‘Minha vida agora é explicar que não temos nada a ver com PCC’, diz presidente do banco Luso

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Desde a manhã de 9 de abril deste ano, quando o Ministério Público paulista deflagrou a Operação da Fim da Linha, a rotina do presidente do Banco Luso Brasileiro, José Francisco Fernandes Ribeiro, 61, tem sido uma só, segundo ele: explicar que a instituição não tem nada a ver com a facção criminosa PCC.

“Até agora eu estou fazendo reuniões. Eu tenho quatro, cinco reuniões por dia aqui. Para tornar claro para o mercado que nós não tínhamos nada a ver com isso [com lavagem de dinheiro do PCC]. […] Dez presidentes de bancos ligando para mim de madrugada. ‘Poxa, Francisco, o que é isso?’ Você tem que explicar os detalhes. Porque você não pode deixar sem respostas”, disse.

Ribeiro conta ter repetido milhares de vezes as mesmas explicações, mostrado os mesmos documentos, inclusive para a própria família, um desgaste que poderia ter sido evitado se, segundo ele, os promotores do Gaeco (que combate o crime organizado) tivessem solicitado explicações sobre as transações realizadas com a Transwolff.

“Em momento algum fomos procurados, fomos indiciados, em momento algum. Nem pelo Banco Central, nem pelo próprio Ministério Público. Tudo que nós ficamos sabendo foi através de notícias”, afirmou.

Procurado, o Ministério Público paulista informou ter se limitado a oficiar o Banco Central sobre a suposta participação do banco no esquema, sem tomar outras providências (leia mais abaixo).

O nome do Banco Luso foi citado em denúncia do Ministério Público em suposto esquema de lavagem de dinheiro do crime organizado no transporte público da capital paulista. Foi nessa operação que foi preso o presidente Transwolff, Luiz Carlos Efigênio Pacheco, o Pandora, libertado dias depois pela Justiça. O processo sobre o caso ainda está em curso.

Sobre o banco, a Promotoria sustenta que haveria “evidências de possíveis atos de dissimulação para ocultação dos recursos de origem ilícita de membros da organização criminosa PCC”. Segundo os investigadores, houve múltiplos depósitos fracionados –operação chamada de smurfing– que “visavam a burlar o sistema de controle e fiscalização do Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras]”.

Seriam cerca de R$ 23 milhões que Banco Luso teria repassado para a Transwolff por meio de 88 cheques, em “compra simulada de ônibus”, dinheiro usado pela empresa para formar capital e participar de licitações públicas. Embora o banco tenha sido citado 15 vezes na denúncia, nenhum dirigente da instituição foi preso, denunciado ou alvo da operação de buscas em abril.

Ribeiro diz que o Ministério Público fez uma ilação irresponsável porque os 88 contratos citados são operações de financiamento de ônibus zero quilômetro, cujos processos foram aprovados, um a um, pela Secretaria dos Transportes e pela SPTrans, que assinaram como anuentes da operação financeira.

Por essa tese da Promotoria, segundo o presidente, praticamente toda a prefeitura estaria envolvida na lavagem de dinheiro do PCC. “Todo mundo estaria envolvido. Mas não tem isso, não tem lavagem de dinheiro. É isso que queremos falar. Nós financiamos veículos zero quilômetro. E não foi a primeira vez.”

Ribeiro afirma que os compradores dos ônibus deram entrada, usando o dinheiro da venda dos veículos usados, e financiaram o saldo remanescente em 60 vezes. Houve a alienação dos bens, como qualquer operação do tipo, com a diferença de haver uma garantida de pagamento do próprio município.

“Vocês [promotores] têm que ter mais responsabilidade no que fazem, como eu tenho responsabilidade no que eu faço. Eu não posso sair aí acusando alguém se eu não tiver provas. Porque vocês matam uma pessoa e quebram uma empresa, do dia para a noite. Isso para mim é um ato irresponsável”, disse.

Uma informação que poderia ajudar a Promotoria a entender melhor a operação, continua Ribeiro, seria conhecer a rotina do banco, que não trabalha com dinheiro em espécie e, assim, não teria como fazer lavagem de dinheiro de origem desconhecida.

“Nós não temos isso [movimentação em dinheiro]. Nós temos um caixa, mas não recebemos dinheiro aqui dentro do banco. Nós não temos um depósito dessas pessoas físicas aqui dentro do banco, porque nenhum deles [dos contratos] tem conta aqui no banco. Nenhum deles”, afirmou.

O presidente diz que os cheques foram entregues para os motoristas financiadores, que, por sua vez, depositaram os valores em banco oficial. “O que mais me chama a atenção é que eles estão demonizando o banco [Luso], sendo que os cheques não foram depositados aqui. Foram todos no Banco do Brasil. Todos lá. Por que não demonizam o Banco do Brasil?”, questiona.

Ribeiro afirma que o Banco Luso tem uma carteira de crédito em torno de R$ 3,7 bilhões. Desse total, 70% do volume de ativos são formados por crédito ao transporte, os outros 30% são divididos em câmbio e com empresas de médio porte (“middle market”).

A frota atualmente financiada pelo banco Luso, segundo o presidente, é de cerca de 3.000 veículos. Além da Transwolff, o Luso financia ônibus para outras 16 empresas da capital e, segundo eles, só não financia para 100% porque parte dos veículos que atuam na capital pertence à família Ruas, também sócia do banco. Esse tipo de financiamento configuraria crime de colarinho branco, diz ele.

Procurado para comentar as afirmações de Ribeiro, o Ministério Público de São Paulo informou “que, neste caso, limitou-se a oficiar o Banco Central, não tendo tomado nenhuma outra providência”.

A Promotoria não explicou por que não os dirigentes do banco não foram denunciados ou foi tomada outra providência contra eles. Os promotores também não explicaram qual seria exatamente a participação do Banco Luso na lavagem do dinheiro para o PCC.

Procurado, o Banco Central informou que “não comenta ações de supervisão em instituições específicas. Como supervisor, atua continuamente para assegurar a solidez e a eficiência do SFN (Sistema Financeiro Nacional) e o regular funcionamento das instituições que o compõem”.

ROGÉRIO PAGNAN / Folhapress

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