantes para que essa dinâmica siga impactando a inflação ao consumidor ao longo dos próximos meses deve deixar o Banco Central vigilante e fazer com que a instituição ajuste a política monetária”, diz Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital.
“Para frente, ainda esperamos alguma pressão em serviços subjacentes que devem terminar o ano com uma alta próxima de 5,5%”, corrobora Luciana Rabelo, economista do Itaú BBA. O banco ainda está com previsão de Selic inalterada em 10,5% até o final do ano, mas em breve deve sair uma revisão de cenário.
Dois fatores que ajudaram para o arrefecimento do IPCA no mês passado foram a melhora nos preços de energia e de alimentos. Mas a conta de luz, por exemplo, vai subir em setembro com a volta da bandeira tarifária vermelha.
“A boa notícia deste mês fechado foi a energia elétrica que caiu 0,11 ponto percentual, uma deflação forte no índice, mas é um efeito que acaba. Agora, entra a bandeira vermelha que vai pressionar bastante a inflação nos próximos meses”, diz Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master.
Já os alimentos costumam ser beneficiados nesta época do ano com a temperatura mais amena, mas a forte seca e as queimadas que se espalham pelo país nas últimas semanas colocam os especialistas em alerta com relação à oferta de produtos e à consequente subida de preços.
Gala lembra que a economia ainda está muito aquecida, com chances de o PIB (Produto Interno Bruto) crescer perto de 3%, enquanto a taxa de desemprego está a um nível historicamente baixo, que pode cair ainda mais.
Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, diz que uma taxa de câmbio acima de R$ 5,50 coloca ainda mais pressão sobre o BC.
“Até o final do ano, alguns pontos de atenção seriam os preços dos bens industriais, que podem enfrentar uma leve pressão devido à recente desvalorização cambial, e a elevação dos preços de energia após o anúncio da vigência da bandeira vermelha 1 em setembro, em meio a uma piora no quadro hidrológico dos reservatórios”, diz Sung.
Para Alexandre Maluf, da XP, a composição geral do IPCA ainda se mostra bastante desafiadora. Ainda assim, a leitura melhor do que as expectativas de alguns dados reforça a mensagem do presidente do BC, Roberto Campos Neto, de que um próximo ciclo de alta será gradual.
“Em termos de política monetária, olhando daqui adiante, pode ter uma diminuição das probabilidades de uma alta de 0,50 ponto percentual [na taxa Selic]”, diz Maluf.
“Acho que vem um mini ciclo de alta de juros aqui com passos de 0,25 ponto percentual até levar a Selic em 12%”, afirma Paulo Gala.
André Valério, do Inter, também vê esse cenário, já que a inflação se mostra mais bem-comportada e há um esperado alívio externo à medida que o Fed (Federal Reserve, banco central americano) corta juros. “O ciclo de alta dos juros será curto, tanto em quantidade de altas, quanto na magnitude”, afirma o economista.
STÉFANIE RIGAMONTI E JÚLIA MOURA / Folhapress