Milhares vão às ruas para cerimônias em homenagem ao presidente do Irã

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Milhares de pessoas se reuniram nesta terça-feira (21) na cidade de Tabriz, no noroeste do Irã, para o início do cortejo fúnebre do presidente Ebrahim Raisi, 63, que morreu no domingo (19) após a queda de um helicóptero.

Uma multidão com bandeiras e retratos do presidente e das outras sete vítimas do incidente encheu a praça principal do centro de Tabriz, capital da província do Azerbaijão Oriental, onde a aeronave caiu. Os oito caixões, cobertos com bandeiras iranianas, foram colocados sobre um caminhão.

O Irã declarou cinco dias de luto nacional na segunda-feira (20). O funeral do presidente incluiria uma peregrinação à cidade sagrada de Qom nesta terça (21) e uma procissão de despedida em Teerã nesta quarta-feira (22). Depois disso, os restos mortais de Raisi serão transferidos na quinta-feira (23) para sua cidade natal, Mashhad (nordeste), onde o corpo será enterrado à noite.

Parlamentares e outros políticos estiveram presentes na cerimônia desta terça. No começo do cortejo, o ministro do Interior, Ahmad Vahidi, prestou homenagem aos mortos, considerados mártires pelo regime. “O povo iraniano demonstrou que transforma cada calamidade numa escada para elevar a nação a novas glórias”, disse.

A maioria das pessoas na marcha fúnebre vestia preto, em luto às vítimas. Imagens da televisão estatal mostraram algumas delas batendo com a mão no peito enquanto o caminhão que transportava os caixões se movimentava lentamente.

Embora uma multidão tenha saído às ruas, analistas mencionados pela agência de notícias Reuters apontaram menos comoção pública do que a registrada após a morte em 2020 do general Qassem Soleimani, então comandante da força Quds, o braço de elite da Guarda Revolucionária do Irã. O líder militar foi morto em um ataque com drones realizado pelos Estados Unidos na cidade de Bagdá.

A morte de Raisi ocorreu em um momento de tensão entre a liderança clerical e a sociedade iraniana, que está relacionada a temas que vão desde o reforço dos controles sociais e políticos até as dificuldades econômicas. Também aumentou a incerteza sobre o futuro do país —o presidente era um dos cotados para suceder o líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei.

Raisi promulgou as políticas linha dura de seu mentor, Khamenei, com o objetivo de consolidar o poder clerical, reprimir opositores e estabelecer os princípios para a política externa. “Todos vieram se despedir do presidente martirizado e dos seus companheiros, independentemente da sua facção, etnia ou língua”, disse o legislador de Tabriz, Masoud Pezeshkian, durante o cortejo fúnebre.

A morte do presidente foi recebida com luto contido e celebração disfarçada em um Irã dividido. Mesquitas e praças ficaram lotadas de pessoas leais ao regime que oraram por Raisi. Retratos do líder também foram pendurados em vários pontos das principais cidades do país. Ao mesmo tempo, opositores publicaram na internet vídeos de pessoas distribuindo doces supostamente para celebrar o ocorrido.

Laila, uma estudante de 21 anos em Teerã, disse à agência Reuters que não estava triste com a morte de Raisi “porque ele ordenou a repressão às mulheres devido ao hijab [véu islâmico]”. “Mas estou triste porque, mesmo com a morte de Raisi, o regime não mudará”, afirmou ela.

Em 2022 e em 2023, Raisi foi alvo de protestos que ocorreram em todo o país motivados pela morte de Mahsa Amini, 22, sob custódia policial, acusada de não vestir o véu islâmico da maneira exigida pelas autoridades religiosas. Mais de 500 pessoas foram mortas em confronto com a polícia e quase 20 mil foram presas, segundo a ONG Iran Human Rights (IHR).

Representantes de organizações que atuam com direitos humanos e da oposição iraniana lamentaram que a morte de Raisi tenha ocorrido antes de o presidente ser responsabilizado pelos crimes que, segundo eles, cometeu durante mais de três décadas.

“Raisi era um símbolo da impunidade judicial dos criminosos e da ausência de responsabilização na república islâmica”, disse à agência de notícias AFP Mahmood-Amiry Moghaddam, diretor da ONG IHR, com sede na Noruega. “Ele deveria ter sido processado por crimes contra a humanidade e respondido, no âmbito de um julgamento justo, pelas inúmeras atrocidades que cometeu.”

O presidente foi acusado de ter ordenado a execução de milhares de dissidentes nos anos 1980, quando integrou o chamado “comitê da morte” como subprocurador geral de Teerã. Nos últimos anos, Raisi foi responsável por agravar a instabilidade política e econômica do país desde a sua eleição em 2021. Ele sucedeu o moderado Hassan Rouhani, que o havia derrotado nas eleições presidenciais de 2017 e, após dois mandatos consecutivos, não pôde concorrer novamente.

“A simpatia por ele é um insulto às suas vítimas e à nação iraniana”, afirmou Reza Pahlavi, filho do último xá do Irã, deposto pela Revolução Islâmica de 1979, e um dos líderes da oposição. “O único arrependimento é que ele não tenha vivido o suficiente para ver a queda da república islâmica e que não tenha sido julgado pelos seus crimes.”

Os motivos que provocaram a queda do helicóptero ainda não foram esclarecidos. A aeronave caiu em uma área montanhosa e de difícil acesso perto da fronteira com o Azerbaijão. A localização e o mau tempo dificultaram as operações de resgate. Após o ocorrido, o Estado-Maior das Forças Armadas iranianas ordenou uma investigação para determinar as causas do incidente. Já Ali Khamenei garantiu que o acontecimento não iria causar “nenhuma perturbação” na administração da nação.

Veja o que se sabe até agora sobre o incidente.

POR QUE RAISI ESTAVA VIAJANDO?

Raisi viajava para participar de um evento em Azerbaijão Oriental, província no noroeste do Irã. Ali ele inaugurou, junto com o presidente do Azerbaijão, Ilham Aliev, as barragens Qiz Qalasi e Khoda Afarin. Trata-se de um projeto em conjunto com o país vizinho.

Após a cerimônia e antes de o helicóptero decolar em direção à capital da província, Tabriz, a cerca de 130 quilômetros da região da barragem e onde Raisi inauguraria outro projeto em uma refinaria de petróleo, Aliev se despediu de seu homólogo, segundo publicação no X.

O incidente aconteceu por volta das 13h30 locais do domingo (7h no Brasil), perto da cidade de Jolfa e a cerca de 600 quilômetros de Teerã. Durante a tarde, a televisão estatal iraniana afirmou que o helicóptero havia feito uma “aterrissagem forçada”, e só na segunda (20) veio a confirmação da morte pela emissora.

QUEM ESTAVA NO HELICÓPTERO?

Além de Raisi, estavam na aeronave o chanceler iraniano, Hossein Amirabdollahian, o governador da província de Azerbaijão Oriental, Malik Rahmati, o representante do líder supremo nessa região, Mohammad Ali Al-Hashem, o chefe de segurança do presidente, Sardar Seyed Mehdi Mousavi, e três tripulantes —os coronéis Seyed Taher Mostafavi e Mohsen Daryanush, piloto e copiloto do helicóptero, respectivamente, e o major Behrouz Ghadimi, técnico de voo.

Nenhuma das oito pessoas a bordo sobreviveu.

QUAL ERA O MODELO DA AERONAVE?

A comitiva viajava em um Bell 212, uma versão civil do UH-1N Twin Huey, usado na época da Guerra do Vietnã.

A aeronave remonta ao final dos anos 1960, quando a Bell Helicopter (agora Bell Textron, um braço da Textron) desenvolveu o modelo para o Exército canadense. No início dos anos 1970, Bell 212 foi adotado tanto pelos Estados Unidos quanto pelo Canadá, de acordo com documentos de treinamento militar americanos.

O modelo iraniano que caiu no domingo estava habilitado para transportar passageiros —de acordo com os documentos de certificação da Agência de Segurança da Aviação da União Europeia, esse tipo de aeronave pode viajar com 15 pessoas, incluindo a tripulação.

A origem exata do helicóptero envolvido no acidente não foi confirmada, mas especialistas dizem que os poucos detalhes disponíveis sugerem que tivesse entre 40 e 50 anos. A obsolescência da aeronave reflete o impacto de décadas de sanções à teocracia instalada em 1979, que dificultaram a importação de peças.

QUAIS OUTROS INCIDENTES ENVOLVERAM O BELL 212?

O acidente com mortos mais recente envolvendo um Bell 212 ocorreu em setembro de 2023, quando uma aeronave operada de forma privada caiu perto da costa dos Emirados Árabes Unidos, de acordo com a Flight Safety Foundation, uma ONG que foca a segurança da aviação. Piloto e copiloto morreram.

Em 2015, segundo a entidade, um helicóptero que se acreditava ser um Bell 212 caiu perto de Kashan, na região central do Irã, matando três pessoas.

POR QUE O HELICÓPTERO CAIU?

A razão para a queda ainda não está clara, mas a agência estatal Irna afirmou, sem dar detalhes, que houve uma “falha técnica” do modelo Bell 212 e as condições do tempo eram ruins, com chuva e muita nebulosidade.

COMO FORAM AS BUSCAS?

Após a queda do helicóptero, vários países se solidarizaram e ofereceram ajuda a Teerã, incluindo Arábia Saudita, Qatar, Emirados Árabes Unidos, Iraque e Rússia. A Comissão Europeia, órgão da União Europeia, disse que ativou o seu serviço de mapeamento por satélite para auxiliar nas buscas, e a vizinha Turquia colocou à disposição um drone, um helicóptero e uma equipe de resgate.

Os socorristas trabalharam contra tempestades de neve e terrenos difíceis durante a noite para alcançar os destroços na manhã de segunda (20). Imagens da televisão estatal mostraram destroços espalhados em uma encosta sob neblina.

Redação / Folhapress

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