BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Militares próximos ou que atuaram como assessores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) reforçaram as acusações feitas pela Polícia Federal no inquérito das joias, conforme depoimentos prestados ao órgão. Todos foram citados por lavagem de dinheiro e associação criminosa.
Os militares confirmaram informações sobre a venda e tentativa de venda das joias e bens de luxo, dados de presente a Bolsonaro no exterior como chefe de Estado, e também sobre a operação para recuperar os itens.
A maior parte dos dados foi detalhada pelo tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid, em acordo de colaboração firmado com a Polícia Federal.
O tenente-coronel disse, por exemplo, que, em dezembro de 2022, o ex-presidente lhe entregou uma mala contendo esculturas e joias, solicitando que os itens fossem vendidos. Isso colaborou para que a PF pudesse afirmar que Bolsonaro tinha conhecimento do esquema.
O ex-presidente foi indiciado sob suspeita dos crimes de associação criminosa (com previsão de pena de reclusão de 1 a 3 anos), lavagem de dinheiro (3 a 10 anos) e peculato/apropriação de bem público (2 a 12 anos).
Cid também afirmou que, em janeiro de 2023, viajou de Miami para Nova York, nos Estados Unidos, para entregar as joias do “kit ouro rosé” na loja Fortuna Auction para serem vendidas em leilão online.
Ele acrescentou que o ex-presidente tinha ciência de que o referido kit tinha sido encaminhado para ser vendido em leilão naquele país.
O conjunto trazia itens masculinos da marca Chopard, contendo uma caneta, um anel, um par de abotoaduras, um rosário árabe e um relógio recebidos pelo então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, após viagem a Arábia Saudita, em outubro de 2021.
A análise dos dados coletados pela PF no telefone celular de Mauro Cid revelou que o kit foi levado do país em dezembro de 2022, por meio do avião da Presidência da República, e colocado à venda em leilão nos Estados Unidos.
Após frustrada a tentativa de comercialização, as joias não foram arrematadas, fato que permitiu que o grupo recuperasse os bens e devolvesse-os ao Estado brasileiro, após decisão do TCU (Tribunal de Contas da União).
Além disso, mostrou que, após a tentativa frustrada de venda, o conjunto foi devolvido e que parte das joias foi entregue no local onde Bolsonaro residia em Orlando.
Mauro Cid também declarou à PF que outros assessores de Bolsonaro, o coronel Marcelo Câmara e o capitão Osmar Crivelatti, assessor da segurança do ex-presidente, hoje afastado de suas funções por determinação judicial, participaram da etapa de recuperação dos bens.
Já o general da reserva Mauro Cesar Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens, disse que seu filho solicitou que ele recebesse em sua conta bancária nos Estados Unidos valores decorrentes de uma venda de bens de propriedade do então presidente.
O general afirmou que recebeu a quantia de US$ 68 mil, da qual seu filho avisou que se tratava da venda de relógios de Bolsonaro.
Ele disse que esse valor teria sido repassado, de forma fracionada, ao ex-presidente. Lourena Cid também falou que chegou a encaminhar para avaliação, em estabelecimentos comerciais, as esculturas douradas em forma de árvore e barco.
Os objetos foram recebidos por Bolsonaro como presentes em viagens oficiais em novembro de 2021 aos Emirados Árabes Unidos e ao Bahrein.
Segundo a PF, os bens foram desviados do acervo público sem registro oficial e posteriormente levados de forma escamoteada aos Estados Unidos, no avião presidencial.
O general disse que, já de volta ao Brasil em abril de 2023, guardou os objetos em sua residência, em Niterói, na região metropolitana do Rio.
Em seguida, disse ter entrado em contato com Crivelatti para devolver as peças. A polícia disse que, até o momento, os objetos não foram identificados no inventário de encerramento do acervo privado presidencial do ex-presidente.
Crivelatti também confirmou em seu depoimento à PF dados sobre o transporte das joias. Ele disse, por exemplo, que o kit em ouro rosé foi entregue na residência onde estavam Bolsonaro e seus assessores, na cidade de Kissimmee, Flórida.
Além disso, afirmou que, ao retornar de uma viagem com Bolsonaro, em Washington, entregou o kit “em mão” ao ex-presidente.
Ele também declarou que recebeu do general Lourena Cid as esculturas douradas que foram levadas ao Estados Unidos pelo então presidente em dezembro de 2022 para serem vendidas e confirmou que os objetos não estavam registrados no acervo privado do ex-presidente.
O assessor confirmou dados sobre a operação para levar as joias ao Brasil. Ele disse ter recebido ligações para entregar bens que seriam de propriedade do ex-presidente em Brasília, em maio de 2023, e que, no mesmo dia, levou as esculturas até a sala da assessoria do ex-presidente na capital.
A PGR (Procuradoria-Geral da República) analisa agora se denuncia o ex-presidente e os demais indiciados. Se isso ocorrer, caberá depois à Justiça decidir se eles viram réus.
A defesa de Bolsonaro tem negado que houve crime. Seus advogados divulgaram nota na segunda-feira (8) em que disseram que o ex-presidente se apresentou espontaneamente para a entrega dos presentes, assim que a legalidade deles passou a ser questionada pelo TCU.
CONSTANÇA REZENDE / Folhapress