PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – O Mercado Público de Porto Alegre foi reaberto parcialmente nesta sexta-feira (14), depois de 41 dias fechado. O prédio foi um dos primeiros lugares a alagar na capital gaúcha com a enchente do lago Guaíba.
Apenas as lojas do segundo piso ou com acesso direto pela rua estão autorizadas a abrir. Ao todo, 15 bares, restaurantes e cafés voltaram a receber clientes, de um total de 132 empreendimentos.
A liberação das atividades do primeiro pavimento deve ocorrer terça-feira (18), mesmo que ainda haja obras. O prédio estava fechado desde o dia 3, quando o alagamento chegou ao centro de Porto Alegre. A água atingiu 1,5 metro no calçamento do térreo, oscilando para mais conforme o nível do piso.
De acordo com o secretário municipal de Administração e Patrimônio, André Barbosa, a reabertura do prédio, que foi inaugurado em 1869 e é o mais antigo mercado público em atividade no Brasil, deve servir de “inspiração para todos os comerciantes do centro histórico”.
“São mais de 1.500 empregos diretos e indiretos, tem famílias que produzem só para o Mercado Público, só pra vender aqui”, diz o secretário. “A gente tem essa questão econômica, social, cultural que precisa ser preservada, e essa data de hoje é simbólica porque ela demonstra resiliência de todas essas pessoas”.
A autônoma Valéria Quadros, 55, é cliente fiel do Mercado Público, onde compra material para fazer doces. Pega de surpresa ao passar em frente ao prédio, ela não sabia que o mercado reabriria nesta sexta-feira, mas aproveitou para almoçar.
“Comi um peixinho e tomei uma cervejinha”, conta Valéria. Depois, ela passeou pela parte liberada do prédio.
“Geralmente eu venho comprar produtos, especiarias, às vezes tomo um chope, às vezes almoço, às vezes como um sorvetinho na Banca 40”, comenta.
Ela diz que o fechamento do Mercado Público exigiu uma reorganização. “O serviço depende daqui, e deu uma quebradinha no orçamento, mas tranquilo. Não tem o que fazer”, diz Valéria. “Dentro do volume da tragédia que ocorreu no Rio Grande do Sul, não conseguir comprar o chocolate granulado é o de menos.”
Rita de Cássia, 18, garçonete do restaurante Mamma Julia, está otimista com o movimento do público, que ocupou a maior parte das mesas disponíveis no segundo andar.
“O recomeço é sempre bom”, conta. Ela conta que as perdas do restaurante se limitaram a carnes que estavam no freezer, um prejuízo grande porém menor do que o de outros permissionários.
O movimento não se compara ao período pré-enchente, mas dezenas de pessoas passaram pelo local para almoçar e ver o andamento da limpeza.
A faxina das áreas comuns do Mercado foi concluída, e todos os detritos já foram recolhidos. Os sinais de enchentes agora são vistos na marca da água na parede, na camada fina marrom que ainda cobre o chão e outras dependências, e nas lojas parcial ou totalmente vazias.
Nas lojas, dezenas de pessoas continuam a limpeza com vassouras e rodos. Também há obras em andamento, como pinturas e a retomada da troca dos sistemas de encanamento e esgoto, que já estava em andamento antes da enchente e precisou ser parcialmente refeita. Enquanto isso, funcionários trabalham o transporte de móveis e mercadorias de estoque.
Segundo Barbosa, uma das dificuldades para a retomada das operações do Mercado Público é a falta de mobiliário. Muitas lojas ainda aguardam a chegada de prateleiras, equipamentos eletrônicos e câmaras frias.
Os pontos abertos podem ser acessados apenas pela avenida Borges de Medeiros. Duas outras entradas serão liberadas na terça-feira.
Já o portão do Mercado na avenida Júlio de Castilhos, assim como as entradas das lojas neste quadrante, só poderá ser reaberto quando os acessos da estação Mercado do Trensurb forem higienizados. O local ainda está coberto de lixo e lodo, com cheiro forte.
O serviço não deve ser retomado na estação neste ano, mas a prefeitura quer que a limpeza da estação seja agilizada para não prejudicar a volta à rotina do centro. A interrupção do serviço de trem também causa um problema econômico aos comerciantes.
“Cerca de 30% a 35% do público do mercado vêm da região metropolitana”, diz Barbosa. “O trem vem lá de Novo Hamburgo, passa por meia dúzia de cidades e traz muito público ao mercado, principalmente aos finais de semana. As pessoas vem passear no centro, almoçar, fazer suas compras.”
Ele diz que a perda turística é agravada pelo fechamento do aeroporto internacional Salgado Filho por tempo indeterminado.
“O aeroporto fechado nos causa um baita problema porque acaba retirando muitos turistas do centro histórico, e do mercado por consequência”, fala o secretário. “O grande desafio a partir de agora é restabelecer esse transporte aéreo e via metrô”
No horário do almoço, o Mercado Público recebeu a visita surpresa dos ministros Paulo Pimenta (Reconstrução do Rio Grande do Sul) e Anielle Franco (Igualdade Racial) e dos secretários Wolney Wolff, da Defesa Civil, e Wadih Damous, da Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor).
A comitiva está em Porto Alegre para o anúncio de novas medidas federais. Também estavam no local a pré-candidata à Prefeitura de Porto Alegre Maria do Rosário (PT) e o ex-governador Olívio Dutra (PT).
O prefeito Sebastião Melo (MDB) não compareceu, mas destacou na tarde desta quinta (13), em reunião no CEIC-POA (Centro Integrado de Coordenação de Serviços de Porto Alegre), que o Mercado Público era o “coração” de Porto Alegre, e sua reabertura era fundamental para a retomada econômica da cidade.
O secretário André Barbosa anunciou que será construído um memorial nas dependências do prédio para marcar o impacto da enchente. “Tem quatro grandes escritórios nacionais de arquitetura que vão trabalhar em consórcio e vão doar para o município”, disse.
CARLOS VILLELA / Folhapress